Elas chegaram cedo à praia de Copacabana ontem (27), um sábado
de sol no Rio de Janeiro. Às 13h começaram a distribuir camisinhas,
embaladas com os dizeres “Use, o papa
não vai saber†aos peregrinos que esperavam o PontÃfice no local. A 3ª e
maior edição da Marcha das Vadias do Rio reuniu 20 mil pessoas, segundo
as organizadoras, e duas mil, segundo a PolÃcia Militar.
Freiras de topless e um papa gay parodiaram a Jornada Mundial da Juventude e questionaram a posição da Igreja sobre aborto, contraceptivos e relações homoafetivas.
“Esta marcha se propõe a combater os dogmas da religião que tanto interferem na laicidade do Estado e principalmente no poder de decisão das mulheres, privando-as da liberdade de terem direito sobre o seu próprio corpoâ€, afirma a prostituta Indianara Siqueira, 42 anos, uma das organizadoras do evento.
Sobre os motivos que levaram à realização da marcha em meio à Jornada Mundial da Juventude, ela esclarece que a intenção foi confrontar.
“Mas não diretamente com o papa, até por que a gente achava que hoje ele estaria em Guaratiba, o que seria muito mais seguro, e não aqui, ao mesmo tempo que a genteâ€.
De acordo com a agenda divulgada antes do inÃcio da JMJ, o papa Francisco estaria na zona oeste da cidade. Porém, devido ao lamaçal em que o Campo da Fé se transformou depois das chuvas, o comitê organizador local da JMJ comunicou, na quinta-feira (25), a transferência das atividades para Copacabana. Em função da mudança, a Marcha das Vadias, que previa seu término na praia do Leme, acabou, por volta das 18h, no posto 9 de Ipanema. “Decidimos por um trajeto oposto aos dos peregrinos para evitar conflitosâ€, esclareceu Indianara.
Segurança
A segurança foi uma preocupação constante durante a marcha. Na sexta-feira (26), quando ocorreu um “peitaçoâ€, seguido de um “beijaço†LGBT, em Copacabana, peregrinos jogaram ovo e outros objetos nos manifestantes já cercados por agentes da polÃcia. “Foi horrÃvel, realmente assustador. Um absurdoâ€, denunciou Francisco dos Santos, presente ao ato.
Já na tarde de ontem, a maioria dos participantes da JMJ acompanhou o protesto de forma pacÃfica. Houve quem colocasse o crucifixo diante das “vadias†ou rezasse fervorosamente pelas “pecadoras†em marcha. Um peregrino cuspiu no rosto de uma das manifestantes.
“Eu acho que as pessoas têm que reivindicar, o protesto é pacÃfico e é assim que tem que ser. Cada um tem o direito de buscar o seu espaço na sociedadeâ€, afirmou o seminarista Thiago Radael, que veio de Curitiba (PR) para a JMJ, ao ver o protesto passar.
Outra peregrina de 70 anos, que não autorizou a repórter a revelar sua identidade, confessou: “Eu já cometi dois abortos. Foi há muitos anos. Hoje eu me arrependo. Rezo todos os dias por ter feito esse grande pecado.â€
Mesmo lembrando do medo e dos riscos vividos em clÃnicas clandestinas, ela criticou a manifestação: “Não tem nada a ver. Ora, aonde se viu fazer um negócio desses aqui? Isso é um desrespeitoâ€.
As Católicas pelo Direito de Decidir lançaram uma carta aberta ao papa Francisco durante a Marcha das Vadias. “Queremos uma nova moral relativa à sexualidade e à reprodução humana que reconheça o valor moral da decisão das mulheres católicas pela interrupção de uma gravidezâ€, diz um dos trechos da carta.
Jornada das manifestações
Além da legalização do aborto e da criminalização à homofobia, a Marcha das Vadias reivindicou que a presidenta Dilma Rousseff vete a chamada “bolsa estupro†e sancione o Projeto de Lei Complementar 03, de 2013, que define o atendimento médico que deve ser dado à s vÃtimas de violência sexual no paÃs.
Em tramitação no Congresso Nacional, a “cura gay†e o Estatuto do Nascituro também foram rechaçados pelos manifestantes.
Os pedidos de impeachment do governador do Estado do RJ, Sérgio Cabral (PMDB), mais uma vez voltaram à tona, assim como a pergunta “Cadê o Amarildo?â€, em referência ao trabalhador Amarildo de Souza, desaparecido desde 14 de julho, após ter sido levado para uma “verificação†por agentes da Unidade de PolÃcia Pacificadora da Rocinha.