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Educação: vinculação de recursos, Fundeb e escola de tempo integral

Confira o texto publicado na coluna Piauí Presente no Jornal O Dia.

29/10/2019 08:39

Aprovada a reforma da Previdência, o governo vai centrar o debate agora na reforma tributária, que, na sua visão, envolve uma dimensão mais orçamentária, a desvinculação de recursos. 

Um articulista do jornal Valor Econômico (jornalista e não liderança política) defende a proposta que está sendo levantada na equipe de governo de que a vinculação dos percentuais mínimos da receita corrente líquida para educação e saúde sejam fundidos, ficando ao arbítrio de cada estado e cada município fazer a divisão proporcional conforme sua realidade. Hoje esses percentuais são: educação: 18% para a União e 25% para Estados e Municípios; saúde – 8% para a União, 12% para os Estados e 15% para os Municípios. 

A proposta em si não é descabida. O que me chamou a atenção foi um argumento apresentado pelo articulista: “atualmente, alguns municípios mandam pintar as escolas duas vezes por ano, para cumprir o percentual de 25% exigido”. Grande sofisma, para não dizer grande bobagem. 

Sabemos das dificuldades que temos tido para melhorar a qualidade da escola pública, que complete o grande avanço que tivemos no atendimento quase universalizado da população em idade escolar. Ora, qual o desempenho – no IDEB e no ENEM, por exemplo - das escolas nos municípios que estão “pintando os prédios escolares duas vezes por ano”? 

Tenho convicção de que o caminho para a melhoria da qualidade é a implantação de escolas em tempo integral. Teremos recuperação do aprendizado dos alunos no processo, aprofundamento de estudos, atividades complementares nas áreas artística e esportiva, trabalho em equipes, dedicação exclusiva do professor à mesma escola, permitindo uma gratificação, etc. Dizer que “sobram recursos” para a educação enquanto não tivermos universalizado a escola em tempo integral, da creche ai ensino médio, não faz sentido. 

O MEC vem incentivando a adoção da escola de tempo integral no ensino médio, destinando uma complementação de R$ 1.000,00/ano ao valor do FUNDEB. Essa precisa ser uma política para toda a educação básica. E qualquer proposta de mudança das regras orçamentárias não pode desconsiderar o debate que está sendo feito em torno do novo FUNDEB, a vigorar a partir de 2021. Hoje, a primeira luta é para sua manutenção. Em segundo lugar, é sua transformação de Fundo temporário em Fundo Constitucional Permanente como os Fundos de Desenvolvimento do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. 

Garantidas essa condições preliminares, precisamos definir a participação da União na composição do FUNDEB e sua destinação. Atualmente, os grandes mantenedores do FUNDEB são os estados. Somando os valores para o Brasil, embora os fundos sejam separados, o montante aportado pelos Estados é em torno 62% e dos Municípios 32%; a complementação da União é de apenas 10% do que foi recolhido dos Estados e Municípios. A consequência disso é que para a maior parte dos Estados, os 20% da receita corrente líquida que eles colocam no FUINDEB é redistribuída para seus municípios. No Piauí, por exemplo, 53% dos 20% da receita corrente líquida depositado no FUNDEB vai para os municípios. Não acho isso ruim; o que se faz necessário é a maior participação da União.

É bom entender isso. Pois, como o FUNDEB é formado por fundos contábeis estaduais, mas administrados centralmente pela União, fica parecendo que estamos tratando com transferências federais. De fato, a complementação da União só vai para 10 estados e corresponde, para os estados beneficiados, a no máximo 20% do total recebido por Estados e Municípios. 

Defendo que essa ampliação da contribuição da União suba para 30%. Hoje o FUNDEB no Brasil soma R$ 150 bilhões e a União contribui com R$ 15 bilhões. A esses valores se somam mais 5% da receita corrente líquida de Estados e Municípios que não integram o FUNDEB. Com o aumento da contribuição da União teríamos R$ 45 bilhões, sendo que os R$ 30 bilhões adicionais seriam transferidos a todos os estados e vinculados à implantação do ensino em tempo integral, em toda a educação básica.  

A implantação pode ser até progressiva. Já é assim na creche; começa a ser implantada no ensino médio e seria progressivamente implantada na pré-escola e no ensino fundamental, duas séries a cada ano. 

O valor por aluno do FUNDEB tem como base o que é definido para os anos iniciais do ensino fundamental urbano. Para as outras etapas e para a zona rural, há um acréscimo que vai de 5% a 30%. 

Para 2019, o maior valor per capita básico por aluno é de R$ 4.888,00 em Roraima que não recebe complementação da União. No Rio Grande do Sul é R$ 4.275,00, no Amapá R$ 4.169,00; em São Paulo é R$ 3.909,00, que também não recebem complementação. No Piauí e nos outros nove estados (do Nordeste, exceto Sergipe e maios Pará e Acre) que recebem complementação da União, o valor anual per capita é R$ 3.380,00. Para as escolas de tempo integral, no Rio Grande do Sul, o valor per capita anual aumenta para R$ 5.558,00 e no Piauí e estados que recebem complementação aumenta para R$ 4.210,00. 

No novo FUNDEB, ao invés de aumentar 30% em cima do valor básico dos anos iniciais do ensino fundamental urbano, esse aumento poderia ser de 50%. Teríamos então um per capita anual por aluno das escolas de tempo integral de R$ 5.070,00. Esse é o ponto fundamental: vincular a ampliação dos recursos e a redistribuição para estados e Municípios à progressiva expansão do ensino em tempo integral. Reforço adicional precisaria o ensino técnico profissional de nível médio. Esse é o caminho para superarmos o impasse em que estamos na melhoria da qualidade da educação básica pública no Piauí e no Brasil.

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