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Mesmo com risco de morte, jovens insistem no uso de anabolizantes

Comercialização facilitada contribui para o uso indiscriminado de produtos que podem levar ao óbito

24/02/2013 09:53

Há cerca de três anos, a estudante piauiense Dalyla Gomes, de 20 anos de idade, faleceu após complicações causadas pela aplicação de esteroides anabolizantes (EA) usados em tratamentos de bois e cavalos. O objetivo da garota era chegar mais rápido no seu ideal de corpo, mas sua vida foi ceifada bem antes disso por conta de sua iniciativa irresponsável.

Contudo, a morte de Dalyla ainda não serviu de exemplo local, pois muitos teresinenses continuam optando pelo uso de EA com o intuito de alcançar, em curto prazo, o estereótipo de beleza, por vezes, imposto pela própria sociedade. Paulo Silva*, de 24 anos, é um desses jovens que está decidido a começar a 'tomar bomba' em breve.

Segundo o rapaz, a decisão foi motivada pela falta de resultados da musculação. Há pelo menos seis anos, ele malha todos os dias. "Decidi injetar porque não consigo ver resultados e olha que já venho malhando a um longo período e nem com suplementação vejo evolução", disse.

Paulo conhece os riscos que está correndo, mas não acredita que terá problemas ao injetar o EA. "Medo eu tenho porque cada um reage de uma forma, mas já li e pesquisei muito a respeito e todas as informações sempre mostram que os resultados são bons e que os riscos são mínimos, em alguns casos o produto não chega nem a ter efeito", acredita.

De acordo com o jovem, ele não encontrou nenhuma dificuldade para conseguir o produto que custará R$ 350, cada ciclo, que abrange, em média, as aplicações semanais correspondentes a um mês. O vendedor é um amigo de Paulo Silva.

Contudo, o Conselho Regional de Educação Física no Piauí (CREF-PI) repudia o uso de EA por atletas e por pessoas que praticam atividade física. "Os anabolizantes trazem consigo uma série de efeitos colaterais, principalmente quando seu uso é indiscriminado. Reforçamos que a única forma de conseguir um corpo mais trabalhado é através de treinamento mais alimentação balanceada", destacou o fiscal do CREF-PI, Charlie Maia.

Segundo o membro do conselho, na época da morte de Dalyla Gomes, o órgão visitou as duas academias que a jovem frequentava e investigou se a aquisição dos esteroides anabolizantes foi intermediada pelos profissionais dos estabelecimentos. Contudo, ficou comprovado que os educadores físicos não tiveram nenhum envolvimento no caso, sendo assim, Dalyla teria conseguido as drogas através de outra via.

Uso é notório

Pode comprar um caixão e aguardar. São estas fortes palavras que o educador físico e proprietário de uma academia situada no bairro Mocambinho, zona Norte de Teresina, José Wilson, diz para os alunos que fazem uso de anabolizantes com o intuito de acelerar os resultados da musculação. Segundo ele, quando os usuários que não falecem, acabam por desencadear doenças mais graves como canceres, problemas cardíacos e assim por diante.

José Wilson defende que a venda de remédios para animais, que muitas vezes tem sua finalidade desviada para atender o público que almeja o crescimento rápido de seus músculos, deveria ser mais rigorosa, a fim de que os produtos não caiam em mãos erradas. "É um mercado aberto e que você encontra até mesmo na internet", disse.

De acordo com o educador físico, não há como negar quando alguém está usando 'bomba'. "A gente conhece de longe quem utiliza anabolizante porque a forma muscular é diferente, é desproporcional, um lado desenvolve mais que o outro", afirma. O que José Wilson indica para quem pretende ganhar massa muscular é deixar de lado o fumo, bebidas alcoolicas e procurar além do treino, ter uma dieta balanceada a base de proteínas, que podem ser encontradas na clara do ovo, na soja, nas carnes e no leite.

* Nome fictício utilizado para preservar a identidade do entrevistado.

Anabolizantes desencadeiam reações diferentes em homens e mulheres

Utilizar esteroides anabolizantes (EA) para conseguir ganhar massa muscular em um curto período de tempo preocupa a categoria médica. Segundo o endocrinologista José Maria, estes medicamentos são até administrados no caso de alguns tratamentos, mas a partir do momento que passam a ser utilizados de forma indiscriminada podem acarretar em efeitos colaterais que modificam o comportamento humano, o sistema endócrino, cardiovascular, hepático e musculoesquelético.

"Em algumas situações quando o indivíduo tem anemia, por exemplo, e você usa algum tipo de anabolizante, isto promove uma melhora da função da medula óssea e da produção de hemácias e por conta disso é utilizado nesse tratamento. Já em pessoas que estão convalescendo de doenças crônicas, e por isso perderam muito peso, massa muscular, estão emagrecidas e sem se alimentar, então existem medicamentos que também são anabolizantes que vão melhorar o apetite desse indivíduo", explica José Maria.

Todavia o endocrinologista alerta que o problema destas drogas, geralmente oriundas do hormônio masculino - a testosterona, está no fato do desvio de sua função médica para satisfazer um desejo estético, sem o menor acompanhamento profissional. "Um medicamento indicado para ser usado a cada 21 dias, eles [os praticantes de atividades físicas] usam três vezes na semana, é o que eles chamam de ciclos", cita José Maria alertando para o uso exagerado do EA.

Segundo o médico, as consequências do uso de anabolizantes são diferenciadas de acordo com o sexo da pessoal. Nas mulheres, como os EA são derivados da testosterona, eles podem engrossar a voz feminina, fazer nascer pelos como bigode e barba, além da hipertrofia do clitóris e outras características de virilização, ou seja, desenvolvimento de características próprias do sexo masculino.

Por outro lado, nos homens, o uso de EA pode resultar no crescimento das mamas e na atrofia dos testículos, pois quando o homem toma os anabolizantes, este vai ocupar os receptores do hormônio masculino, tanto que o corpo passa a não fabricar mais o próprio hormônio. "Os anabolizantes ocasionam também o aumento da pressão arterial, dos glóbulos vermelhos, e a grande toxicidade deles é para o fígado, podendo gerar danos irreversíveis", pontua.

Suplementos alimentares proibidos pela Anvisa são vendidos livremente na internet

A busca pelo modelo de corpo perfeito, instituído pela sociedade, não tem limites. Mesmo com o alerta da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que proíbe a venda dos suplementos alimentares Jack 3D, Oxyelite Pro e Lipo-6 Black, o comércio virtual destes produtos continua a todo vapor.

A equipe de reportagem do Jornal O DIA fez uma rápida busca na internet e encontrou, em menos de cinco minutos, todos estes produtos disponíveis para venda no Brasil. Os preços variam e chegam até R$ 199 por uma embalagem com 90 cápsulas; e os sites disponibilizam ainda que o valor total da compra seja dividido no cartão de crédito em até 18x, sendo que a entrega do produto é imediata, em até 48h dependendo da região.

No endereço eletrônico, o O DIA verificou ainda diversos comentários tanto sobre a agilidade de entrega quanto dos resultados dos produtos. Em um deles, uma usuária de Oxyelite Pro disse: "melhor que esse, só dois desse! muito bom já eliminei 12 kg".

Os três suplementos alimentares proibidos pela Anvisa, desde o ano passado, contêm a substância dimethylamylamine (DMAA), que pode causar graves danos à saúde das pessoas e, em alguns casos, levar até a morte. O DMAA é um estimulante usado, principalmente, no auxílio ao emagrecimento, aumento do rendimento atlético e até mesmo como droga.

De acordo com a Anvisa, os ingredientes contidos nos suplementos não são seguros para o consumo como alimentos e podem conter substâncias com propriedades terapêuticas que não podem ser consumidas sem acompanhamento médico. Os problemas à saúde humana podem englobar efeitos tóxicos, em especial no fígado, disfunções metabólicas, danos cardiovasculares, alterações do sistema nervoso e, em último caso, a morte.

Receita só com nutricionista

A venda de suplementos alimentares legalizados no Brasil não possui restrições, ou seja, qualquer pessoa pode adquiri-los, até porque se tratam de nutrientes puros extraídos de um alimento, não sendo, portanto, remédio, droga nem hormônio. Contudo, a orientação é que o início do seu uso seja receitado por um nutricionista.

De acordo com a nutricionista Layse Alelaf, os suplementos não são substitutos de refeições, ao contrário, são complementações utilizadas, principalmente, por quem pratica atividade física e atletas, pois eles têm um gasto calórico durante a prática das atividades e por isso há a necessidade da reposição, que nem sempre é saciada apenas pela alimentação.

"Por exemplo, você precisa de 30g diárias de proteína do leite e em um copo de leite você não vai conseguir consumir esta quantidade que já é ofertada pelo suplemento. Sendo que, se você tivesse que consumir esta proteína apenas bebendo leite, seria necessário cerca de cinco copos. Contudo, estas porções trazem consigo não apenas a proteína desejada, mas também a gordura. No caso do suplemento não, você acesso a proteína pura, sem gorduras", ilustra a nutricionista.

Segundo Layse Alelaf, o acompanhamento nutricional faz-se necessário devido às contraindicações do uso de suplementos, principalmente daqueles conhecidos como termogênicos. "A maioria dos termogênicos são a base de cafeína e aceleram o metabolismo do corpo dando mais energia para o treino, pois retarda a fadiga muscular e a pessoa se sente mais estimulada para malhar. Mas como a cafeína é um estimulador, então pessoas que têm hipertensão arterial, gastrite, ou problemas cardíacos devem evitar esses suplementos", alerta.

Por: Virgiane Passos
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