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Moradores tentam pacificar comunidade marcada pela violência

Arte é alternativa usada para mudar a realidade da região que sofre com um histórico conflito de gangues

14/12/2019 08:47

O rapper Luciano Leite hoje tem trânsito livre entre as vilas por anos consideradas inimigas “Esses conflitos existem desde que nos entendemos como gente nessa comunidade, o que atrapalhou muito o crescimento da região. O conflito foi evoluindo, entrou arma, drogas, polícia e fomos perdendo muitas amizades, amigos, conhecidos e pessoas próximas morreram”. 

O relato do editor de vídeo e rapper Luciano Leite, de 34 anos, parece a narração de uma cena muito comum em grandes cidades como São Paulo ou Rio de Janeiro, cujos índices de violência são bastante elevados. Mas, essa é uma realidade que está muito próxima de nós, do nosso dia a dia, na nossa Teresina. 

(Foto: Jailson Soares/ODia)

O cenário são as vilas Santa Cruz, São José e Paraíso, no bairro Promorar, zona Sul da Capital. Uma região marcada pela violência e conhecida pelos confrontos entre gangues. Palco de muitas mortes, falta de estrutura, famílias destruídas, mas também de música, arte e esperança. Apesar da rivalidade entre os grupos, o desejo de tornar as comunidades um lugar para todos nunca deixou de existir. 

Luciano Leite reside na Vila Santa Cruz e já presenciou muitos conflitos. Ele, junto com o rapper Preto Kedé, morador da Vila São José, foram os primeiros a buscarem uma pacificação através da música.

“O hip hop entrou de uma forma construtiva. Na época, começamos com a dança e, nesse meio da cultura hip hop, eu conheci um cara que era viral, que é o Kedé, mas só viemos ter contato quando criamos o grupo ‘A Irmandade’, onde tentamos falar e transparecer para aqueles envolvidos em conflitos de gangues através da música”, afirma.

O começo da mudança 

O rapper conta que a parceria provocou um período de turbulência entre as duas comunidades. Se transitar entre as vilas São José e Santa Cruz era complicado, a junção dificultou ainda mais. “Então, começamos a escrever, a gravar as músicas e nessa caminhada as pessoas foram vendo que estava tendo resultado, foram abraçando a ideia e fomos ganhando o respeito de todos, até o ponto de chegar a termos acesso, tanto eu lá [Vila São José], quanto o Kedé aqui [Vila Santa Cruz]”, disse.

O rapper Luciano Leite hoje tem trânsito livre entre as vilas por anos consideradas inimigas (Foto: Jailson Soares/ODia)

Se antes o acesso era limitado, tanto para os moradores como para quem precisava se deslocar pela cidade, como taxistas e mototaxistas, essa parceria entre Luciano e Kedé foi criando, aos poucos, uma certa tranquilidade para a população e tornou-se cada vez mais presente na vida das comunidades.

Antes, até quem não era envolvido com o conflito de gangue e grupos rivais tinha medo. Pessoas, pais de família, mães. A gente que viveu isso também tinha medo, até hoje temos um pouco de receio de dobrar a rua e topar com alguém, mas hoje a gente ganhou muito respeito das comunidades e somos conhecidos”, salienta Luciano Leite.

Raízes do conflito 

Os conflitos entre as vilas Santa Cruz, São José e Paraíso iniciaram em 2009, após a morte de um jovem que jogava bola em um campo de futebol na região. “Ainda éramos moleques e eu vi isso de perto. Ele morava na Vila Paraíso, então eles vingaram a morte do rapaz na Vila São José, e foi assim que começou, um eliminando o da outra comunidade”, conta Luciano Leite, acrescentando que, desde então, centenas de pessoas foram assassinadas por conta dessa rivalidade.

Cenário esse que está bem diferente atualmente. Graças à música, a comunidade está vivendo dias mais tranquilos e a rivalidade entre as gangues diminuiu o derramamento de sangue. “Ainda ouvimos, vez ou outra, tiros sendo disparados na comunidade durante a madrugada. Mas hoje já conseguimos ver as pessoas andando nas ruas, crianças brincando e as pessoas estão mais sossegadas. A gente está vendo que deu resultado, não só com a música, mas a cultura e em organização”, confessa.

Por: Isabela Lopes e Sandy Swamy
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