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Quem cuida da mulher?

Mesmo velho, mesmo não sendo mais sexualmente útil, o homem consegue uma mulher para transformar em cuidadora de idosos não remunerada

29/06/2017 15:22

Manifestar o desinteresse pelo casamento ou pela maternidade pode representar um ato de resistência para as mulheres. É que a informação jamais será dada sem receber em troca manifestações contrárias e o questionamento tão comum: “Mas quem vai cuidar de você na velhice?”.

A pergunta, que já é uma crítica disfarçada, revela muito sobre o papel que a sociedade conservadora delega à mulher. Retirando a máscara de preocupação com o futuro, o questionamento que se faz é: “Como assim você não quer ser mãe? Que absurdo uma mulher não querer casar! Esse é seu papel e você está fugindo da sua obrigação”. Ou seja, é casamento compulsório e maternidade idem.

É nessa circunstância que eu falo sobre ato de resistência. Explicar para essas pessoas o motivo de não querer seguir o caminho usual da maioria das mulheres é um tanto cansativo. Não por falta de argumentos, mas porque eles não convencem. E nem precisariam convencer, se as pessoas entendessem que as decisões que cada uma toma para sua própria vida não é de domínio público, ou seja, não é passível de receber pitacos.


Idosas do Abrigo São Lucas, em Teresina (Foto: Assis Fernandes/ODIA)

A questão fica óbvia quando notamos a diferença de tratamento com o homem, quando ele diz que não quer casar e nem ter filhos. A informação é recebida com piadas e até elogios. É porque o cara é garanhão, pegador, porque ainda está vivendo a vida. “Tá certo, você é muito novo pra pensar nisso”, dizem alguns.

Ou então ninguém diz nada. Passa despercebido, não gera polêmica, muito menos questionamentos do tipo “quem vai cuidar de você na velhice?”. E aí se revela mais um aspecto que confirma o machismo da nossa sociedade. Sim, novamente ele, presente em todos as esferas da vida.

O homem geralmente encontra alguma mulher para cuidar dele. Mesmo velho, mesmo não sendo mais sexualmente útil, consegue alguém – na maioria das vezes mais jovem – para transformar em cuidadora de idosos não remunerada. Mas da mulher ninguém cuida.

Neilson Meneses, professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal de Sergipe, chegou à mesma conclusão. Ele publicou no site da instituição o texto “Mulheres envelhecem sós, os homens em companhia”, com base em informações sobre formas de convivências, divulgadas pela PNAD 2011. “Parece ser, que a situação de inserção na família e estado conjugal, tendo em conta as diferenças de gênero, apresenta aparentemente mais ‘vantagens’ para os idosos que para as idosas, que seriam, portanto, mais propensas à vulnerabilidade”, diz o professor.

O fato é que filhos não garantem à mulher qualquer segurança na velhice. As idosas que estão em abrigos geralmente são mães não apenas de um, mas de muitos. Casamento, então, nem precisa falar sobre isso. Quantos homens você conhece cuidando de suas esposas?

Portanto, vamos parar de questionar as mulheres que não querem casar ou ter filhos. Nada garante que alguém vá cuidar delas. Que possam pelo menos ser felizes na juventude, sem ninguém metendo o bedelho na escolha que fizeram para suas vidas.

Fonte: Nayara Felizardo
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