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A Guerra do Iêmen

Celso Pires - Advogado

11/01/2019 11:37

O Iêmen, um dos mais desprovidos em meio aos países árabes, vem a mais de três anos mergulhado em uma violenta guerra civil. Os combates deixaram o país à margem de uma crise devastadora, que, segundo a Organização das Nações Unidas – O.N.U, pode estar afetando até 14 milhões de pessoas. O.N.G’s como a Save The Children avaliam que cerca de 85 mil crianças menores de cinco anos morreram nestes três anos de guerra por desnutrição. As causas desse conflito remontam as tentativas populares de respirar um pouco mais o sopro democrático tão necessário as nações. O conflito tem sua formação na Primavera Árabe, de 2011, quando uma revolta popular forçou o presidente, Ali Abdullah Saleh, a deixar o poder nas mãos do vice, Abdrabbuh Mansour Hadi. Supunha-se que a transição política levaria à estabilidade, no entanto, o presidente Hadi enfrentou diferentes problemas, entre eles, ataques da Al-Qaeda e de um movimento separatista no Sul, tudo isso associado a corrupção endêmica, insegurança alimentar e o fato de que muitos militares seguiam sendo leais ao antigo presidente Saleh. O movimento “huti”, que defende a minoria xiita “zaidi” do Iêmen e lutou em várias rebeliões contra Saleh no final da década de 90, aproveitou da debilidade do novo presidente para tomar controle da Província de “Saada” e de zonas próximas. Desesperançados, muitos iemenitas, mesmo sunitas, apoiaram os “hutis”, e, ao final de 2014, os rebeldes tomaram Saná, a capital, forçando Hadi a se exilar. O conflito aumentou dramaticamente em março de 2015, quando a Arábia Saudita e outros oito países árabes, principalmente sunitas e apoiados pelos Estados Unidos, Reino Unido e França, fizeram ataques aéreos contra os “hutis” com o objetivo declarado de restaurar o governo de Hadi. A coalizão temia que o sucesso dos “hutis” fornecesse ao Irã, rival regional e país majoritariamente xiita, um ponto de apoio no Iêmen, fazendo fronteira a Arábia Saudita. A Arábia Saudita afirmou que o Irã estava apoiando os “hutis” com armas e suporte logístico, o que foi negado pelo Irã. A partir de então, todo o país vem sofrendo com as lutas internas. A O.N.U. afirma que a continuidade desse cenário poderia provocar a maior crise de fome que o mundo viu nas últimas décadas. Todos os esforços organizados pela O.N.U. para negociar um acordo de paz falharam. A situação no Iêmen é, ainda segundo as O.N.U., um terrível desastre humanitário. Um número acima de 6.800 civis morreu e ao menos 10.700 ficaram feridos desde março de 2015; mais da metade dos mortos e feridos foram vítimas de ataques aéreos da coalizão saudita. Segundo o Conselho de Direitos Humanos da O.N.U., os civis têm sido vítimas de implacáveis violações da lei humanitária internacional. Em 2017, um surto de cólera afetou um milhão de pessoas, das quais 2 mil morreram, a maioria delas, crianças. Foi a maior e mais rápida epidemia já registrada, e ela se espalhou tão velozmente por causa da destruição dos sistemas de encanamento e saneamento. Cerca de 75% da população (22,2 milhões de pessoas) precisam de assistência humanitária urgente, incluindo 11,3 milhões em situação grave que requerem ajuda imediata para sobreviver. A piora da situação é tamanha que já existem 14 milhões de pessoas sofrendo de insegurança alimentar, 8,5 milhões das quais se levantam sem saber se terão algo para comer ao longo do dia. A desnutrição aguda ameaça a vida de aproximadamente 400 mil crianças de menos de cinco anos. Só metade das 3.500 instalações sanitárias do país funcionam completamente, o que significa que 16,4 milhões de pessoas carecem de assistência médica básica. A guerra também forçou mais de três milhões de pessoas a fugirem de seus lares. Dois milhões seguem deslocados. Os mais insensíveis podem questionar o que isso tem a ver com o resto do mundo? O pior de toda essa situação é refletido justamente nesta indiferença mundial, pois apesar de toda a gravidade, o conflito no Iêmen tem sido descrito como "guerra esquecida" pela escassa atenção que tem recebido em torno do planeta. Entretanto, a insensibilidade da sociedade

internacional pode ter um custo. O que acontece no Iêmen pode exacerbar as tensões na região. Os países ocidentais se tornam suscetíveis a mais ataques, à medida que a situação for ficando mais instável. As agências de inteligência ocidentais consideram que a Al-Qaeda na Península Arábica é o braço mais perigoso do grupo por seu conhecimento técnico e alcance mundial. Além disso, existe uma preocupação pelo surgimento de grupos associados ao Estado Islâmico no Iêmen. Estrategicamente, o país é importante por sua localização no estreito de Bab al-Mandab, que liga o Mar Vermelho ao Golfo de Áden, pelo qual passa grande parte dos navios petroleiros do mundo. Em resumo, na sociedade internacional não existe mais “nós” ou “eles”, estamos todos na mesma vizinhança.

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