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Minha mulher pediu que eu desistisse, diz presidente da comissão do impeachment

Apesar da discordância da mulher, Gitâna Maria Figueirêdo Lira, Raimundo Lira decidiu aceitar o convite. "Se fosse por ela, eu não estaria na política."

28/04/2016 10:41

Para assumir a presidência da comissão especial do impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) na Casa, o senador Raimundo Lira (PMDB-PB), 72, teve de vencer uma resistência interna: a da família. "Minha esposa pediu que eu desistisse", disse Lira.

Senador Raimundo Lira (PMDB-PB) (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil/ Fotos Públicas)

Apesar da discordância da mulher, Gitâna Maria Figueirêdo Lira, Raimundo Lira decidiu aceitar o convite. "Se fosse por ela, eu não estaria na política."

Vencida a resistência familiar, Lira, um bem-sucedido empresário da Paraíba com patrimônio estimado em 2010 em R$ 54 milhões, conseguiu apoio de governistas e oposicionistas para presidir a comissão cujo trabalho pode resultar no afastamento do segundo presidente da República do Brasil em menos de 24 anos. 

Em entrevista exclusiva ao UOL, Lira afirmou que a situação política do país é grave e diferente da de 1992, quando o hoje senador Fernando Collor (PTC-AL) foi afastado da Presidência.

Tido como moderado, o senador disse ainda não ter recebido nenhuma orientação do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), considerado como a última esperança do governo para barrar o impeachment de Dilma, e afirmou não ter medo de virar "alvo" de grupos pró e contra o impeachment. "Tenho certeza de que a opinião pública dos dois lados vai entender minha posição", afirmou.

Leia a seguir trechos da entrevista:

UOL - A sua família lhe pediu para não assumir essa comissão?

Raimundo Lira - A minha convivência com a minha família é muito estreita. Sou casado há quase 45 anos e tenho quatro filhos: uma filha e três filhos. Praticamente todos os dias, estamos juntos reunidos e, muitas vezes, com a presença dos netinhos. Tenho cinco netos.

Mas, quando a gente está aqui no Congresso Nacional, no Senado Federal, quando se recebe uma missão do seu partido, do seu líder, que achou que eu tinha todas as condições para fazer esse trabalho, você não foge da luta.

Eu aceitei, e, ao aceitar, minha esposa passou a aceitar também porque nós temos esse entendimento. Mesmo aquilo de que ela não gosta que eu faça. Se fosse por ela, eu não estaria na política, mas, estando, ela me dá todo o apoio.

O senhor assistiu à sessão do impeachment na Câmara dos Deputados?

Assisti.

Como o senhor avaliou o que algumas pessoas chamaram de "show de horrores"?

Eu não vou fazer nenhuma consideração em relação a isso porque são deputados, é a Câmara dos Deputados. Acho que é um papel da imprensa, das pessoas que são formadoras de opinião e é a opinião pessoal de cada um. Eu, como senador, não gostaria de fazer qualquer alusão àquela sessão.

O senhor disse que acreditava que o nível do debate sobre o impeachment no Senado seria mais alto. Por quê?

O nível será mais alto por várias razões. Primeiro porque na Câmara, a média [de idade] é bem menor que a média dos senadores*. Tem mais juventude, mais energia, mais impulsividade, mais emoção, e um número bem maior. Nós somos 81 senadores, lá são 513. Na comissão, são 21 senadores. Na comissão da Câmara, eram 65 deputados. Então, há uma diferença tanto de idade quanto de perfil de deputados e senadores.

Como o senhor avalia a condução do processo de impeachment feita pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ)? Muita gente o critica afirmando que foi rápido demais. O que o senhor acha?

Não faria uma consideração sobre esse assunto. No momento em que nós assumimos a presidência da comissão especial do impeachment, eu declarei que teria uma postura suprapartidária e não faria nenhum conceito sobre qualquer etapa desse procedimento. Não posso fazer qualquer referência a essa questão.

O presidente do Senado, Renan Calheiros, é considerado uma das últimas esperanças do governo para impedir o impeachment. Que orientação Renan lhe passou?

Nenhuma orientação. Não tivemos nenhuma reunião sobre esse assunto. Não falamos sobre esse assunto. Todas as minhas conversas foram com meu líder [do PMDB no Senado], Eunício Oliveira.

E que orientações ele lhe passou?

Ele me deixou totalmente à vontade. Disse a ele que aceitava com muita honra essa indicação e discutimos três condições que eu adotaria nos trabalhos da comissão: uma posição suprapartidária; [que eu conduzisse a comissão] de uma forma totalmente imparcial, sem fazer qualquer conceito sobre quem é contra ou a favor do impeachment; e uma terceira questão é que há uma visível maioria da oposição em relação aos representantes do governo na comissão especial do impeachment.

Então, eu teria que ter, como estou tendo, o maior cuidado para que essa maioria não sufoque a minoria. [Que a minoria] tenha a mesma igualdade de condições e seja um ambiente onde haja equilíbrio para todas as facções, todos os blocos e todos os políticos.

O fato de o presidente licenciado de seu partido, Michel Temer (PMDB), ser a pessoa mais beneficiada com o eventual impeachment da presidente Dilma lhe coloca mais pressão?

Nenhuma pressão. E talvez esse seja um dos motivos por que Eunício tenha me indicado. Estamos falando da cassação através do impeachment de uma presidente da República.

Muitos juristas, inclusive o próprio Michel Temer, avaliam que o julgamento a ser feito no Senado é político. Na medida em que a presidente Dilma não tem mais apoio político na Câmara e aparentemente também não tem no Senado, o julgamento do impeachment no Senado é só para cumprir tabela?

Acredito que não.

O senhor acha que é reversível?

Não sei dizer se é reversível. Mas não é um julgamento essencialmente político.

Não pode deixar de ser político, e não pode ser essencialmente jurídico. Portanto tem que ter um equilíbrio entre essas duas condições.

Mais de um terço dos senadores da comissão especial do impeachment são investigados pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Essas investigações mancham a legitimidade da comissão?

Acredito que não porque você não tem nenhum senador que tenha condenação. Já tivemos casos de senador contra quem foi aberto o inquérito e depois o MP (Ministério Público) pediu o arquivamento. Temos que esperar, porque enquanto a pessoa está sendo processada, seja na fase inicial ou na fase do próprio julgamento, não podemos fazer nenhum julgamento.

O senhor acha que o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), que foi vice-governador de Minas Gerais durante a gestão de Aécio Neves (PSDB-MG), que é um dos principais adversários políticos da presidente Dilma, tem a isenção necessária para ser relator dessa comissão?

Sou uma pessoa muito disciplinada. Sou a favor do respeito à proporcionalidade. A divisão das comissões permanentes tem que seguir rigorosamente essa proporcionalidade. As posições na mesa do Senado têm que seguir rigorosamente essa proporcionalidade. Portanto, o bloco da oposição formado pelo PSDB, DEM e pelo PV tinha, por essa proporcionalidade, o direito de indicar o nome para relator, que, em seguida foi referendado por votação majoritária no âmbito da comissão.

Eu acho que foi uma escolha muito boa, o senador é um homem muito moderado, muito afável e sobretudo muito competente. Além de ter sido governador de Minas Gerais, ele é professor de direito constitucional. É um homem de trato muito afável, muito fácil.

Antes de ser apontado como presidente da comissão, o senhor havia se manifestado favoravelmente ao impeachment da presidente Dilma. Após a indicação, o senhor disse que havia mudado de ideia e se tornado indeciso. Como o senhor fez para mudar de ideia tão rapidamente?

Na realidade, a palavra correta não é indeciso. A palavra é isento. Presidindo essa comissão especial do impeachment, eu tenho que ficar totalmente isento. Eu só posso ser imparcial na condução da comissão sendo isento.

Então a sua opinião sobre o impeachment não mudou?

Num determinado momento do processo, eu vou ter que votar e manifestar minha opinião como senador, mas, enquanto eu estiver na presidência da comissão, seja nessa primeira fase, seja na segunda fase, de comissão processante, não vou fazer juízo de valor sobre esse assunto.

Caso a presidente Dilma seja afastada, o senhor acredita que o cenário político no Brasil vai melhorar?

Temos que aguardar. É um assunto muito grave, o afastamento da presidente da República. É diferente do que aconteceu em 1992, e é sempre imprevisível a reação da opinião pública. Vamos ver o que vai acontecer em relação a isso.

O senhor teme se transformar em alvo de grupos contra e favoráveis ao impeachment da presidente Dilma?

Não tenho esse temor porque a minha decisão firme é no sentido de me manter isento e imparcial e tenho certeza de que a opinião pública dos dois lados vai entender minha posição. Tenho certeza de que isso vai acontecer.

* Segundo levantamento realizado pela consultoria digital Bites, a média de idade dos deputados federais eleitos em 2014 é de 50 anos, enquanto a média dos senadores é de 59 anos. 

Fonte: UOL
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