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A falência institucional da Venezuela

Celso Pires - Advogado

14/03/2019 19:08

Sob o risco de ter sido preso, o líder oposicionista Juan Guaidó retornou à Venezuela após visitar cinco países latino-americanos para consolidar o apoio internacional a sua tentativa de retirar o ditador Nicolás Maduro da Presidência. Guaidó, proibido pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) de deixar o país após ter sido proclamado presidente interino da Venezuela, pousou no aeroporto de Maiquetía, na capital Caracas. Tendo prontamente se encontrado, ali mesmo, com embaixadores de países europeus. Curiosamente, o bipolar ditador Maduro, apesar de não ter ordenado a prisão de Guaidó, mandou embora do país, o embaixador da Alemanha, fundamentando sua decisão no apoio deste embaixador ao líder oposicionista. Guaidó, foi recebido por uma multidão em uma praça no bairro Las Mercedes e pelas redes sociais, convocou novas manifestações de rua contra Maduro. A crise política e social da Venezuela vive uma escalada desde que Guaidó foi declarado presidente interino do país por não reconhecer a reeleição de Nicólas Maduro. Segundo o opositor, o chavista usurpou o poder por meio de eleições fraudulentas. Em seu giro pela América Latina, o oposicionista visitou Paraguai, Brasil, Argentina, Equador e Colômbia, onde participou de uma reunião do “Grupo de Lima”, que é formado por 14 países que buscam soluções para a situação da Venezuela. Guaidó deixou a Venezuela após uma tentativa frustrada de envio de ajuda humanitária de países que o apoiam, como Estados Unidos e Brasil. O governo Maduro

bloqueou as fronteiras com a Colômbia, o Brasil e impediu a chegada de navios que partiam das ilhas caribenhas de Aruba, Curaçao e Bonaire. Em alguns momentos, a entrada dos mantimentos foi impedida com o uso de força, que deixou mortos e vários feridos. O “Grupo de Lima” fez duras críticas à repressão violenta do governo Maduro nas fronteiras, mas os 14 países que apoiam Guaidó descartaram o uso da força militar internacional para conseguir uma mudança política na Venezuela. O representante nomeado por Donald Trump para lidar com a crise venezuelana, ainda afirmou que os Estados Unidos iriam responder de maneira política e diplomática a uma possível prisão de Guaidó. Evidentemente, essas reações internacionais representaram retrocessos para a oposição e chegaram a colocar em dúvida se Guaidó voltaria mesmo ao país dado o risco de prisão. Mas, se permanecesse fora do país, poderia ser visto como alguém que evadiu às suas responsabilidades, o exílio teria sido, sem dúvidas, um erro. Guaidó tem sido muito mais útil para a oposição como presidente interino da Venezuela. A sociedade venezuelana estava em uma situação de depressão social e política como se o regime tivesse conseguido anular o desejo de revolta, no entanto a ascensão de Guaidó no início deste ano, transformou o cenário oferecendo esperanças ao povo. Neste contexto, a pior situação para Guaidó teria sido a prisão e o isolamento de suas bases de apoio e da comunidade internacional. Isso conduziria à desmobilização e ao desgaste.

Essa conjuntura seria semelhante à vivida pelo oposicionista Leopoldo López. O líder do partido Voluntad Popular, sigla pela qual milita Guaidó, que está privado de sua liberdade desde 2014 e, embora esteja atualmente sob prisão domiciliar, não pode participar abertamente da política. Um dos resultados da turnê internacional de Juan Guaidó é o aumento do custo para Maduro prendê-lo. O líder oposicionista está sendo recebido com honras de Chefe de Estado em todo o hemisfério. O interessante é que sendo encarado nestes termos, quem prendê-lo é que estará dando um golpe de Estado. Nesse sentido, a excursão procura comprometer ainda mais os países do continente. Pois, se a reação internacional se reduz a uma maior pressão diplomática, a acordos retoricamente mais duros e algumas sanções a funcionários públicos, sem qualquer ação militar, Maduro acaba simplesmente, em termos práticos, ganhando. O governo da Venezuela, apesar de falido, negou permissão de entrada para centenas de toneladas de suprimentos enviados como ajuda humanitária. Ao chegarem à fronteira, caminhões com suprimentos enviados por Estados Unidos, Brasil e Colômbia foram obrigados a retornar. Em resposta aos carregamentos enviados, o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, afirmou que não existe crise humanitária no país e que as ofertas de ajuda internacional são parte de uma estratégia americana para derrubar seu governo. Todavia, a Venezuela não chegou a recusar completamente a ajuda oferecida por outros países e organismos estrangeiros. Maduro chegou a anunciar que a Rússia enviou 300 toneladas de alimentos e materiais médicos para a Venezuela. Mas, ao ser questionado por entidades independentes, o governo venezuelano não deu detalhes sobre o conteúdo dos carregamentos nem permitiu filmá-los. O porta-voz do Kremlin, afirmou não ter informações sobre o envio. Ainda questionado, o governo russo não deu esclarecimentos sobre a carga. Grupos não governamentais que atuam dentro da Venezuela dizem que o país sofre uma escassez grave de materiais médicos. Segundo a Federação Farmacêutica da Venezuela, o país latino-americano não tem hoje 85% dos remédios de que precisa. Conforme dados do serviço de rastreamento financeiro da O.N.U, o F.T.S, que coleta informações sobre fundos de ajuda humanitária no mundo, foram enviados US$ 24 milhões para a Venezuela em 2018 e a situação vem se deteriorando sensivelmente. Imagens recentes mostram um país abalado pela pobreza e pela hiperinflação. No entanto, a crise não começou agora. A fome fez mais de 64% dos venezuelanos declararem, em uma pesquisa, terem perdido, em média, 11 kg no ano passado. A violência esvazia as ruas das grandes cidades quando anoitece. E a situação provocou um êxodo em massa para países vizinhos. Em novembro, a O.N.U informou que 03 milhões de venezuelanos deixaram o país nos últimos anos. A derrocada econômica sofre forte influência do comércio do petróleo, que domina a economia venezuelana e representa praticamente a totalidade de suas receitas de exportação. A Venezuela tem uma das maiores reservas de petróleo do mundo, no entanto, na última década, a produção do recurso entrou em colapso. A ditadura que se implantou no poder, de maneira irresponsável e incompetente destruiu a Venezuela e esmagou o presente e o sonho de futuro de seus cidadãos.

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