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Sindicato quer devolução de recursos de precatório e condenação de Firmino

TCE-PI decidiu, por quatro votos a três, bloquear os recursos devidos pela União ao município, depois de terem sido identificadas diversas irregularidades na utilização do dinheiro.

29/08/2017 11:50

O Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Teresina (Sindserm) comunicou nesta terça-feira que pretende acionar a Polícia Federal e o Ministério Público Federal para que as entidades investiguem o suposto uso ilegal de recursos de um precatório liberado para o município, referentes ao antigo Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério), hoje denominado Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação).

No dia 20 de julho, o Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TCE-PI) decidiu, por quatro votos a três, bloquear os recursos devidos pela União ao município, depois de terem sido identificadas diversas irregularidades na utilização do dinheiro.

Firmino Filho precisa explicar ao TCE-PI por que utilizou recursos de precatório do Fundef para fins diversos daqueles que a lei prevê (Foto: Moura Alves / O DIA)

O precatório que é alvo do imbróglio entre a Prefeitura e o Sindserm refere-se a uma dívida - já reconhecida pela Justiça - que a União tem com o município, por ter deixado de repassar valores do Fundef à capital piauiense.

O município deveria receber,  em dezembro de 2016, o montante de pouco mais de R$ 228 milhões da União. Mas a gestão de Firmino Filho decidiu celebrar quatro meses antes um contrato de cessão de crédito com o Banco do Brasil, para que os valores do precatório fossem antecipados ao município pela instituição financeira.

O contrato com o banco foi feito em plena campanha eleitoral, em agosto, sendo autorizado pelos vereadores de Teresina à época, por meio da aprovação da Lei Municipal nº 4.920/2016.

O Sindserm denuncia que os recursos foram usados indevidamente por Firmino para o pagamento, por exemplo, de empresas de publicidade e propaganda, para a compra de vales-transportes do Setut e até para o repasse de recursos a igrejas evangélicas da cidade.

O Ministério da Educação determina que os recursos do Fundef/Fundeb sejam aplicados na manutenção e desenvolvimento da educação básica pública, sendo que o mínimo de 60% desses recursos deve ser destinado anualmente para a remuneração dos profissionais do magistério (professores e profissionais que exercem atividades de suporte pedagógico, tais como: direção ou administração escolar, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional). E a parcela restante (de no máximo 40%) deve ser aplicada nas demais ações de manutenção e desenvolvimento da educação básica pública. Esta proporção, inclusive, também está prevista na Decisão Normativa nº 27 do próprio TCE-PI.

Segundo o sindicato, para receber o aval que permitiu realizar o contrato com o Banco do Brasil, a gestão de Firmino Filho teria se comprometido a respeitar essa proporção de 60% e 40% para remuneração de profissionais e investimentos diretos na educação - respectivamente. O que, na prática, não aconteceu.

Um relatório do Núcleo de Gestão Estratégica da Informação (Nugei) do TCE-PI apontou as várias irregularidades existentes no contrato de antecipação de crédito e na utilização desses recursos pela Prefeitura de Teresina.

O documento destaca, por exemplo, o fato de o município ter pagado mais de R$ 18 milhões em juros para o Banco do Brasil, tendo em vista que o valor do precatório era da ordem de R$ 228.863.161,75 (atualizado em 31 de julho de 2016), e a prefeitura recebeu apenas R$ 210.667.000,00. "Não se vislumbrou justificativa plausível para o pagamento de juros na ordem de R$ 18.196.161,75, valor que representa em torno de 8,63% do valor do crédito adquirido", pontua o relatório do TCE-PI.

Outra irregularidade mencionada pelo órgão de apoio do tribunal é o fato de a Prefeitura de Teresina ter firmado o contrato com o Banco do Brasil sem comprovar que a instituição financeira ofereceu as melhores condições contratuais para o município. Ou seja, a prefeitura não realizou qualquer procedimento licitatório, tampouco apresentou razões para dispensar a licitação. "Seria mais coerente e legítimo, com atenção ao princípio da economicidade, que o município verificasse a proposta das demais instituições financeiras, de modo a garantir a seleção daquela que melhor atendesse aos fins públicos (responsabilidade na gestão dos recursos públicos)."

Para auditores, há indícios de crime contra as finanças públicas, improbidade e crime de responsabilidade

Tribunal de Contas do Estado (Foto: Divulgação)

No relatório produzido pelo Núcleo de Gestão Estratégica da Informação, os auditores do TCE-PI ressaltam que, embora a Prefeitura de Teresina afirme que pactuou um contrato de "cessão de crédito" com o Banco do Brasil, na realidade o negócio possui as características essenciais de uma "operação de crédito por antecipação de receita orçamentária", a qual não pode ser feita no último ano de mandato dos chefes do Executivo, conforme estabelece a Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu artigo 38, inciso IV, alínea b.

Sendo assim, ao realizar a operação de crédito em 2016, o gestor teria cometido crime contra as finanças públicas (artigo 359-A, parágrafo único, inciso I, do Código Penal); ato de improbidade administrativa (artigo 10, IV, da Lei 8.429/92); e crime de responsabilidade (artigo 1º, VIII, do Decreto Lei 201/67).

Relatório identifica desvio de finalidade e propõe devolução de recursos aos fundo

No relatório, os auditores enfatizam que houve "desvio de finalidade na aplicação dos recursos do fundo destinados à educação, devendo, portanto, ser ressarcidos à conta específica do fundo".

A devolução dos recursos também é requerida pelo Sindserm. "O próprio TCE reconhece que o prefeito realizou uma operação de crédito no seu último ano de mandato, o que é proibido. E é isso que ele [Firmino] tenta desfigurar, mudando somente a nomenclatura do contrato - em vez de operação de crédito, diz que é cessão de crédito", afirma o advogado Cayro Burlamaqui, assessor jurídico do sindicato.

Assinado por cinco auditores de controle externo da instituição, o relatório do TCE-PI constata que houve ilegalidades na contratação de pelo menos quatro empresas às quais teriam sido destinados recursos provenientes da antecipação de crédito feita pela prefeitura junto ao Banco do Brasil.

São listadas irregularidades nos contratos com a Belazarte - Serviços de Consultoria Ltda.; com a CET-SEG Segurança Armada Ltda.; com a Plug Propaganda e Marketing Ltda.; e com a ADV/6 Ltda. ME (também de publicidade).

O presidente do Sindserm, Sinésio Soares, considera que, se houvesse equilíbrio de forças na Câmara Firmino já estaria sendo alvo de impeachment (Foto: Cícero Portela / O DIA)


Conforme levantamento feito pelo Sindserm, a gestão de Firmino usou quase R$ 73 milhões do montante obtido por meio do contrato com o Banco do Brasil apenas entre os dias 23 e 30 de setembro de 2016, ou seja, dias antes do primeiro turno do pleito de 2016, quando o tucano foi reeleito com 51,14% dos votos válidos. "Uma coisa absurda é que, assim que o dinheiro saiu, o prefeito gastou R$ 73 milhões em apenas uma semana, inclusive com empresas que têm idoneidade questionada. Só o fato de esses pagamentos terem ocorrido dias antes da eleição já é algo que, por si só, já motiva uma investigação", opina Sinésio Soares, presidente do Sindserm.

Até a realização da inspeção pelo Núcleo de Gestão Estratégica da Informação (Nugei), em julho deste ano, a prefeitura já havia gastado R$ 165 milhões. Segundo o Sindserm, todo esse dinheiro foi usado pela gestão tucana sem observar a proporção de 60% para os profissionais de magistério e 40% para manutenção e desenvolvimento da educação básica. 

"Qual foi a intenção do prefeito ao antecipar esses recursos? Não há justifica plausível. Não existe saída jurídica para o prefeito justificar o pagamento de R$ 18 milhões em juros para antecipar esses recursos. Já começa por aí. Fora todas as outras ilegalidades presentes nos pagamentos feitos pela prefeitura a diversas empresas com esses recursos", questiona Sinésio, acrescentando que o sindicato vai pedir na Justiça a devolução dos R$ 18 milhões retidos pelo Banco do Brasil a título de juros.

Sindserm afirma que Câmara deve livrar Firmino, mas crê que ele pode ficar inelegível e até ser preso

O presidente do Sindserm considera que o bloqueio dos recursos do precatório pelo TCE-PI e uma eventual reprovação de contas de Firmino pelo tribunal trará poucas consequências para o prefeito, caso as irregularidades sejam apreciadas apenas pela Câmara Municipal, uma vez que o prefeito possui base formada por quase 90% dos vereadores da capital. "Se existisse um equilíbrio de forças na Câmara, o Firmino já estaria sofrendo um processo de impeachment. Do ponto de vista legal, já existem motivos suficientes para isso. O problema é que o domínio do prefeito sobre os vereadores é total. Tanto é que o contrato feito com o Banco do Brasil foi aprovado na Câmara com a maior facilidade e extrema rapidez", denuncia Sinésio.

Por outro lado, o sindicalista acredita que Firmino ainda pode ser condenado pela Justiça Federal. "Além da inelegibilidade, você tem, dependendo do crime, a possibilidade de pedir a prisão do prefeito Firmino Filho. O que nós estamos verificando é qual a dimensão da participação do prefeito nisso, porque, na verdade, ele é o gestor", observa Sinésio Soares.

O sindicato convocou uma nova assembleia geral para 4 de setembro, data em que os conselheiros do TCE-PI voltam a apreciar o tema da utilização de recursos do Fundef para outros fins, que não a valorização do magistério e os investimentos na educação básica. Na ocasião, não será tratado apenas o caso específico de Teresina, mas sim dos municípios piauienses em geral.

A assembleia da categoria acontecerá num auditório do próprio TCE, que cedeu o espaço para o Sindserm, e, ao final das deliberações, os trabalhadores seguem para o plenário da Corte de Contas, onde acontecerá a sessão.

Ministério Público de Contas tenta intermediar acordo entre a Prefeitura e o Sindserm

O procurador-geral Plínio Valente Ramos Neto, do Ministério Público de Contas do Piauí, propôs que a Prefeitura de Teresina firme um Termo de Ajustamento de Gestão com o Tribunal de Contas e com o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais, visando a regular aplicação dos recursos advindos do contrato firmado pela prefeitura com o Banco do Brasil.

O termo de ajustamento determina que a prioridade de utilização dos recursos provenientes do precatório deve ser o pagamento de débitos previdenciários; e, em seguida, o pagamento de débitos trabalhistas oriundos de decisões judiciais, devidos a servidores da educação.

Parte dos recursos também deverá ser destinada ao pagamento de abonos e de reajustes nas remunerações dos servidores da educação.

Outro lado

Em nota, a Prefeitura de Teresina argumentou que "o atual bloqueio da conta especifica dos recursos do precatório do FUNDEF pelo Tribunal de Contas do Estado do Piaui decorre de decisão cautelar monocrática proferida em 06 de  julho do corrente ano e confirmada pelo Plenário em 20 de julho seguinte, com voto de desempate do Presidente da Corte, portanto, sem considerar o Relatório de Inspeção do Núcleo de Gestão Estratégica da Informação, que concluiu, no primeiro parágrafo do item 2.4. que “os recursos analisados foram usados exclusivamente no pagamento de despesas com a função EDUCAÇÃO, (...)”.".

Além disso, a Prefeitura reiterou ainda que confia no julgamento da Corte de Contas e aguarda a liberação dos recursos bloqueados para continuar aplicando-os em benefício da educação municipal.

Leia a nota na íntegra:

Sobre as informações divulgadas pelo SINDSERM em coletiva, realizada nesta terça-feira, o município de Teresina esclarece que:

1.O atual bloqueio da conta especifica dos recursos do precatório do FUNDEF pelo Tribunal de Contas do Estado do Piaui decorre de decisão cautelar monocrática proferida em 06 de  julho do corrente ano e confirmada pelo Plenário em 20 de julho seguinte, com voto de desempate do Presidente da Corte, portanto, sem considerar o Relatório de Inspeção do Núcleo de Gestão Estratégica da Informação, que concluiu, no primeiro parágrafo do item 2.4. que “os recursos analisados foram usados exclusivamente no pagamento de despesas com a função EDUCAÇÃO, (...)”.

2.A defesa do município, protocolizada tempestivamente em 01 de agosto corrente, demonstrou, indubitavelmente, a legalidade na aplicação dos recursos recebidos mediante cessão de direitos creditórios de precatório realizada com o Banco do Brasil, que foi precedida de autorização da MM. Juíza da 5a Vara Federal, em decisão homologatória transitada em julgado, consubstanciada em parecer n. 002/216 da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional , autorizada pelo Tesouro Nacional e regulamentada pelo Poder Legislativo Municipal, através da Lei n. 4.920/2016.

3.O Plenário do Tribunal de Contas do Estado do Piauí, portanto, ainda não julgou nem possui posicionamento colegiado a respeito do mérito da denuncia apresentada pelo Sindicato. Qualquer outra informação em sentido contrário não corresponde à verdade.

4.Como dito, o Sindicato já apresentou as mesmas denuncias ao Ministério Publico e à Justiça Comum, sendo que o juízo da 1a Vara da Fazendo Publica negou a liminar que pedia o bloqueio dos valores do precatório, considerando que o contrato de cessão de credito havia sido homologado e não cabia à Justiça Estadual desconstituir decisão proferida em âmbito da Justiça Federal.

5.Recentemente, o Tribunal de Contas da União proferiu decisão no TC 005.506/2017-4, representação formulada pelo Ministério Publico Federal e pelo Ministério Publico do Estado do Maranhão, reconhecendo que “a competência para fiscalizar a aplicação desses recursos complementares é do Tribunal de Contas da União, ainda que esses pagamentos decorram de sentença judicial, uma vez que são recursos de origem federal”. Nesse sentido, no próximo dia 04 de setembro, o TCE/PI reunir-se-á em audiência pública para tratar, inclusive, da sua (in)competência para os bloqueios realizados diante da simetria constitucional quanto à competência do TCU.

6.Feitos esses esclarecimentos, a Prefeitura de Teresina confia no julgamento da Corte de Contas e aguarda a liberação dos recursos bloqueados para continuar aplicando-os em beneficio da educação municipal, cujas contas sempre foram aprovadas pelos Tribunais de Contas e que se destaca nacionalmente, como a melhor nota no IDEB entre as capitais do NE e a terceira melhor entre todas as capitais brasileiras.

Por: Cícero Portela
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