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Renan tenta manobra para votar pacote anticorrupção, e é alvo de panelaço

Projeto das 10 medidas contra a corrupção foi completamente desvirtuado por emendas apresentadas pelos deputados federais.

30/11/2016 19:54

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), colocou em votação no plenário do Senado um requerimento de urgência urgentíssima para a votação ainda hoje (30) do projeto de lei que trata das medidas de combate à corrupção. Apesar dos protestos de grande parte do plenário, o presidente insistiu em colocar a matéria em votação, mas o requerimento foi rejeitado por 44 votos contrários e 14 favoráveis.

Brasília - Plenário do Senado durante sessão deliberativa ordinária (Jonas Pereira/Agência Senado)

Apesar dos protestos de grande parte do plenário, o presidente insistiu em colocar a matéria em votação, mas o requerimento foi rejeitado por 44 votos contrários e 14 favoráveis (Foto: Jonas Pereira/Agência Senado)

As medidas de combate à corrupção foram aprovadas esta madrugada na Câmara dos Deputados, há menos de 24 horas. O texto nem mesmo constava no sistema do Senado quando o presidente anunciou a intenção de colocá-lo em votação ainda hoje, com quebra de interstícios, ou seja, do intervalo entre as votações. O requerimento tinha sido apresentado por PMDB, PTC e PSD. Apesar da previsão de que dois senadores pudessem falar em favor do pedido de urgência, nenhum parlamentar dos três partidos quis usar a palavra.

Indignados com a insistência, vários senadores acusaram o presidente de agir com abuso de autoridade. O senador Cristovam Buarque (PPS-DF) dirigiu-se ao plenário para pedir que os colegas não aprovassem o requerimento de urgência.

Renan Calheiros tentou manobra para votar pacote anticorrupção, que foi completamente desvirtuado na Câmara Federal, durante votação realizada na madrugada desta quarta-feira (Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil)

“Eu estou falando com meus pares. Com o senhor eu não argumento porque não adianta, o senhor está usando um abuso de autoridade no momento em que tenta pautar uma lei sobre abuso de autoridade”, disse o senador.

Procuradores reagem a mudança no texto original das 10 medidas contra a corrupção

Durante votação realizada na madrugada desta quarta-feira, na Câmara Federal, os deputados apresentaram emendas que desvirtuaram completamente o projeto que continha as 10 medidas contra a corrupção, propostas pelo Ministério Público Federal.

Nesta quarta-feira, o procurador-geral Rodrigo Janot divulgou uma nota repudiando o novo texto do projeto que foi aprovado na Câmara, e afirmando que, em vez de contribuir para reforçar o combate à corrupção, o projeto aprovado pelos deputados federais vai representar uma marcha a ré nesta tarefa.

Também nesta quarta-feira, procuradores que integram a força-tarefa da Lava-Jato denunciaram que as mudanças feitas no projeto das 10 medidas contra a corrupção representam o "começo do fim" da operação, que já é reconhecido como a maior investida contra políticos corruptos do país em toda a história.

Pacote polêmico

A proposta surgiu a partir de uma campanha feita pelo Ministério Público Federal intitulada Dez Medidas Contra a Corrupção. Na votação da Câmara, no entanto, foram retiradas seis das dez medidas sugeridas pelo MPF. A principal mudança feita pelos deputados ocorreu por meio de emenda do deputado Weverton Rocha (PDT-MA), aprovada por 313 votos a 132 e 5 abstenções. Ela prevê casos de responsabilização de juízes e de membros do Ministério Público por crimes de abuso de autoridade. Entre os motivos listados está a atuação com motivação político-partidária.

Diante das alterações, procuradores da Operação Lava Jato ameaçaram deixar a força-tarefa caso as medidas do novo pacote entrassem em vigor. O procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, também fez duras críticas ao texto. Segundo ele, as alterações colocaram o país “em marcha a ré no combate à corrupção”. De acordo com o procurador, “as 10 Medidas contra a Corrupção não existem mais”.

A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, também divulgou uma nota em que lamentou a aprovação do projeto que torna crime o abuso de autoridade para juízes e procuradores.

Panelaços contra Renan

Moradores de bairros das zona Sul e Norte do Rio de Janeiro bateram panelas na noite desta quarta-feira (30) contra o presidente do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB), que tentou colocar em votação as medidas anticorrupção propostas pelo Ministério Público Federal (MPF). Panelaços também foram registrados em São Paulo e Curitiba.

Usuários do twitter convocaram o protesto ao longo do dia citando as alterações que as medidas sofreram na Câmara dos Deputados, na madrugada desta quarta (30) . O panelaço foi ouvido em bairros como Tijuca, Copacabana, Barra da Tijuca, Botafogo, Urca e Leme.

Em Niterói, Região Metropolitana do Rio, também foram ouvidas panelas. Fora o panelaço, também foi possível ouvir buzinas e fogos. Os moradores também acenderam e apagaram luzes de apartamentos.

Leia nota da Procuradoria-Geral da República sobre a votação das 10 Medidas contra a Corrupção na Câmara:

Foram mais de dois milhões de assinaturas. Um apoio maciço da sociedade brasileira, que também por outros meios se manifestou. Houve o apoio de organismos internacionais. Foram centenas de horas de discussão, de esclarecimento e de um debate sadio em prol da democracia brasileira. Foram apresentadas propostas visando a um Brasil melhor para as futuras gerações.

No entanto, isso não foi o suficiente para que os deputados se sensibilizassem da importância das 10 Medidas de Combate à Corrupção. O resultado da votação do PL 4850/2016, ontem, colocou o país em marcha a ré no combate à corrupção. O Plenário da Câmara dos Deputados desperdiçou uma chance histórica de promover um salto qualitativo no processo civilizatório da sociedade brasileira.

A Casa optou por excluir diversos pontos chancelados pela Comissão Especial que analisou as propostas com afinco. Além de retirar a possibilidade de aprimorar o combate à corrupção – como a tipificação do crime de enriquecimento ilícito, mudanças na prescrição de crimes e facilitação do confisco de bens oriundos de corrupção –, houve a inclusão de proposta que coloca em risco o funcionamento do Ministério Público e do Poder Judiciário, a saber, a emenda que sujeita promotores e juízes à punição por crime de responsabilidade.

Ministério Público e Judiciário nem de longe podem ser responsabilizados pela grave crise ética por que passa o país. Encareço aos membros do Ministério Público Brasileiro que se mantenham concentrados no trabalho de combate à corrupção e ao crime. Que isso não nos desanime; antes, que nos sirva de incentivo ao trabalho correto, profissional e desprovido de ideologias, como tem sido feito desde a Constituição de 1988. Esse ponto de inflexão e tensão institucional será ultrapassado pelo esforço de todos e pelo reconhecimento da sociedade em relação aos resultados alcançados.

Um sumário honesto da votação das 10 Medidas, na Câmara dos Deputados, deverá registrar que o que havia de melhor no projeto foi excluído e medidas claramente retaliatórias foram incluídas. Cabe esclarecer que a emenda aprovada, na verdade, objetiva intimidar e enfraquecer Ministério Público e Judiciário.

As 10 Medidas contra a Corrupção não existem mais. O Ministério Público Brasileiro não apoia o texto que restou, uma pálida sombra das propostas que nos aproximariam de boas práticas mundiais. O Ministério Público seguirá sua trajetória de serviço ao povo brasileiro, na perspectiva de luta contra o desvio de dinheiro público e o roubo das esperanças de um país melhor para todos nós.

Nesse debate, longe de qualquer compromisso de luta contra a corrupção, vimos uma rejeição violenta e irracional ao Ministério Público e ao Judiciário. A proposta aprovada na Câmara ainda vai para o Senado. A sociedade deve ficar atenta para que o retrocesso não seja concretizado; para que a marcha seja invertida novamente e possamos andar pra frente.

O conforto está na Constituição, que ainda nos guia e nos aponta o lugar do Brasil. Que seja melhor do que o que vimos hoje.


Rodrigo Janot

Procurador-Geral da República

Presidente do Conselho Nacional do Ministério Público



Com informações da Agência Brasil, do G1 e do MPF
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