De origem latina, a palavra Saudade só existe na língua portuguesa, de acordo com estudiosos. Para uns, a saudade é a presença mais viva de quem está ausente; para outros, é um sentimento misterioso que remete à perda, seja ela de um ente querido, de um objeto estimado, de um momento vivenciado ou mesmo de algo que nem se chegou a vivenciar, como se estive voltando de outras vidas, de outras dimensões.
Acredita-se que a palavra saudade tenha surgido na época da colonização do Brasil, quando da exploração dos portugueses. Como na maioria dos casos não era possível trazer a família consigo, muitos deles sofriam com a solidão, estando num lugar estranho, sem os seus próximos e tinham a sensação melancólica de lembrança e falta da companhia. Com isso foi criado o termo saudade para representar esse sentimento.
A origem do termo saudade está ligada a duas palavras do latim, com significados diferentes porém contextos similares, sendo que a primeira é da palavra “solitáte”, que significa solidão e representa a sensação de estar sozinho, sem as pessoas que são próximas a você, com uma lembrança daqueles que estão longe, ou mesmo a ausência definitiva de pessoas, objetos ou situações, pode se dizer que é um sentimento mais nostálgico, daquilo que não voltará mais. A segunda é a palavra “solitude” e está mais relacionada a saudade daqueles que esperam por alguém ou algo que partiu, porém que voltará um dia.
O músico Paulo Aquino definiu esse sentimento, através de um poema: “ São muitos os sentimentos/Que povoam nosso peito/Nem sei dizer ao certo/Às vezes longe, outras tão perto,/Que chega a corroer a alma./É a saudade, essa ingrata, /Que machuca, que maltrata/Que fere e tira a razão;/Estraçalha o coração/E nos deixa sem destino/E vai embora de mansinho,/E quando isso acontece/Nossa vida se renova/E o corpo rejuvenesce/Com essa enchente de carinho!”
Da nova geração, o poeta João Henrique Vieira assim mostrou a saudade: “Risos pela rua da infância que não se atravessa mais. Saudade é o que pesa pela não presença, nos move em silêncio ou aos gritos surdos. A mão que toca imperceptível. Uma senhora de cabelos brancos e voz mansa chamando pra ontem. Porta aberta sem caminho. Mas que pensa na saudade do que não aconteceu, a ideia sem sangue, sem força e padecida nos olhos tristes do que não houve. A saudade pode ser ainda a chama da alegria presa na ladainha das histórias felizes – ainda felizes por está ao longe do tédio da realidade. O que traz o suspiro e deixa levemente ir se agarrando nos instantes do que parece bom. A excitação e o desfalecer no mesmo quadro. Um quadro sem parede.
Um dia uma senhora me falou que a saudade do pai que estava no céu fazia o menino empinar pipas enviando recados ao pai – pensei que a saudade é também a inocência do incompreensível.
E a chuva que está dentro da gente guardada quase deságua, mas corremos à procura de abrigo, porque fica apenas na saudade a alegria de correr aos risos pela rua atrás dos pingos do que já fomos.”
O poeta e publicitário Durvalino Couto ressalta a pluralidade do sentimento em questão: "Saudade é uma palavra que fala de um sentimento muito plural, variado. Pode ser angustiante quando é a saudade de uma pessoa querida que partiu, foi embora ou morreu. Essa é a saudade que dói.
Ter saudade da infância ou da juventude já não é tão doloroso, e a gente pode mergulhar nas lembranças de bons momentos vividos e que deixaram marcas profundas.
Nosso cancioneiro diz que saudade é uma “palavra triste / quando se perde um grande amor”. Nosso poeta Torquato Neto, na canção “A Rua” (que fez em parceria com Gilberto Gil), ao lembrar das ruas do Barrocão e da Pacatuba onde nasceu e passou a infância, diz com entusiasmo: “Eu volto pra matar essa saudade”.
Saudade de um grande amor é um sentimento difícil de conviver e aceitar. Cala profundo no peito e só o tempo nos ajuda a superar.
Apesar da dor que provoca, não resta dúvida que saudade é uma palavra bonita, é uma palavra linda!", observa.
Já o professor e escritor Cineas Santos deixa claro que não está no time dos saudosistas: “Decididamente, não me enquadro na categoria dos saudosistas. Nunca me esqueço do dia em que o cartunista Lapi afirmou: "Só tenho saudades do futuro". Eu acrescentaria: nem o futuro me tira o sono. Vivo o que me é dado viver no presente, sem maiores inquietações. No ginásio, tive uma professorinha de português que afirmava, escandindo as sílabas: "Sau-da-de é um idiomatismo da língua portuguesa". Não me contive: um idiotismo inútil.”
“Ainda hoje, não entendo o porquê de o soneto "Saudade", de Da Costa e Silva fazer tanto sucesso. "Saudade! Asa de dor do pensamento!" é uma metáfora bem ruim.. O velho Da Costa escreveu coisas muito melhores, mas o tal soneto caiu no gosto popular. Atento aos rumores do presente, não me sobra tempo para pensar no perdido. Fecho com Vinícius: "Meu tempo é quando"”, assinala.
Saudade
Da Costa e Silva: Saudade
Saudade! Olhar de minha mãe rezando,
E o pranto lento deslizando em fio...
Saudade! Amor da minha terra... O rio
Cantigas de águas claras soluçando.
Noites de junho... O caburé com frio,
Ao luar, sobre o arvoredo, piando, piando...
E, ao vento, as folhas lívidas cantando
A saudade imortal de um sol de estio.
Saudade! Asa de dor do Pensamento!
Gemidos vãos de canaviais ao vento...
As mortalhas de névoa sobre a serra...
Saudade! O Parnaíba - velho monge
As barbas brancas alongando... E, ao longe,
O mugido dos bois da minha terra...
Saudade
Fernando Pessoa
Como um grande borrão de fogo sujo
O sol-posto demora-se nas nuvens que ficam.
Vem um silvo vago de longe na tarde muito calma.
Deve ser dum comboio longínquo.
Neste momento vem-me uma vaga saudade
E um vago desejo plácido
Que aparece e desaparece.
Também às vezes, à flor dos ribeiros
Formam-se bolhas na água
Que nascem e se desmancham.
E não têm sentido nenhum
Salvo serem bolhas de água
Que nascem e se desmancham.
SAUDADE
Mário Quintana
Na solidão na penumbra do amanhecer.
Via você na noite, nas estrelas, nos planetas,
nos mares, no brilho do sol e no anoitecer.
Via você no ontem , no hoje, no amanhã...
Mas não via você no momento.
Que saudade...
Por: Marco Antônio Vilarinho