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Um grão de Trigo, NgÅ©gÄ© wa Thiong'o

Obra é traduzida no Brasil pela primeira vez

22/09/2015 13:55



Um grão de Trigo (1967) relata o movimento popular que deseja a independência do Quênia – até então colônia britânica. No romance, a rebelião batizada pelos ingleses de Mau Mau, mas que era nomeada pelos nativos de Exército Terra e Liberdade, é recapitulada – entre 1952 e 1960 foi declarado estado de emergência no país, devido a guerra, que matou uma quantidade absurda de quenianos.

Embora o movimento tenha sido massacrado pelos britânicos, mais tarde foi fundamental para a conquista da liberdade do país. O ex-preso político e revolucionário Mugo é o protagonista. Ele sobreviveu às mais terríveis torturas no tempo em que esteve nos campos de concentração e dizem nunca ter delatado nenhum companheiro ou repassado qualquer informação, e, por conta disso, é visto como herói. Entretanto, percebemos um personagem que carrega um sentimento de culpa e que, desde então, vive em total isolamento, não casou, sequer constituiu família e que se esquiva de tocar no assunto.

Kihika, líder da revolução da qual Mugo participou, foi preso devido a uma traição e morto em praça pública. Anos depois, alguns membros do movimento tentam desvendar quem teria sido responsável pela delação. Enquanto se desenrolam os fatos principais, o autor vai nos mostrando a história de cada um dos revolucionário, narrando que motivo levou cada um dos personagens a participar do movimento de independência. Alguns por plena convicção e até por aptidão com as questões políticas; outros, para se autoafirmar dentro de suas aldeias; e outros porque acreditavam nada restar a perder. Humanizando essas pessoas que entram para a História de seu país e que com o tempo adquirem um espírito de bravura indubitável, apesar de, muitos deles, temerem o que os aguarda.

As imposições religiosas, como a implantação do catolicismo no país; a alfabetização, que se dá nas escolas, e na língua inglesa, alimentando assim o desprezo pelas línguas maternas, e, consequentemente, enfraquecendo a cultura africana, muito baseada na oralidade. O desejo do escritor parece convergir para o leitor de forma que este possa conhecer a realidade do Quênia. Ele utiliza a literatura como instrumento de potencial reverberação de sua cultura e de seu país – que se vê relegado à sombra dos colonizadores. E não objetiva apenas atingir o leitor exterior ou estrangeiro, mas sim contar a história para os próprios quenianos, que pouco tinham referências literárias nacionais.

Um livro político, em várias de seus vértices. Seja porque foi o primeiro romance do Ngugi escrito em sua língua materna, gikuyo, ou porque traz em seu enredo a luta do povo por sua autonomia territorial, cultural e econômica. Vemos um país africano que devido à dominação britânica tem dificuldade de se reconhecer como um país de negros e dos negros.

Por: Ananda Sampaio ([email protected])

Revisão: Ceiça Souza ([email protected])


Sobre o autor


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NgÅ©gÄ© wa Thiong'o foi convidado da Feira do Livro de Paraty (FLIP) em 2015 onde falou sobre sua obra e lançou dois títulos traduzidos pela primeira vez no Brasil. O queniano atualmente vive nos Estados Unidos, ensinou na Universidade de Yale durante alguns anos, e também na Universidade de Nova York, nas áreas de "Literatura Comparada" e "Performance Studies". NgÅ©gÄ© vê muitas vezes o seu nome nas listas de candidatos ao prémio Nobel da Literatura

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