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Jornalismo de qualidade é a fórmula para barrar o avanço das Fake News

Especialista aponta que disseminação de falsas notícias contribui para a desinformação e mudanças sociais.

07/04/2018 07:56

O fenômeno das fake news – notícias falsas, em inglês - e sua massiva penetração colocaram o jornalismo em alerta. O que é verdadeiro? O que é falso? São perguntas que começam a fazer parte de uma sociedade que é constantemente bombardeada por informações em diferentes plataformas. E é nesse contexto, que o jornalismo se coloca como antídoto para as negativas consequências das propagações de notícias inverídicas. Neste Dia do Jornalista, 07 de abril, o Jornal O Dia ouviu especialistas que traçam o panorama que se forma a partir da propagação das notícias falsas e a forma de enfrentamento a este cenário.

“A desinformação não irá desaparecer, mas pode ser mitigada através da combinação de três pilares: checagem e verificação do conteúdo digital, valorização do jornalismo de qualidade e educação midiática”, considera a jornalista e mestre em Jornalismo pela Columbia University School, Angela Pimenta.

A especialista também preside o Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo, o Projor, que é uma entidade civil sem fins lucrativos não-governamental, não-corporativa, pluralista e apartidária criada em 2002. O Projor mantém o Observatório da Imprensa e realiza atividades e projetos voltados à reflexão e aprimoramento da prática jornalística, acreditando que uma imprensa livre e fortalecida é um dos pilares da democracia.

Angela volta ao tempo e mostra que a divulgações de notícias falsas com fins vários, não é problemática recorrente apenas dos tempos atuais. “O historiador americano Robert Darnton observa que o historiador Procópio já produzia rumores maldosos sobre o imperador Constantino, do império Bizantino, no século VI. A grande diferença de hoje é a escala e a velocidade na produção e compartilhamento de mentiras na internet, sobretudo nas redes digitais”, destaca.

Essa velocidade na propagação das notícias falsas citadas pela jornalista contribui para cenários não só de desinformação, mas para mudanças bruscas no arranjo social. Um exemplo pontual é lembrar que catorze meses depois da campanha que deu a vitória ao republicano Donald Trump, atual presidente dos Estados Unidos, estudos e pesquisas reforçam as suspeitas de que fake news influenciaram o debate em favor de Trump durante a disputa norte-americana.

“Vemos o fenômeno do aumento da desinformação no meio digital com preocupação, pois acreditamos que a publicação e o compartilhamento de informações falsas distorce o debate de temas de interesse público. Isto é especialmente nocivo para a integridade do debate político. Os cidadãos precisam de fatos bem apurados para, por exemplo, escolherem candidatos à presidência, governos estaduais, senadores e deputados federais e estaduais, entre outros cargos eletivos. Vemos a desinformação como um lixo, poluição digital”, destaca Angela.

Formas de Enfrentamento

Para barrar a penetração das notícias falsas, o Projor mantém o Projeto Credibilidade, que visa sinalizar no espaço digital uma série de indicadores de qualidade editorial. No momento, são 18 veículos parceiros, além da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo). “Chamamos nosso sistema de indicadores de credibilidade de "dados nutricionais da notícia." Recentemente, publicamos o Manual da Credibilidade. Temos um capítulo dedicado à questão da credibilidade que explica os indicadores: aquilo que os consumidores de notícias devem buscar na imprensa. Em resumo, o bom jornalismo é aquele que identifica claramente a missão do veículo e seus compromissos editoriais; que ouve todos os lados e partes interessadas de uma notícia ou questão. É aquele que ao errar, reconhece e corrige seus erros; que ao citar fontes e informações de terceiros, dá o devido crédito; que identifica e separa o que é notícia, de aná- lise, opinião ou publicidade. Além disso, que identifica os autores de seu conteúdo, como os repórteres e colunista, dá o devido crédito a sucursais (se houver) e que mantém um canal de diálogo com sua audiência”, finaliza. 

“O jornalismo é o meio mais credível para se informar.

A um clique, seja da tela do celular ou do computador, informações circulam como uma avalanche em grande quantidade e a todo momento. A tecnologia propiciou que essas notícias sejam produzidas por todos, em tempo real, e cheguem a públicos variados. Ao tempo que a celeridade do compartilhamento de informações se torna um trunfo, também pesa negativamente quando feita de forma irresponsável ou com fins específicos. É por isso que, mais que nunca, o jornalismo se coloca como parte fundamental dentro de uma sociedade democrática.

“O jornalismo é o meio mais credível para se informar. Nesta data que a gente comemora o Dia do Jornalista, a gente percebe que o nosso trabalho se torna cada vez mais imprescindível, em um mundo em que todo mundo pode, com um aparelho telefônico na mão, produzir um conteúdo e viralizar. A gente percebe que o trabalho que executamos é vital, afinal, se não for a gente separando o que é duvidoso do que é credível, nosso leitor vai ficar preso na teia de mentira e da desinformação”, destaca a editora-chefe do Jornal O Dia, Adriana Magalhães.


De dentro da redação, Adriana acredita no bom jornalismo para informar (Foto: Jailson Soares/O Dia)

Para entender o fenômeno das Fake News, a jornalista propõe uma visão em dois aspectos. “Temos o problema de uma pessoa comum na rua que, diante de um fato, por exemplo, se sente produtor de conteúdo e usa espaços ou repassa para imprensa uma informação que não foi necessariamente apurada. Isso é diferente de, nós, enquanto jornalistas, quando estamos diante de um fato e o apuramos corretamente. Qual a informação será credível? É claro que provavelmente a do profissional que é quem tem conhecimento para aquilo”, destaca.

O segundo aspecto ressaltado por Adriana se deve ao fato específico das notícias produzidas com fins de alcançar objetivos já estabelecidos: influenciar certos grupos de pessoas, denegrir alguma figura pública, causar pânico e desinformação. Para combater isso, a checagem do fato é uma das grandes armas a ser lançada mão.

“O nosso papel enquanto jornalistas é checar, ouvir todos os lados envolvidos, fazer aquele trabalho de abrir um leque de entendimento e oferecer a nosso interlocutor algumas conclusões para aquele assunto, algumas ideias, informações sobre as quais ele precisa pensar. Não necessariamente o que pensar, porque a gente oferta é sobre o que pensar, o que é importante e ele constrói sua realidade”, destaca.

Assim, atuar no combate de maneira efetiva na disseminação de notícias falsas, é importante que o jornalista tenha uma boa formação e saiba diferenciar o trabalho do profissional da simples “produção de conteúdo”.

Jornalismo impresso

De dentro da redação, Adriana analisa como o bom jornalismo pode contribuir para uma sociedade informada e que possa entender com autonomia o mundo que está inserido.

“Acredito que no impresso, o tempo que usamos, a experiência, o trabalho em equipe, são trunfos que a gente tem no combate a essas notícias falsas. Nosso trabalho é dar a informação ao leitor para que ele possa construir a sua realidade. Entender se o país que ele está inserido está em crise ou não, para ele entender o real problema causado por uma chuva. dentro desse rol de coisas que ele recebe, ele fará o filtro baseado na realidade para construir sua análise de mundo”, finaliza.

Sociedade terá que aprender a gerir informações

As notícias verdadeiras não chegam ao consumidor com um selo de credibilidade, assim como as notícias falsas não vem alarmadas do seu real potencial de distorção. É por isso que, como destaca o professor e doutor em ciência da comunicação, Gustavo Said, a sociedade terá de aprender a gerir as informações.

“Cada um de nós é gestor de informação, porque produz e consome. Agora, é preciso que os consumidores criem estratégia de defesa, que persigam a credibilidade. Visitar o site oficial do portal, jornal, contrapor informação. Vamos ter que desenvolver habilidades e aprender a gestão da informação. Vamos entender o que pode ou não pode ser Fake News”, afirma Gustavo.


“Cada um de nós é gestor de informação, porque produz e consome", afirma o professor  jornalista Gustavo Said (Foto: Jailson Soares/O Dia)

O especialista faz uma análise ampla do atual cenário da comunicação brasileira. Se antes eram apenas os jornalistas a produzir e informar a população, esse papel entra em xeque com o avanço da tecnologia e possibilidade de produção e veiculação feita por todos. E é claro que a crise do papel do jornalista também conclui para este cenário conturbado.

“O jornalismo vive uma crise relacionada ao papel do jornalista, que vem se modiicando ao longo do tempo, sobretudo em um ambiente em que as pessoas não precisam mais do relato jornalístico para se informar. O jornalismo de 50 anos atrás falava para um público que só aceitava, mas as pessoas começaram a entender como funciona a construção da informação, as pessoas questionam se é verdade e começaram a perceber que o jornalismo é uma prática discursiva como outra qualquer. O jornalismo é ético quando ele assumir que está produzindo uma versão da realidade e apresentar isso aos consumidores”, analisa.

Com um público mais crítico e uma imprensa comprometida com a ética, mesmo com o avanço da propagação de notícias falsas, é possível diluir as consequências negativas das mentiras na comunicação.

Por: Glenda Uchôa - Jornal O Dia
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