O anúncio da contratação de Pia Sundhage para o comando da seleção brasileira feminina de futebol desperta a expectativa sobre que tipo de novidades a treinadora poderá trazer não só para a equipe nacional, mas também para o desenvolvimento da modalidade no país.
Essa expectativa é justificada pelo currículo vitorioso da sueca, bicampeã olímpica e vice-campeã mundial com os EUA, além de prata nos Jogos Olímpicos do Rio-2016 com a Suécia.
A nomeação de uma profissional estrangeira para o cargo é inédita na seleção feminina, mas já ocorreu na masculina no passado.
Primeiro técnico de fora do país a assumir a seleção, o uruguaio Ramón Platero comandou o Brasil nas Copas Américas de 1923 e 1925. Mas foi seu trabalho em clubes do Rio de Janeiro que conseguiu deixar um legado de inovações para a prática de futebol no país.
Técnico do Uruguai no Sul-Americano de 1919, disputado no Rio, Platero foi anunciado naquele mesmo ano como treinador do Fluminense. Em 1922, foi para o Flamengo, mas se viu envolvido em situação que só mesmo o futebol amador permitiria: também assessorava o departamento de futebol do Vasco, à época na segunda divisão carioca.
Com o acesso vascaíno à elite em 1923, escolheu seguir no cruz-maltino.
"Ele pede ao Flamengo que incluíssem o regime de concentração, com alimentação, e aparatos de ginástica. O Vasco lhe oferece o que ele havia solicitado, e dessa forma ele deixa o Flamengo.", diz à reportagem o presidente da Associação Uruguaia de Treinadores, Ariel Longo, autor do livro "Ramón Platero –El Rey Oculto".
No fim da década de 1930, surgiu no Brasil, sob a batuta de um húngaro, o que provavelmente foi a principal mudança tática do futebol brasileiro: a introdução do WM, primeiro sistema tático moderno.
O Flamengo contratou Dori Kürschner para substituir Flávio Costa, rebaixado a assistente da comissão técnica. No clube carioca, implementou a linha de três defensores, uma resposta que o futebol europeu havia dado à mudança na regra do impedimento.
A novidade seria aplicada na formação do time que Flávio Costa montaria na seleção da Copa de 1950.
Após aquele Mundial, outro húngaro desembarcaria no país para trazer aspectos táticos novos e influenciar o futebol como um todo. Béla Guttmann chegou ao São Paulo em 1957. Com ênfase em trabalhos de organização da equipe e treino de fundamentos, tentava mostrar aos atletas, na prática, como fazer cada exercício.
Assim como Flávio Costa fizera com Kürschner, Vicente Feola aproveitou a passagem de Guttmann para aprender conceitos e ampliar seu conhecimento teórico. Com o esquema que herdou do húngaro, o 4-2-4, comandou a seleção brasileira ao seu primeiro título mundial, em 1958.
No futebol globalizado, diminuiu de maneira significativa a importância desse tipo de intercâmbio. As informações sobre como se joga em diversos países estão à disposição dos profissionais do esporte.
Contudo, para o futebol feminino brasileiro, que ainda está em desenvolvimento, a aparição de Pia Sundhage pode surtir efeito semelhante, se não em aspectos táticos, como Kürschner e Guttmann, em questões organizacionais e de estrutura, como Platero.
Fonte: Folhapress