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Múltiplos trabalhos fazem jornada chegar a 16 horas por dia

Cada vez mais, as pessoas estão se ocupando de mais de uma atividade para aumentar a renda ou por perspectivas de outros trabalhos.

28/04/2018 08:15

Qual sua profissão? Se por muito tempo era fácil responder o questionamento com apenas uma definição do que a pessoa exercia profissionalmente, atualmente, uma resposta simplificada está cada vez mais difícil. É muito comum que as pessoas ocupem mais de uma atividade de trabalho com o objetivo de estabelecer uma maior renda ou perspectivas outras de trabalho. A prática, no entanto, faz com que trabalhadores cheguem a cumprir jornadas de até 16 horas por dia. 

O que acontece, geralmente, é que as pessoas se dedicam a um emprego fixo e, no que seria o tempo ‘livre’, executam outras atividades. Os ‘planos B’ saem do papel e viram rotinas profissionais de fato. Assim, trabalhar três turnos se torna uma realidade frequente e, de certa forma, preocupante no país. 

A bancária Mara Dalena Borges, de 30 anos, faz parte desses profissionais multifacetados. Em 2014, ela foi aprovada em um concurso para o Banco do Nordeste e foi morar no interior do Piauí. Jornalista e historiadora por formação, ela lembra que a mudança de carreira foi muito impactante na sua vida. Nesta época, Mara trabalhava em assessoria de comunicação e alimentava um blog sobre moda – área que sempre a atraiu muito, mas aceitou a mudança como uma forma de cumprir outros sonhos. 

Mara Dalena concilia o trabalho formal com sua loja virtual. (Foto: Jailson Soares/O Dia)

“Eu já trabalhava na minha área e mudei totalmente de rotina, até porque também houve a mudança de endereço. Foi difícil a adaptação, mas a estabilidade e outras vantagens fizeram com que eu permanecesse no Banco”, relembra. Poucos anos depois, a bancária conseguiria a transferência para Teresina. O embate, no entanto, é que estar mais perto do marido e da família também significava aceitar que as oportunidades de crescimento dentro da agência, na Capital, seriam muito mais difíceis. O salário também seria reduzido e isso abriria a porta para que ela pensasse em outras oportunidades de trabalho. 

“Como o trabalho no Banco é muito técnico, eu sentia falta de outras coisas que fazia com meus outros trabalhos. Então meu marido incentivou que eu abrisse uma loja de roupas virtual, que seria uma complementação de renda e algo que eu gostava muito de fazer”, explica. Mara embarcou na ideia, fez especialização na área de moda, marketing e montou um modelo de negócios que funciona através de plataformas digitais. Ela tem uma loja que vende peças de moda evangélica através do Instagram, a @santoestilo_store, e também presta consultoria de imagem. 

“Hoje, eu concilio o trabalho no Banco e essa outra atividade. São seis horas corridas como bancária e o resto do tempo dedicado à loja”, comenta. “Até os fins de semana são ocupados com o trabalho da loja, porque é o tempo que tenho para organizar estoque, visitar as clientes”, completa. Mas o trabalho intenso faz construir sonhos. Ela e o marido, recentemente, mudaram-se para a casa própria. “É uma rotina muito louca, mas que ao final vale a pena”, finaliza.

“Para honrar os compromissos tem que trabalhar muito”

A organização para o dia de trabalho começa cedo na casa de Baltazar Pimentel, de 50 anos. Às 5h30, ele já está de pé para encaixar as demandas das duas atividades que executa e que chegam a ocupar os três turnos de trabalho. À noite, ele trabalha como gráfico no Jornal ODIA e, pela manhã e a à tarde, vendedor de lanches. 

Baltazar vende lanches pela manhã e à tarde, e, à noite, trabalha como gráfico. (Foto: Jailson Soares/ O Dia)

“Quem quer honrar os compromissos tem que trabalhar muito. Eu tenho três filhos e tem que ter coragem e determinação para o trabalho”, comenta. A rotina dupla começou há 13 anos, porque ele já se dedica à função de gráfico há mais de 20. “Eu só trabalhava à noite e vi que poderia fazer algo durante o dia. Comecei vendendo lanche dentro da empresa e depois expandi”, explica. 

Hoje, ele trabalha cerca de três horas pela manhã, outras três à tarde e cumpre a jornada de seis horas no jornal. Uma jornada de trabalho que ultrapassa as 12 horas diárias. A carga de trabalho também é intensa para quem está nos primeiros anos de carreira profissional. É o caso da advogada Rosamaria Lemos, de 27 anos, que também trabalha em duas funções cumprindo jornada que ultrapassa 10 horas de trabalho diário. 

A jovem trabalha em um cargo administrativo no Governo do Estado e, durante à tarde, atua como profissional liberal, na função de advogada. A escolha pela jornada dupla, no entanto, só veio este ano. “Decidi outra ocupação porque eu tenho uma graduação diferente da ocupação que eu faço na Secretaria de Saúde e também o cargo que eu ocupo é de auxiliar administrativo, eu não tenho uma chance de alcançar nada mesmo fazendo tudo muito bem, e eu preciso e anseio novos desafios. E o trabalho administrativo é extremamente maçante, todos os problemas são os mesmos e comecei a não me sentir confortável a fazer a mesma coisa sempre”, destaca Rosamaria. 

Rosamaria Lemos trabalha em um cargo administrativo no Governo do Estado e, durante à tarde, atua como advogada. (Foto: Jailson Soares/ O Dia)

Além dos trabalhos fixos, cursos e leituras incrementam a rotina que se torna recheada de ocupações. “Minha carga horária está bem comprometida, até porque eu sempre tenho que fazer cursos para melhorar profissionalmente, sempre tenho que ler bastante; todo dia, sai uma jurisprudência ou um assunto novo. Na advocacia, ou você permanece estudando ou você não tem capacidade de atender o problema do cliente”, afirma.

Carga intensa de trabalho pode desencadear doenças

Doenças cardiovasculares, AVC e infarto. Estes são só alguns dos exemplos que o mé- dico do trabalho, Lucas Lopes Rêgo, usa para alertar que uma intensa carga de trabalho pode propiciar com o passar dos anos na vida das pessoas. Para o profissional, rotinas intensas de ocupação fazem o organismo entrar em alerta e o trabalhador tem que entender os riscos de tais ações. 

“Todo organismo precisa de um tempo de recuperação para você assimilar novos aprendizados e para evitar que seu corpo entre em fadiga física e mental. Você precisa ter um repouso mínimo e isso vai variar de organismo para organismo, têm alguns que levam seis horas, outros oito, outros dez horas de sono para que ele se reestabeleça, mas isso precisa ser respeitado”, explica Lucas. 

Lucas Lopes diz que é preciso respeitar os limites do corpo. (Foto: Jailson Soares/ O Dia)

O trabalhador que se submete a longas jornadas de trabalho ou ocupação pode ver seu rendimento ser diminuído, bem como a capacidade de assimilação de novos conceitos, esquecimento e cansaço extremo por não respeitar o limite do corpo. “Além disso, uma forte carga de trabalho pode ocasionar problemas físicos e, ao longo do tempo, patologias relacionadas à circulação daquelas pessoas que, por exemplo, passam o dia envoltas a trabalhos administrativos. O déficit na circulação trata problemas cardiovasculares ou um estilo de vida desregrado pode ocasionar em AVCs e infartos”, destaca o médico. 

Por isso, é importante que o trabalhador respeite o tempo de descanso. Para cada uma hora trabalhada, dar de 5 a 10 minutos de descaso para o corpo em caso de atividades muito técnicas e administrativas. “No caso de profissionais da saúde, que fazem plantões extensos. É impossível o corpo aguentar 36 horas de trabalho apenas com pequenas pausas para o descanso. Esses profissionais têm que ligar o sinal de alerta, que de nada adianta trabalhar se o organismo falhar”, finaliza.

Por: Glenda Uchôa
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