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A relação entre o uso de drogas e a escolha do Premier do Reino Unido

Celso Pires - Advogado

27/06/2019 10:23

A corrida para se tornar o próximo primeiro-ministro do Reino Unido tomou um rumo inesperado, pois muitos dos candidatos ao cargo não conseguem parar de falar, pasmem, sobre quando foi a última vez que usaram drogas. Essa é a mais recente reviravolta do estranho processo que compreende uma parte ínfima da população, mas que envolve o futuro do “Brexit” e a futura relação do Reino Unido com a União Europeia. Essa eleição está acontecendo neste momento porque a atual primeira-ministra, Theresa May, teve muita dificuldade em se manter no cargo, optando assim por renunciar. Quando assumiu o posto, então ocupado por David Cameron, que renunciou depois que o Reino Unido votou a favor da saída da União Europeia, ela parecia ter chegado para liderar o

país durante anos. Seu partido, o Conservador, tinha maioria na Câmara dos Comuns (equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil) e o líder da oposição, Jeremy Corbyn, havia levado o Partido Trabalhista politicamente para a esquerda, um movimento então visto por muitos como suicídio eleitoral. Depois de vários meses afirmando que não convocaria uma eleição geral, May mudou de ideia e levou o país às urnas em 2017. Sua intenção era aumentar o número de assentos de seu partido, para dar solidez a seu mandato com foco nas negociações com a União Europeia pela saída do país do bloco. Contudo, sua aposta deu errado. O Partido Conservador, liderado pela primeira-ministra britânica, ganhou as eleições gerais, mas perdeu sua maioria absoluta no Parlamento. A crença de que a campanha de esquerda de Jeremy Corbyn espantaria os eleitores estava errada, os trabalhistas ganharam 30 assentos e o partido Conservador perdeu 13. May conseguiu se segurar ao poder contando com o apoio de uma sigla muito menor, o Partido Democrático Unionista (D.U.P., da sigla em inglês), da Irlanda do Norte, isso a um custo político bem maior. A Irlanda do Norte tem a única fronteira terrestre do Reino Unido com a União Europeia, e as exigências do partido em relação a isso dificultaram as tratativas da primeira-ministra quando o “Brexit” deveria estar na reta final. O D.U.P execrou o acordo que May negociou com a União Europeia, assim como muitos outros no próprio Partido Conservador. Como resultado, ela foi derrotada três

vezes na Câmara dos Comuns, uma das vezes por um placar de 432 votos contra 202, a maior derrota de um governo na história. Depois de perder a maioria de seu partido em uma eleição geral, sem conseguir um acordo para o “Brexit” e com o perfil público abalado, May renunciou oficialmente como líder do partido em 7 de junho. Isso desencadeou a atual corrida pela liderança que fará com que o próximo primeiro-ministro britânico tome posse no final de julho. No entanto, por que muitos candidatos continuam dizendo às pessoas que usaram drogas? Existem atualmente dez  pessoas na corrida para virar o próximo líder do Reino Unido, e sete delas já admitiram usar drogas ilícitas. Isso é um pouco incomum para um grupo de pessoas que busca assumir o controle da quinta maior economia do mundo e de Forças Armadas equipadas com armas nucleares. Entre as admissões mais esdrúxulas dos últimos dias estão as de Rory Stewart (atualmente ministro do Desenvolvimento Internacional) dizendo que fumou ópio no Irã, de Michael Gove (ministro do Meio Ambiente) admitindo ter cheirado cocaína e de Jeremy Hunt (o ministro das Relações Exteriores) descrevendo como tomou uma bebida à base de iogurte com a adição de uma pequena quantidade de maconha na Índia. O nome apontado como favorito para substituir May, o exótico Boris Johnson, que por sinal curiosamente nem nascido na Grã-Bretanha é, já afirmou em um programa de TV em 2005 que "tentou, sem sucesso," consumir cocaína "há muito tempo", mas espirrou e a droga acabou se dissipando... Ninguém sabe muito bem o quão seriamente podem ser tomadas uma admissão ou negação parcial como essas. Os três outros candidatos que admitiram o uso de substâncias psicoativas dizem que fumaram maconha quando eram mais jovens. Para alguns políticos, a pressa em abordar o assunto parece ser alimentada por uma tentativa de antecipação, porque estariam prestes a ser expostos por um jornal. Para outros, a estratégia tem sido vista como uma tentativa de se distanciar do estereótipo de político formal, socialmente conservador e desconectado da realidade. Theresa May, ao contrário, durante a campanha eleitoral catastrófica que fez, tentou evitar dizer qualquer coisa controversa, pensando que passaria a imagem de líder séria, estável e confiável. Em vez disso, pareceu distante e robótica. Quando questionada "qual foi a pior coisa que já fez", ela titubeou várias vezes antes de responder "... quando eu e meus amigos costumávamos atravessar os campos de trigo, os fazendeiros não ficavam muito satisfeitos com isso". (Se você está completamente confuso em relação a isso, não se preocupe, quase ninguém no Reino Unido tinha a menor ideia sobre o que ela estava falando.) Enfrentando questões semelhantes, os candidatos a substitui-la estão tendo que encontrar respostas mais interessantes para o público britânico, composto em cerca de um terço por pessoas entre 16 e 59 anos que admitem já ter usado drogas. Para Rory Stewart, ter revelado que fumou ópio em um casamento no Irã 15 anos atrás, provavelmente aumenta seu apelo como dissidente com uma história de vida muito diferente da maioria dos políticos. Para outros candidatos, porém, o uso de drogas tem sido um problema político. A confissão de Michael Gove de que usou cocaína quando era jornalista foi confrontada com a época em que ocupou o cargo de ministro da Educação e seu departamento expulsaria professores pegos usando a droga. Ele acabou, com isso, acusado de hipocrisia. Como verificado, até o formalismo britânico vem flexibilizando sua percepção sobre determinados temas. Uma vez que os candidatos tenham terminado de admitir suas infrações relacionadas ao uso de entorpecentes no passado, uma votação começará a decidir quem se tornará líder do Partido Conservador e, consequentemente, o próximo primeiro-ministro do Reino Unido.

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