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Aterro de lixo de Teresina tem vida útil de apenas cinco anos

Local está em processo de desativação para substituição por um aterro sanitário

26/01/2019 07:47

Para saber que está próximo ao aterro de Teresina, basta olhar o céu. Na região, urubus sobrevoam em bando a área em que em está estabelecido, desde a década de 70, o aterro controlado de Teresina, na zona Sul da cidade. O local recebe uma média de 35 mil toneladas de resíduos gerados pela população da Capital a cada mês e, de acordo com estudos técnicos realizados recentemente, o espaço tem vida útil de apenas cinco anos.

A projeção é traçada pelo secretário executivo da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Semduh), Vicente Moreira, que explica, também, as mudanças previstas para o espaço ainda este ano. A definição de ser um aterro controlado, e não sanitário, é um dos itens que pretende ser mudado em 2019. 

Isto porque, após a finalização da licitação da limpeza pública de Teresina em 2017 - um processo que durou cerca de 10 anos - o consórcio de empresas que assumiu o contrato irá realizar, entre outras responsabilidades, as intervenções no aterro de Teresina.

“Em 2007, a Prefeitura contratou essa mudança com a Sustentare, mas a Sustentare não cumpriu o contrato, foi embora e nós rompemos o contrato. Ela foi multada, penalizada e, de lá para cá, por conta de muitos problemas judiciais que acontecem porque o valor da licitação é muito alto, só em junho de 2017 foi terminada a licitação da limpeza pública da cidade e, novamente, está dentro a transformação do aterro em aterro sanitário”, esclarece.

Segundo Vicente, o contrato em vigor contempla três possibilidades: a transformação da parte posterior do aterro em aterro sanitário e a desativação do atual aterro controlado, ou a possibilidade de contratação de duas centrais privadas que existem em Teresina para utilização da Prefeitura.

“Qual o problema que faz Teresina não deixar o atual aterro e contratar o privado? Porque apesar de estar contratado, isso é uma opção da administração, mas caso ela represente um menor custo. Fizemos os projetos e, como este aterro tem uma vida útil de cinco anos, optou-se por utilizar ainda estes anos, porque isso representa uma economia mensal de um milhão e quinhentos mil reais no orçamento do município”, explica.


17 hectares comportarão lixo em valas impermeáveis

Atualmente, o aterro está estabelecido em uma área de 50 hectares, destes, 33 são usados para comportar o lixo e os outros 17 hectares é onde está sendo implantada a célula onde o lixo será depositado em valas impermeáveis, que impedirão a infiltração do chorume no solo e lençóis freáticos.

“Hoje, após diagnóstico feito pela Escola Politécnica de Salvador, a gente determinou a execução de um projeto que corrigisse os problemas deixados pela Sustentare e pudesse operar o aterro, agora, como sanitário”, explica Vicente Moreira.

Segundo o secretário executivo, na área a ser desativada, serão implantados drenos para captação da água pluvial, cobertura da área utilizada com manta e camadas de solo e, ao final, a inserção de dreno de gases para implantar a queima do metano. “Esses cinco anos nos dará tempo para nos programar, teremos uma área de aterro controlado desativada e outra área com o aterro sanitário implementado”, destaca.


Tratamento do chorume

Atualmente, a área controlada já faz o tratamento do chorume, que é um líquido poluente e de forte odor, produzido naturalmente por meio de processos biológicos, químicos e físicos da decomposição de resíduos orgânicos. 

Desde novembro do ano passado, todo chorume produzido no aterro é drenado para uma primeira lagoa, que é impermeabilizada, e onde é feito o tratamento físico, com a equalização do chorume. Depois, o material passa para uma segunda lagoa, onde é feito o tratamento químico, em que são adicionados componentes para que haja a floculação e decantação do material particulado que tenha dentro do chorume. 

Posteriormente, o líquido passa pelo tratamento biológico em um processo de filtragem na estação de tratamento. Por fim, carros-pipas retiram a água tratada da estação e as direcionam para que sejam utilizadas na irrigação de praças, parques e dentro do próprio aterro, molhando o solo e evitando o excesso de poeira no local.


Diferenças entre aterro controlado e aterro sanitário

Existem diferenças essenciais entre os aterros controlados e sanitários. No primeiro, o lixo é disposto de forma controlada e os resíduos recebem uma cobertura de solos. No entanto, a técnica aplicada no aterro controlado não realiza o tratamento do lixo descartado e produz poluição localizada. Em geral, não é realizado nenhum processo de impermeabilização do solo ou controle dos gases gerados pela decomposição, o que compromete a qualidade do solo, das águas subterrâneas e do ar. 

Nos aterros sanitários, por outro lado, o lixo residencial é depositado em solos que receberam tratamento para tal, ou seja, que foram impermeabilizados, o que inclui uma preparação com o nivelamento de terra e com a selagem da base com argila e mantas de PVC. 

Os aterros sanitários também possuem sistema de drenagem para o chorume (líquido preto e tóxico que resulta da decomposição do lixo), que é levado para tratamento, sendo depois devolvido ao meio ambiente sem risco de contaminação, além de captação dos gases liberados, como metano, seguida da sua queima.

Os aterros sanitários são cobertos com solo e compactados com tratores, o que dificulta o acesso de agentes vetores de doenças e de oxigênio, o que dificulta a proliferação de determinadas bactérias. 

As construções desses aterros são pautadas em regras da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Há também poços de monitoramento abertos próximo aos aterros para que se avalie constantemente a qualidade da água e haja verificação de eventuais contaminações.


Catadores sobrevivem do que encontram no aterro: “é o nosso shopping”

Naquele dia, os irmãos Neto da Silva, de 41 anos, e Alex da Silva, de 40 anos, levariam para casa itens variados que ajudariam a repor os alimentos a serem consumidos ao longo da semana, onde vivem os dois, a esposa de Alex e duas filhas. Bolachas, leite, frutas, enlatados e refrigerantes faziam parte dos produtos que também se misturavam a itens de limpeza, acessórios e brinquedos. Todos eles, não oriundos de compra ou doação, mas do trabalho dos irmãos de vasculhar a pilha de lixo do aterro de Teresina. É como catador de lixo que os irmãos e dezenas de outros trabalhadores sobrevivem em Teresina.

“É o nosso shopping”, brinca Neto ao comemorar um dia inteiro de trabalho e todos os produtos que levaria para casa. Com as roupas sujas e o odor impregnado do dia inteiro entre os resíduos, os irmãos lembram que o inóspito trabalho nem sempre foi suas fontes de renda. 

Neto trabalhava como soldador e Alex como comerciante, mas a crise fez com que os dois perdessem o emprego. O aterro, então, se tornou uma opção.

No local, eles selecionam além dos produtos de alimentação, itens que servem para a venda como reciclado. Garrafas PET, alumínio, cobre, metal, filme, são itens buscados durante todo o dia, em um trabalho que inicia às 7h e termina no meio da tarde, por volta de 15h. Em média, em um dia de atividades, eles conseguem apurar cerca de R$ 50.

“Estou aqui há um ano e trouxe meu irmão, porque não tinha o que fazer. A gente vem pra cá porque não quer roubar e, graças a Deus, ainda não adoecemos. Então é um trabalho digno, não é?”, questiona.

Por estarem expostos aos riscos, trabalhadores dos lixões têm mais probabilidade de adquirir problemas de saúde como leptospirose, dermatites de contato, infecções gástricas e verminoses de toda ordem.

Futuro

No entanto, o trabalho dos irmãos tem prazo para acabar. Com a implementação do aterro sanitário, o local não poderá mais alocar a presença dos catadores. Para isso, a Prefeitura de Teresina implementou, no aterro, uma Central de Triagem para que os catadores possam trabalhar em cooperativa. 

Segundo a Semduh, dos 128 trabalhadores que atuam no lixão, apenas 32 fizeram cadastro na Central de Triagem. Segundo Alex, a informação de uma nova opção de trabalho era desconhecida. “Uma vez pegaram nossos nomes, mas nunca soube de nada ser feito. Eu acho que eles não podem tirar a gente daqui porque é nosso meio de vida, mas se tiver algo organizado para a gente ir, ganhar dinheiro direitinho, eu acho muito bom”, finaliza.


Moradores convivem com mau cheiro no período de chuvas

Por não ser sanitário, o aterro de Teresina causa prejuízos não só ao meio ambiente, mas também aos moradores da região do seu entorno. O local está localizado a 12 quilômetros do Centro de Teresina, mas bairros como o residencial Dagmar Maza ou o Vamos Ver o Sol podem ser acessados a poucos quilômetros do local. Por isso, a população convive com o mau cheiro vindo do aterro.

“Fica pior principalmente nesses meses que a chuva aumenta. O cheiro fica muito forte durante todo o dia. Graças a Deus, ninguém aqui ainda adoeceu, mas ficamos com medo”, destaca Maria do Socorro, de 54 anos, que mora no local há 20 anos e lembra de conviver com o problema desde então.

Para Maria, com os anos, o mau cheiro tem diminuído, mas ainda é muito presente nos meses de chuva. “A gente sente aquele mormaço e o mau cheiro muito presente. É horrível”, considera.

No período de chuva, o lixo exposto possibilita a produção de maior nível de chorume, por isso, o odor tão característico se espalha pela região. Com o tratamento do chorume feito no aterro, a perspectiva é que o impacto do odor seja muito mais amenizado.


Fotos: Jailson Soares/ODIA

Edição: Virgiane Passos
Por: Glenda Uchôa
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