Portal O Dia - Notícias do Piauí, Teresina, Brasil e mundo

WhatsApp Facebook Twitter Telegram Messenger LinkedIn E-mail Gmail

Gestão Pública e Gestão Privada, existem diferenças?

Afirmações como essa, apesar de revestidas por uma oportuna didática, não refletem as diferenças marcantes entre "Gestão Pública" e "œGestão Privada".

29/01/2020 12:40

Frequentemente me deparo na mídia impressa e digital com declarações referentes às eventuais semelhanças entre “Gestão Pública” e “Gestão Privada”. Recentemente escutei o seguinte pronunciamento: “O Brasil passa por um período de contenção de gastos, é como se fosse na nossa casa, só podemos gastar quando temos dinheiro, ou priorizamos ou ficamos sem dinheiro na metade do mês ...”. Afirmações como essa, apesar de revestidas por uma oportuna didática, não refletem as diferenças marcantes entre "Gestão Pública” e “Gestão Privada”. 

Se considerarmos uma linha temporal, a Gestão Privada (ou Administração de Empresas) surge como ciência no início do século XX, enquanto campo específico do conhecimento. Nessa época, o francês Henry Fayol e o americano Frederick Taylor (que nos anos 20 teve sua teoria colocada à prova por Henry Ford, fundador da companhia automobilística que leva seu nome) constituíram-se nos dois expoentes da Administração de Empresas. Nesse contexto, origina-se a característica fundamental desse campo do conhecimento – o Lucro, ou seja, toda empresa, como condição sine qua non para sua existência e perpetuação, deve perseguir processos de gestão eficientes, de forma a obter continuamente receitas maiores que despesas. Se, ao longo do tempo, uma empresa apresentar períodos consecutivos de prejuízo, certamente estará condenada ao encerramento das suas atividades. Portanto, é na ocorrência do Lucro que a iniciativa privada afirma a razão da sua existência.

Trinta anos mais tarde, por volta de meados do século XX, surge a Administração Pública (ou Gestão Pública), enquanto campo específico do conhecimento. Pode ser vista como uma derivação da “ciência política”, ao relacionar métodos científicos às formulações e decisões dos governos.

Nesse sentido, os americanos Harold Laswell e Herbert Simon podem ser considerados como os primeiros teóricos a delimitar o campo de atuação da Administração Pública. Aqui não é o “Lucro”, mas o “bem comum” o orientador das ações (que por sua vez materializam-se por intermédio das políticas públicas).

Conceitualmente, o “Lucro” exprime até que ponto uma atividade empresarial foi ou está sendo exitosa, enquanto a efetividade das políticas públicas implementadas (tendo preferencialmente como foco o público-alvo de uma população, expresso geralmente pelo número de cidadãos beneficiados) indica até que ponto os governos têm atingido os resultados esperados.

Ademais, o poder público tem uma característica única, que o diferencia sobremaneira das organizações privadas – a longevidade. O poder público corresponde, em última instância, à uma pessoa jurídica que representa a sociedade civil de um país, ad eternum. Daí decorre a noção de perenidade dos serviços públicos. Nesta seara, aparece uma situação particular, que nos remete à figura da empresa pública, popularmente conhecida por “estatais”. Mesmo operando eventualmente com déficit (prejuízo), não podem encerrar suas atividades, pois poderiam causar transtornos sociais, delineando uma situação de calamidade pública.

Fornecimento de luz, distribuição de água e coleta de esgotos e recolhimento de lixo constituem bons exemplos da necessária e permanente presença do Estado. Paralelamente, investimentos públicos em pesquisa e desenvolvimento, operacionalizados pelas estatais (a EMBRAPA – Empresa Brasileira de Agropecuária – seria um desses casos), revelam a importância estratégica dessas empresas, na medida em que os benefícios auferidos mais do que justificam os investimentos direcionados (os estudos da EMBRAPA geraram descobertas de novas sementes, proporcionando ao agronegócio brasileiro vantagens competitivas decisivas no mercado internacional). Nos próximos artigos aprofundaremos essa discussão, observando não só eventuais formas de privatização dos serviços públicos, como também as condições político-econômicas em que tal movimento seja pertinente.

Vale destacar uma expressão muito utilizada, atualmente associada, de certa forma, a um sentido pejorativo – “Gasto Público”. O Estado não gasta dinheiro, na acepção literal do verbo “gastar”. Todo centavo do orçamento público vai parar na mão de pessoas (seja uma pessoa física ou uma pessoa jurídica, nesse caso representada pelo seu proprietário). O “gasto” não vai parar na mão de um ente chamado “Educação”, “Saúde”, “Segurança Pública”, “Dívida Pública” etc. Vai parar sim, na mão de pessoas e serviços contratados – médicos, ambulâncias, serviços hospitalares, viaturas, escolas, professores, detentores de títulos da dívida pública, dentre outros. O Estado apenas indica, através de uma máquina tributária instituída, quem “paga” a maior parte da conta e para onde vai esse dinheiro. Simples assim, é exatamente isso. Alguns podem perguntar, mas e a corrupção? Bem, corrupção existe em menor ou maior proporção desde a fundação do império romano, há mais de dois mil anos. Logicamente, governos criam instituições para tentar coibir esse flagelo, porém ela está presente em qualquer país do mundo, disso não tenham dúvida.

Mais sobre: