A inserção do sistema de
cotas ou ação afirmativa para
alunos negros, indígenas e de
escolas públicas ingressarem
em Instituições de Ensino
Superior, durante muito tempo, sofreu severas críticas.
Mesmo após cinco anos da
criação da Lei de Cotas (Lei
nº 12.711/2012), os intitulados “cotistas” continuam passando por diversas situações
constrangedoras, racistas e
preconceituosas.
O cotista e estudante de
direito, Lucas Viana, destaca
que, em se falando de preconceito, não se deve personalizar
desigualdades. Para ele, existe preconceito sim contra os
cotistas, pois muitos ainda se
baseiam na meritocracia (mé-
rito acima de tudo) dentro da
universidade. Por isso, ele defende e luta por mais debates
voltados à temática, a fim de
mostrar às pessoas a importância do sistema, o sucesso
e a inclusão social com a qual
trabalha, de forma a desmistificar muitos tabus que existem
ao redor do assunto.
Alunos destacam importância da Lei de Cotas no Brasil (Foto: O Dia)
“As pessoas acham que colocar uma reserva de vagas para
alunos de escola pública, negros e indígenas, vai quebrar
a meritocracia tão prezada na
universidade. Só que a meritocracia não atende a necessidade de todos. Já soube de vários
casos de professores dizendo
que não deveria ter cota, que
as pessoas negras cotistas não
deveriam estar ali. Soube até
de um caso cuja professora falou que, depois que adotaram
o número de cotas, aumentou
a quantidade de pessoas analfabetas. O que é totalmente
errado porque eles se baseiam
em achismo, não consideram
a prática, os dados”, argumenta Lucas. A estudante de Comunicação Social, Milleny Medina,
também é cotista de escola
pública além de negra, e relata que somente ao entrar na
universidade teve consciência
sobre o que é ingressar no Ensino Superior através da ação
afirmativa. “Quando pisei na
sala e vi que a maioria eram
pessoas brancas de escola particular, me senti à parte, mas,
ao mesmo tempo, orgulhosa
de estar representando o meu
povo. Na minha sala não percebo, mas sei que o preconceito na universidade existe,
principalmente nos cursos
mais elitizados, como direito,
medicina e engenharias. Meus
amigos sofrem com os olhares
dos colegas que têm mais condições financeiras”, comenta.
Adaptação é questão de tempo
A adaptação é outro ponto criticado por pessoas que
são contra o sistema de ação
afirmativa. Alguns alegam
que o estudante de escola
pública, por meio das cotas,
não será capaz de acompanhar a turma. O advogado
Francisco Bruno Alves, que
se formou em uma faculdade
de Teresina através do Prouni, outro tipo de cota só que
para ingresso em faculdades
particulares, explica que,
embora haja uma dificuldade de adaptação no primeiro
semestre, visto que se trata
de uma realidade muito superior ao ensino das escolas
públicas, o cotista interessado tem a mesma capacidade
de acompanhamento.
“A partir do momento
que o aluno pega o ritmo,
ele consegue se desenvolver
tanto quanto os alunos de
ampla concorrência. Com
dificuldade menor ou maior,
ele consegue. Até porque os
cotistas são os melhores alunos de escolas públicas. Não
é que eles sejam ruins, eles
só não tiveram as estruturas
adequadas para se desenvolverem no Ensino Médio. Mas
quando eles são submetidos
às mesmas condições que os
de escolas particulares, eles
vão sim conseguir acompanhar” fala.
Além disso, em pesquisa realizada, pelo estudante
Lucas Viana, com 90 alunos
(40 não cotistas e 50 cotistas
negros) dos seis cursos mais
concorridos da Universidade
Federal do Piauí, foi constatado que os alunos cotistas são
perfeitamente qualificados
para estarem nas universidades, visto que a diferença do
rendimento de um em relação
ao outro é bem pequena. Os
dados indicam que 96,9% dos
alunos não cotistas e 88,2%
dos alunos cotistas negros
preenchem a nota mínima
prevista pela Ufpi para aprovação por média.
“Sistema de cotas traz igualdade”, diz diretora
A diretora de assuntos
acadêmicos da Universidade
Estadual do Piauí (Uespi),
Francisca Ealdina, comenta que é através das cotas
que os alunos com poucas
oportunidades e de vulnerabilidade social têm acesso à
educação superior. Segundo
ela, o sistema de cotas traz
igualdade de acesso aos alunos que não tiveram educação de qualidade. Enquanto
alguns acreditam que a ação
afirmativa é uma porta desigual para ingresso em universidades e faculdades, a
diretora defende se tratar da
mesma porta e das mesmas
oportunidades.
Mesmo com essa possível
igualdade que o sistema de
cotas propõe a alunos de escolas públicas e privadas, é
possível comprovar, em números, que ainda está muito
longe para a quantidade de
alunos cotistas ser igual a de
alunos da ampla concorrência. Na Uespi, dos 12.039
alunos em regime regular
devidamente matriculados,
somente 2.019 são cotistas,
o que corresponde a aproximadamente 17% do total de
alunos.
Desde a adesão ao Sistema
de Seleção Unificada (Sisu),
em 2012, a Universidade reserva 30% das vagas de ingresso na instituição para
estudantes cotistas, sendo
15% para alunos oriundos
de escolas públicas e 15%
para alunos autodeclarados
negros, oriundos de escolas
públicas. Na instituição, os
estudantes cotistas têm prioridade em seleções internas
de programas assistenciais
(Bolsa Trabalho, Auxílio Moradia e Auxílio Alimentação)
oferecidos.
Edição: Virgiane PassosPor: Karoll Oliveira