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Busca por estabilidade financeira pode transformar o trabalho em um fardo

Segundo psicóloga, as pessoas estão esquecendo de enxergar o prazer nas atividades que desempenham e isso leva ao desenvolvimento de problemas de saúde.

03/09/2017 08:07

Cobranças, pressão para produzir, exigências no cumprimento de prazos cada vez mais apertados. Rotinas produtivas que se tornam cansativas e profissionais cada vez mais doentes física e mentalmente. Isto pode resumir a realidade de muitos trabalhadores na atualidade e esta situação acaba fazendo se perder de vista coisas como a alegria e o prazer na execução das atividades diárias.

A busca pela estabilidade financeira acarreta problemas sérios de saúde, quando o profissional já não consegue mais dosar o tempo destinado ao trabalho e aos momentos de lazer. O resultado da falta de equilíbrio se traduz em clínicas e consultórios de psicologia e psiquiatria lotados de pessoas em busca de tratamento para problemas como depressão e ansiedade.

É comum ver as pessoas encarando o trabalho como um fardo, o “ter que acordar cedo” como uma especie de tortura, e o convívio com os colegas de repartição como um sacrifício. Atitudes como esta, segundo a psicóloga Marina Barros, aumentam em até 50% a predisposição de se adquirir um transtorno relacionado à atividade laboral. “Se você enxerga seu trabalho como um problema, é natural que ele te traga desprazer”, afirma.

Profissional precisa equilibrar as horas que dedica ao trabalho e ao descanso (Foto: Marcos Santos/USP Imagens)

Dentre os problemas de saúde relacionados à atividade profissional os mais comuns são a depressão, a ansiedade e a Síndrome de Burnout. Esta última, quando traduzida para o português, significa Síndrome do Esgotamento Profissional e se resume em dedicação excessiva ao trabalho e no desejo acima do normal de querer ser o melhor e mostrar o máximo de desempenho profissional.

Uma das características da Síndrome de Burnout, segundo Marina Barros, é o forte desgaste físico e psicológico, resultados da obstinação em obter sucesso. Essa obstinação, com o passar do tempo, se transforma em compulsão. Em um estágio mais avançado do transtorno, o profissional acaba desenvolvendo depressão e entrando em colapso físico e mental. É neste momento que a ajuda de um psicólogo e um psiquiatra se tornam mais que necessárias.

A psicóloga Marina Barros explica que enxergar o trabalho como um problema pode provocar transtornos no profissional (Foto: Ascom/Clínica Reabilitar)

A doutora Marina explica que a crise econômica pela qual passa o país atualmente contribui seriamente para que os profissionais dos mais diversos setores desenvolvam transtornos relacionados ao excesso de atividade laboral. Isso acontece por conta das incertezas dos movimentos do mercado de trabalho e do medo que as pessoas têm de perder seus empregos em meio a um cenário de recessão.

A psicóloga esclarece: “esse medo faz com que as empresas busquem profissionais cada vez mais generalistas e que assumam várias funções e isso acaba sobrecarregando a pessoa, causando um esgotamento mental e físico. Além disso, há preocupações com desemprego, preocupação em pagar as contas, preocupação em manter a família, em manter um nível de qualidade de vida e aí as pessoas acabam acumulando vários empregos. Trabalham de manhã em uma empresa, trabalham de tarde em outra, aí a noite fazem outro turno para poder acrescentar à renda e isso tudo acaba por causar problemas”, resume.

E engana-se quem pensa que os transtornos por excesso de trabalho atingem somente profissionais de determinadas categorias. Do faxineiro ao médico, todos estão sujeitos aos problemas de saúde decorrentes da atividade laboral. O fator decisivo não está na função desempenhada, mas na forma e na intensidade com que isso é feito. No entanto, é importante ressaltar que profissionais da área da segurança e da saúde, como policiais, médicos e enfermeiros, por exemplo, que geralmente vivem sob intensa pressão, são categorias que estão mais vulneráveis a transtornos por excesso de trabalho que outros.


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A enfermeira Cecy Nascimento Mourão, 31 anos, é um exemplo de profissional que teve que se afastar do emprego por conta das crises de ansiedade e esgotamento físico e mental decorrentes do excesso de trabalho. Cecy trabalhava na urgência de um hospital particular de Teresina e na Maternidade Dona Evangelina em regime de plantão: exercia a atividade por 24 horas seguidas e folgava dois dias.

O ritmo de trabalho, a intensa pressão psicológica e a tensão de saber que qualquer erro poderia custar a vida de uma pessoa acabaram levando Cecy ao colapso no final de 2015. “Foi um ano trabalhando nesse ritmo e a partir do momento que eu comecei a perceber que não estava normal, eu vi que era hora de dar um tempo”, conta. O suor excessivo, mãos tremendo e a falta de ar eram sinais das crises de pânico, que passaram a acontecer com frequência em vários plantões seguidos.

Cecy conta que chegava em casa com um nível de adrenalina tão alto que precisava ingerir bebida alcoólica para poder relaxar e conseguir dormir. Foi então que a enfermeira decidiu procurar ajuda de um psiquiatra que passou a medicação. “Eu voltei a trabalhar, só que eu não conseguia, mesmo medicada. Eu tomava o remédio, mas ficava um pouco dopada e isso pesava na consciência, porque se acontecesse algo com qualquer paciente, poderia refletir negativamente em mim. Chegou ao ponto de eu pedir para sair do hospital antes que me demitissem. Eu tinha vontade de abandonar tudo e sair correndo”, relata Cecy.

Em março do ano passado, após ser diagnosticada com Síndrome de Burnout, Cecy foi afastada de suas funções tanto no hospital quando na maternidade e tentou com uma solicitação de benefício junto ao INSS. A enfermeira disse que teve dificuldade em conseguir a autorização para receber pelo tempo que estivesse inativa, principalmente por conta do preconceito velado de médicos e peritos, que não entendiam como uma pessoa nova como ela estaria incapacitada para trabalhar.

“Muita gente acha que é drama uma pessoa dizer que está estressada com o trabalho. A verdade é que é uma coisa que pode vir a se tornar crônico. E eu tinha consciência de que não tinha condições físicas nem mentais de continuar daquele jeito”, finaliza a enfermeira.

O mais aconselhável para um profissional que chega ao nível máximo de esgotamento mental e físico é procurar a ajuda médica, um psicólogo ou um psiquiatra. O tratamento inclui o auxílio no reconhecimento de suas necessidades e na reorganização da vida no trabalho e vida pessoal.

A prática de atividades físicas também ajuda no relaxamento. Marina Barros explica que o ideal é procurar atividades que trabalhem a mente e o equilíbrio, como meditação, ioga e pilates. “Correr ao ar livre também é uma boa recomendação. Tem que buscar atividades que deem prazer e reorganizar a rotina”, finaliza.

Assista à reportagem especial da TV O DIA sobre o Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC):


Por: Maria Clara Estrela
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