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Profissionais apontam avanços no novo Código de Ética Médica

Uma das principais mudanças no Código é a previsão da possibilidade de os médicos recusarem-se a atender em locais com condições precárias.

29/04/2019 13:19

Começa a valer a partir desta terça-feira (30) o novo Código de Ética Médica, que traz o conjunto de princípios que guiam a atuação dos médicos no país, estabelecendo os direitos, os compromissos e os limites da profissão. 

O início da vigência ocorre 180 dias após a publicação, no Diário Oficial da União, da Resolução CFM nº 2.217/2018, que contém o novo texto do Código de Ética.

A versão anterior vigorava desde abril de 2010, e a nova foi elaborada ao longo de quase três anos de discussões e análises que 

"Os debates, que foram abertos à participação de toda a categoria médica – seja por meio de entidades ou pela manifestação individual dos profissionais – permitiram modernizar o texto anterior, incorporando artigos que contemplam mudanças decorrentes de avanços científicos e tecnológicos, assim como novos contextos na relação em sociedade", avalia o Conselho Federal de Medicina (CFM).

Condições de atendimento - Uma das principais mudanças é a previsão da possibilidade de os médicos poderem se recusar a atender em locais com condições precárias, que expõem ao risco pacientes e profissionais. 

Para o médico Leonardo Sérvio Luz, conselheiro do CFM, este é um dos principais avanços presentes na nova redação do Código de Ética Médica. "O Código foi fruto de uma discussão ampliada, durante mais de dois anos. Uma comissão passou por todas as regiões do país, através de encontros regionais e encontros nacionais, nos Conselhos de Medicina. Um dos pontos que considero mais importante é a autonomia conferida ao médico, no tocante à proteção do paciente. Agora o médico pode e deve denunciar ao Conselho condições de trabalho inadequadas. E, inclusive, pode até recusar atendimento nessas situações, desde que não seja em setores de urgência e emergência", afirma.

Consciência - Da mesma forma, os médicos poderão se recusar a prestar atendimentos em casos que contrariem sua consciência. Por exemplo, um médico que não concorde com a prática do aborto poderá se recusar a fazê-lo, mesmo quando a paciente estiver enquadrada numa das hipóteses em que a lei autoriza o procedimento. A recusa do profissional só não será admitida em casos de emergência e quando ele for o único médico disponível.

O médico Leonardo Luz, conselheiro federal de medicina (Foto: Divulgação)

Pesquisas - Leonardo destaca que também houve uma mudança positiva na questão das pesquisas na área médica, com a inclusão de normas que garantem mais proteção aos pacientes considerados vulneráveis, como menores de idade e pessoas com deficiência física ou intelectual.

Comprovação de especialidade - O conselheiro federal de medicina acrescenta que o novo Código prevê regras mais rígidas destinadas a impedir que alguns profissionais anunciem especialidades sem que realmente as tenham.

"Agora o médico que estiver anunciando ter uma especialidade, além de ter que comprovar a formação nesta especialidade, será obrigatória a presença no carimbo do que a gente chama de RQE - Registro de Qualificação de Especialista. Por exemplo, eu sou psiquiatra. Então, eu vou ter que ter, além do número do CRM, o número do RQE, que vai ter que constar no carimbo do médico. Isso garante mais proteção ao paciente, porque vai dar a garantia de que, de fato, ele está sendo atendido por um especialista", explica.

Autonomia dos pacientes - Para a médica Mírian Dias Parente, presidente do Conselho Regional de Medicina do Piauí, um dos trechos mais importantes do novo Código de Ética é o que reforça a autonomia dos pacientes, inclusive daqueles que estão em fase terminal. 

"A estrutura do Código de Ética, de uma maneira geral, continua a mesma. O que a gente fez foi melhorar os textos de alguns artigos que estavam extemporâneos, porque, como o último Código foi feito há mais de dez anos, a gente precisou dar essa atualizada. Uma das principais mudanças presentes nesse novo Código é o reforço da autonomia do paciente", avalia.

A médica Mírian Dias Parente, presidente do Conselho Regional de Medicina do Piauí (Foto: Ascom CRM-PI)

Nova norma do Código de Ética Médica pode aumentar ainda mais judicialização da saúde

Como boa parte dos hospitais e demais unidades de saúde públicas no país apresentam condições inapropriadas para atender os pacientes - com deficiência estrutural ou falta de insumos básicos e equipamentos hospitalares -, é provável que cada vez mais médicos passem a recusar atendimento nessas situações, como forma de se resguardarem e de pressionar os gestores públicos para que solucionem os problemas do setor.

O advogado Alex Noronha, especialista em direito médico e direito empresarial, acredita que esta norma do novo Código de Ética tem potencial para fazer crescer a quantidade de demandas judiciais na área. 

O advogado Alex Noronha (Foto: Arquivo pessoal)

"A precariedade da saúde pública no Brasil está no topo das causas de judicialização da saúde, de modo que aqueles atores envolvidos na prestação de serviço de saúde - profissional médico e paciente - são os que mais sofrem, e fatalmente, ao meu sentir, há sim a possibilidade de aumento de demandas. O médico brasileiro tem o direito de se recusar a exercer sua profissão em instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não sejam dignas e ponham em risco a saúde dos pacientes. Nesses casos, deve comunicar a decisão ao diretor técnico da instituição, aos Conselhos Regionais de Medicina e às comissões de ética do local", salienta o advogado.

Por: Cícero Portela
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