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Do outro lado do oceano: Piauienses relatam desafios de morar fora

Nesta reportagem, o Jornal O DIA conta histórias e diferentes motivações que fizeram piauienses atravessarem oceanos rumo a novas perspectivas de vida.

27/07/2019 11:42

A busca por qualificação nos estudos, oportunidade de trabalho e convívio social com maior nível de segurança estão entre os desejos mais comuns encontrados nas histórias das pessoas que decidem deixar o Brasil. Mas como toda mudança, trocar de país exige adaptação.

Mudança da língua, da cultura e o convívio com a saudade de quem deixa familiares e amigos para trás são os desafios que também ganham destaques quando, longe da terra de onde nasceram, os então imigrantes conseguem colocar em perspectiva o que ganham e o que perdem com a escolha. 

Nesta reportagem, o Jornal O DIA conta histórias e diferentes motivações que fizeram piauienses atravessarem oceanos rumo a novas perspectivas de vida.

Portugal: adaptação ao idioma e segurança

Se a preocupação da adaptação a um novo idioma está entre os desafios de quem escolhe um novo país, para quem decide tornar Portugal casa, o impacto não é tão imediato assim. Apesar de diferentes, o português do Brasil e o português de Portugal são similares e facilitam a comunicação de quem transita entre os dois países. 

Stênio França vê na adaptação ao idioma um dos destaques positivos para quem fixa moradia no país. (Foto: Arquivo Pessoal)

Prestes a completar um ano morando em terras portuguesas, Stênio França vê na adaptação ao idioma um dos destaques positivos para quem fixa moradia no país. Mas não só esse. “Existem muitas coisas boas, mas também ruins de morar fora. O mais importante de tudo, eu acho que é a segurança. Outra coisa é que o seu poder de compra é muito diferente do Brasil. Aqui, você consegue ter as coisas sem sentir que tem batalhar muito. A saúde também é boa e tem o fator linguístico que ajuda bastante”, destaca. 

"Aqui, você consegue ter as coisas sem sentir que tem batalhar muito", diz o jornalista Stênio França.

As considerações positivas, no entanto, não anulam o desafio de se adaptar à nova cultura e à necessidade de criar novos ciclos sociais e de trabalho com a mudança de país. Stênio, que chegou a morar três meses na Califórnia, nos Estados Unidos, antes de encontrar o marido que também se mudou de Teresina para a cidade de Porto, em Portugal, deixou para trás a atuação em jornalismo para buscar novas opções de renda no novo endereço.

 Stênio e Luciano pretendem conseguir visto de moradores. (Foto: Arquivo Pessoal)

Atualmente, os dois já trabalham na cidade portuguesa e o marido de Stênio dá seguimento a uma especialização – curso, este, que possibilitou a estadia dos dois no novo país. “Eu sempre quis viver essa experiência e tive algumas oportunidades antes para migrar, mas iam aparecendo coisas no Brasil que me fazia adiar. Até que chegou a hora certa e então comecei a me planejar. Primeiro, muita organização de planejamento e financeira. Consegui uma bolsa na Califórnia, passei três meses lá, e o Luciano se inscreveu em cursos, bolsas de pós-graduação e conseguiu uma especialização em Portugal e foi tudo se encaixando, no final de 2017 para 2018, depois de um ano e meio de planejamento, conseguimos organizar tudo para mudar”, explica. 

organização envolveu a economia de uma quantia considerável em dinheiro, retirada de visto de estudante e organização de estadia e ocupação nos futuros países. Uma extensa lista de burocracias que todos imigrantes têm de cumprir para morar de forma legalizada em países estrangeiros.

 Stênio e Luciano, agora, pretendem conseguir visto de moradores para ter acesso à aquisição de bens e serviços no país português. “Os prós são muitos, mas contras tem a saudade. O Brasil é muito bom, as pessoas de lá são diferentes e eu sinto muita saudade da comida, família, amigos, porque quando você muda, você literalmente nasce de novo. É um processo que precisa ter muito equilíbrio emocional e, aos poucos, você vai encontrando o equilíbrio”, finaliza. 

"É um processo que precisa ter muito equilíbrio emocional e, aos poucos, você vai encontrando o equilíbrio”, conta Stênio França.

Estados Unidos: pesquisa e ciência ampliam as oportunidades

Na infância, Yatta Linhares Boakari teve a experiência de morar nos Estados Unidos com sua família em virtude da conclusão de estudos de pós-doutorado do pai. O que não dava para imaginar é que, anos depois, esse também seria seu motivo para que ela voltasse a se fixar no país. Após recém concluir o doutorado, em Lexington no estado do Kentucky, ela e o marido fixam moradia agora no estado do Alabama. 

Yatta Linhares Boakari deu continuidade aos estudos no EUA pelo programa Ciências Sem Fronteiras. (Foto: Arquivo Pessoal)

Morando na América do Norte desde 2015, a pesquisadora se engrandece em experiências através das oportunidades de estudo. “Fiz mestrado em veterinária em Botucatu no interior de São Paulo, consegui uma bolsa para ficar três meses pesquisando nos Estados Unidos, em Kentucky, e eu gostei muito. Vi que era uma oportunidade boa e perguntei se podia voltar pro doutorado. Não me imaginava ficando em Teresina, acho que mudar para o exterior foi meio que um sonho antigo e as coisas foram dando certo”, considera. 

"Não me imaginava ficando em Teresina, acho que mudar para o exterior foi meio que um sonho antigo e as coisas foram dando certo”, revela Yatta Boakari.

À época, o que ajudou Yatta a sair do Brasil e dar continuidade aos estudos no exterior foi o programa Ciências sem Fronteiras, que também facilitou a regularização tanto dela quanto do marido que a acompanhou na empreitada no novo país. Agora, ela passa para um novo desafio: o de fazer residência, ainda na área de veterinária, em uma nova cidade.

“Acabei o doutorado dia 14 de junho e pensei: bom, não estou pronta para voltar para o Brasil. Então meu co-orientador orientou que eu fizesse residência e eu achei que seria uma boa opção. Na residência, você se inscreve em várias universidades e faz entrevistas. Escolhi fazer residência no Alabama, onde já começo a estudar agora”, destaca. 

Para a mudança, a pesquisadora sempre escolhe se fixar em casas já mobiliadas. Foi em assim em Kentucky e, agora, quando ela, o marido, a cachorra e um lagarto iniciam uma nova jornada no estado do Alabama, também.

Yatta e o marido agora residem no estado do Alabama. (Foto: Arquivo Pessoal)

Os cinco anos que Yatta acumula de experiência vivendo longe do seu país de origem a dão uma dimensão precisa de todos os pontos positivos e negativos que estão em questão ao escolher viver longe da sua terra natal. A adaptação a uma nova cultura, como ela considera, ainda é algo que pesa diariamente, mas os ganhos da mudança são ainda maiores.

Londres: vida agitada e oportunidade de conhecer o mundo

Mesmo morando em Teresina, Lívia Moura sempre teve o sonho de conhecer vários países do mundo. Esse sonho se transformou em realidade de forma mais facilitada quando, há cinco anos, ela deixou o Brasil. Morando na Inglaterra após casamento com o marido que já morava na cidade da rainha, entre as boas novidades trazidas pela mudança, ela destaca que está o fato de ter acesso a outros locais do mundo de forma mais barata e ágil. 

 Lívia Moura sempre teve o sonho de conhecer vários países do mundo. (Foto: Arquivo Pessoal)

“Eu nunca tinha cogitado realmente morar em outro país, nunca tinha sido um sonho morar, tinha vontade de viajar, conhecer outros lugares, mas não morar. Essa ideia só veio quando comecei a namorar a pessoa que é meu atual marido e, como estava no relacionamento à distância, tivemos que pensar na maneira que faríamos: ou ele se mudaria para o Brasil ou eu viria pra Londres. A gente teve que colocar na balança a questão de adaptação e, no final, decidimos que era mais fácil vir pra Londres, porque falo inglês, ele não fala português; eu tinha diploma, ele não, então foi isso que pesou na balança e eu decidi vir morar aqui”, explica. 

Mas a efetivação da mudança envolveu muito esforço concentrado. É que o processo de tirar o visto para o país, mesmo com o casamento realizado, não é um processo simples. Ela e o marido contrataram um advogado, que morava em Londres, para cuidar dos requisitos. Até a mudança para Londres e a organização da papelada, foi preciso um processo de cerca de um ano. 

“Como meu visto era pra família tinha muita coisa que tinha que provar. O Adam tinha que provar que estava trabalhando, há quanto tempo morava em Londres, mostrar nossos extratos bancários, tínhamos um folder que era umas 50 páginas de papelada”, relembra. Lívia considera que a cidade oferta muita oportunidade de trabalho, no entanto, não necessariamente na área de atuação que a pessoa já tenha. Ela, que trabalhava com comunicação no Piauí, se viu assumindo, por dois anos, a gerência de um restaurante na cidade.

Lívia mudou-se para Londres onde mora o marido. (Foto: Arquivo Pessoal)

Lívia destaca que o trabalho no restaurante, apesar de bem remunerado, necessitava de uma carga horária muito exigente. Por isso, aos poucos, ela conta que buscou prospectar a área de comunicação. “Se você era advogado e quer advogar, por exemplo, não é tão fácil porque aqui eles consideram a experiência local e assim vale para as outras profissões. Ou é indicado que você comece por trabalhos voluntários ou algum estágio. Foi isso que fiz. Comecei um trabalho voluntário para ter oportunidade de trabalhar com comunicação”, afirma.

Além das oportunidades e da possibilidade de conhecer o mundo pela facilidade em acessar bens e serviços, Lívia destaca que nos contras pesam o custo de vida, que é muito alto na cidade inglesa e, claro, a saudade de quem ficou no Piauí. “Moro em Londres já faz cinco anos e sinto falta de muita coisa: família, amigos, de uma intimidade que só aí a gente tem de ir na casa do vizinho e perguntar o que tá fazendo. Aqui, as coisas são cronometradas, você tem que planejar com muita antecedência; se você trabalha em restaurante, tem que pedir folga para ver alguém. Sinto falta de ter mais intimidade com as pessoas e também do clima, aqui tá sempre chovendo, nublado”, elabora. 

"Sinto falta de ter mais intimidade com as pessoas e também do clima, aqui tá sempre chovendo, nublado", ressalta Lívia Moura.

No entanto, para serenar a saudade, a piauiense encontrou um abrigo: uma loja que vende produtos brasileiros. É comendo cuscuz, tendo acesso a frutas e comidas feitas como no Brasil, que o aperto da distância diminui. Para ela, ainda é uma opção voltar a morar no Piauí, mas a perspectiva se dará a longo prazo. Agora, trabalhando com comunicação e buscando organizar melhor o tempo e a saúde, o objetivo é estar focada na próxima vinda.

Por: Glenda Uchôa
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