Portal O Dia - Notícias do Piauí, Teresina, Brasil e mundo

WhatsApp Facebook Twitter Telegram Messenger LinkedIn E-mail Gmail

Famílias piauienses sobrevivem da extração da carnaúba

O trabalho, pouco valorizado, orgulha quem criou toda sua família com a venda de produtos oriundos da árvore que é símbolo do Piauí.

21/07/2018 10:05

Alderi Pinheiro se coloca de pé às 4h da manhã, quando o ar ainda corre frio e a escuridão mal deixa ver algo a poucos metros do seu campo de visão. Mas ignorando os contratempos naturais, ele se apressa decidido, sabendo pontualmente para onde ir e o que fazer. O homem de 56 anos recolhe palhas sobrepostas no canto da casa, espalha cada uma pelo quintal da propriedade de chão árido e segue para reiniciar o que também fizera no dia anterior: retirar palhas dos pés de carnaúba que se agigantam por grandes extensões no município de Campo Maior, distante 84 km de Teresina. Na região, famílias sobrevivem por meio da retirada das folhas da árvore nativa que também é símbolo do lugar.

A retirada da carnaúba acontece principalmente nos meses mais quentes do ano. De julho até novembro, são meses de pico, porque o processo de beneficiamento da palha tem total relação com o sol. “Quando chove, não dá pra secar as folhas pra fazer a vassoura e tirar o pó, aí a gente não trabalha”, explica em tom didático Alderi.

Para quem nunca frequentou sala de aula alguma, o homem repassa o que sabe de todo o processo em compasso fácil de aprender. “A gente derruba as palhas, depois tira os espinhos e traz para riscar. Depois, tem que secar, tirar o pó, e aí começa a fazer as vassouras”, explica.

As vassouras são o grande foco de produto das famílias da região, que utilizam a planta sem ajuda de equipamentos industriais para seu beneficiamento. É tudo muito artesanal.

O preço ofertado para a venda das vassouras é R$ 60 pelo conjunto de 100 unidades, que Alderi afirma nem sempre conseguir tabelar com os comerciantes locais. Cada vassoura leva, em média, cinco folhas da carnaúba. Assim, em cada cento vendido, mais de 500 folhas da planta fazem parte daquele processo. “Às vezes, passo o dia de cima para baixo e não consigo vender, aí baixo até por R$ 50”, confessa em tom contrariado pela desvalorização do seu trabalho.


Foto: Jailson Soares/ Jornal O Dia


E é quase que unicamente desse trabalho de retirar, trabalhar e vender os produtos advindos da carnaúba que Alderi sustenta a família. “Nasci e me criei no interior e vi minha família tirando do pouco para ir aguentando a vida pela carnaúba. E eu tô aqui acreditando que vou chegar no final de minha vida tendo criado toda minha família à custa da palha”, pontua com certeza.

Os outros membros da família também fazem parte do processo, enquanto ele cuidava de separar as folhas da árvore, a mulher e a filha “riscavam” as folhas mais à frente. Riscar é o nome que se dá ao processo de separar com uma faca amolada as fibras da planta, que se torna mais solta e, assim, formará as pontas para vassouras mais tarde vendidas.

Riscos

Da retirada da folha da carnaúba até a finalização das vassouras, a família leva cerca de três dias na lida. E há muitos riscos envolvidos nesse processo. Um dos primeiros é logo na retirada, quando as palhas da árvore, que chega a alcançar quase 15m de altura, caem com espinhos afiados. Em uma dessas, Alderi já teve o braço cortado. “A blusa ficou imprestável de tanto sangue que correu. Sorte que não pegou no olho ou no pescoço. É um trabalho muito perigoso”, confessa.

Outra preocupação é que quando as folhas são guardadas ou colocadas pra secar servem de abrigo para animais peçonhentos, como cobras, aranhas e lacraias. “É muito comum a gente se assustar com bicho debaixo das palhas. Se não tiver atenta, eles pegam mesmo”, explica Rosa, esposa de Alderi.

Confira esta reportagem na íntegra na edição de Fim de Semana do Jornal O Dia.

Por: Glenda Uchôa
Mais sobre: