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"œQual é o seu sonho de consumo?"

O meu é: continuar respirando sem ajuda de aparelhos e sem nada pagar pelo oxigênio consumido.

21/07/2019 08:32

Saideira

Com incômoda frequência, perguntam-me: “Qual é o seu sonho de consumo?”. Engendrei uma resposta que, mesmo não dizendo nada, rende algumas risadas: continuar respirando sem ajuda de aparelhos e sem nada pagar pelo oxigênio consumido. A bem da verdade, como todo mundo, eu também tenho sonhos. Não sei se chegam a enquadrar-se na categoria de “sonhos de consumo”, expressão usada para designar as coisas tangíveis. O certo é que, por algum tempo, acalentei o sonho de voltar para o sertão do Caracol e reinventar Campo Formoso, onde gosto de acreditar que fui feliz.

De cara, dois problemas: hoje, Campo Formoso, ou melhor, o que sobrou do lugar, está encravado no município de Jurema do Piauí, também conhecido como “Coreia”. Já expliquei em outra oportunidade: falta-me valentia para ser um autêntico “juremeiro”. Não bastasse isso, das coisas construídas na pequena gleba sobrou apenas o velho barreiro cavado por seu Liberato. O mais é capoeira infestada de carrapichos. Tem mais um complicador: as quatro pragas que nos infernizam a vida – televisão, celular, moto e revólver – já chegaram por lá. Até em Anísio de Abreu, município sem histórico de violência, os crimes se multiplicam e aterrorizam os moradores.

Acovardado e sem saída, resolvi refugiar-me em meu quintal onde uma nesga de verde e um punhado de passarinhos me propiciam a sensação de estar num país insituável, protegido de todo mal. É só uma ilusão, mas sem ela a vida ficaria insuportável.

No final da semana passada, fui ao Espaço da Cidadania para renovar os documentos do meu carro. Enquanto esperava a minha vez de enfrentar o cipoal da burocracia, abri  uma edição antiga  da revisa Planeta. De repente, deparei-me com a manchete: Liberland – este país tem futuro? Resolvi ler a matéria e acabei descobrindo que um visionário chamado Vit  Judlicka resolveu criar (isso mesmo) um país numa nesga de “terra de ninguém”, encravada entre a Sérvia e a Croácia. São apenas 7Km2 de terra sem qualquer benfeitoria. O país foi “fundado” no dia 15 de abril  de 2015, data do aniversário de Thomas Jefferson. Recebeu o nome pomposo de República Livre de Libertand. As bases filosóficas da nova república me deixaram animado: “Viver e deixar viver”. Segundo o fundador do país, as interferências do Estado na vida dos cidadãos serão mínimas. Outra novidade positiva: a política não será uma profissão e sim um serviço. “Nazistas e comunistas não terão vez”.

Sem pensar duas vezes, decidi vender o que não tenho e mudar-me, de mala e cuia, para Liberland. O nome não me agrada, a bandeira – amarela com uma faixa negra – também não, mas não se pode ter tudo. Quando me concederem o direito à cidadania, vou propor a troca das cores do lábaro por azul e branco.

Irmãos e irmãzinhas, não me tomem por traidor, fugitivo ou vira-folha. Deus é testemunha do meu amor pela Terra Brasilis.  Mas estou um tantinho cansado de viver num país governado, ora por mulheres sapiens, ora por messias truculentos. Não me agrada viver sob a batuta de pastores espertalhões que ditam regras de conduta como os profetas do Velho Testamento. Em tempo, vou adotar um nome mais consentâneo com o meu novo país: Senilovski. Assim seja.                   

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