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Denúncias de corrupção exigirão nova postura de políticos

Denúncias que envolvem líderes de todos os partidos podem obrigar mudanças nas estratégias eleitorais das eleições de 2018 em todo país.

24/04/2017 08:37

A divulgação de que o Supremo Tribunal Federal autorizou a abertura de centenas de inquéritos para investigar o suposto envolvimento de políticos com a utilização ilícita de recursos em campanha eleitoral, no âmbito da operação Lava Jato, protagoniza as discussões no cenário político atual brasileiro. De acordo com as delações realizadas até agora por executivos de empreiteiras, as irregularidades envolvem políticos da maioria dos partidos, o que sinaliza uma generalização dos atos de corrupção. 

O DIA procurou cientistas políticos, marqueteiros e dirigentes partidários para discutir o impacto das investigações nas eleições do ano que vem. Por conta do cenário, discussões na reforma política foram apressadas e alterações já devem ocorrer para as eleições do ano que vem. Para o cientista político Vitor Sandes, ainda é difícil prevê o impacto da Operação Lava Jato nas eleições do ano que vem, mas ela vai impactar. “Em 2016 vimos que o PT, o mais implicado na ocasião, perdeu um grande número de prefeituras”, citou Sandes, acrescentando, no entanto, que é preciso cautela para analisar o cenário e que os partidos tem perdido credibilidade em vários países democráticos. 

Já Raimundo Filho, especialista em marketing político e comunicação eleitoral, lembra que a visão dos eleitores em relação aos políticos vai exigir uma alteração do perfil dos candidatos. Ele citou que nas eleições de 2016, por exemplo, as cidades de São Paulo e Belo Horizonte elegeram candidatos que negavam a política. “Políticos que se diziam não políticos já se aproveitaram do descrédito das massas com a classe política e venceram seus pleitos com um discurso que negava suas próprias castas. Se essa postura era só mais uma jogada de marketing e se esse modelo não tem sustentabilidade prática, o futuro também dirá. Mas as últimas eleições já mostraram que o povo cansou da fórmula. Que não quer mais do mesmo”, pontua o especialista. 

Dirigentes de partidos no Piauí acreditam que qualquer estratégia sobre o andamento das campanhas políticas só serão discutidas no próximo ano, após o fim da tramitação da reforma política no Congresso Nacional. Para o deputado Júlio Arcoverde, as investigações da operação Lava Jato deve, ao contrário do que se discute, fortalecer os partidos. Mas, para Assis Carvalho, as delações estão criminalizando a política. 

Crise pode incentivar comportamento arredio do eleitor e políticos precisarão se reinventar 

Crimes cometidos por políticos podem incentivar aumento da abstenção e comportamento arredio do eleitor e exigir dos candidatos atos mais identidade com o eleitor, que fica mais cético a cada escândalo nacional estourado. A avaliação é de Raimundo Filho, especialista que atua em marketing político e comunicação eleitoral. Apesar das discussões sobre a reforma política e alterações no processo eleitoral ainda está em debate, o especialista aponta que reinventar-se será o desafo da classe política nacional. 

Para Raimundo Filho, marqueteiro, discursos serão mudados (Foto: Divulgação)
“Creio que esse “tapa na cara” deixado como legado pela Operação Lava Jato vai exigir dos candidatos mais identidade com este eleitor cético. Ou seja: discurso coerente, prático e de conteúdo, idoneidade moral, história de vida, legados, credenciais de eficiência, referências positivas (ainda que em outras áreas que não a política) e uma comunicação convincente, participativa, interativa, inclusiva que em vez de criar mitos, enfoque o lado mais “gente comum” do candidato, sem demagogia, claro”, avalia Raimundo Filho, acrescentando que o eleitor não acredita mais em “fantoches de discursos enlatados e oportunistas”. 

O marqueteiro político aponta ainda, que o enquadramento de políticos das maiores siglas partidárias nacionais em atos de corrupção e outros crimes, pode aumentar a visão mercantilizada do eleitor em relação a classe política. “Muitos dos eleitores vão cobrar antecipadamente sua ‘quota-parte’ no ‘empreendimento’, desistindo de uma visão altruísta e coletiva que deveriam marcar um processo democrático”, argumenta o especialista, citando que nas últimas eleições municipais esse comportamento já foi constatado. 

Sandes: "Investigações vão gerar impacto, mas ainda é difícil prevê como ele será” 

As investigações coordenadas pela Operação Lava Jato abrangem todos os grandes partidos brasileiros e envolve o nome das principais lideranças políticas do país, neste contexto, é possível avaliar que elas terão um impacto significativo no processo eleitoral do ano que vem. No entanto, para o cientista político Vitor Sandes, professor da Universidade Federal do Piauí, ainda é difícil prevê como será este impacto, tendo em vista que é preciso analisar se no momento das eleições, o cenário ainda estará instável, ou já terá mais estável. 

Cientista político Vitor Sandes diz que cenário ainda é instável (Foto: Moura Alves/ O Dia)
“É difícil prever o impacto ainda. Porque no momento das eleições, é preciso levar em consideração se apareceram provas mais contundentes, prisões de envolvidos, se algum nome político importante estará efetivamente preso”, diz Vitor Sandes, acrescentando que os julgamentos nos processos da Lava Jato também podem desempenhar impactos fundamentais. “No caso próprio mensalão, as condenações não foram digamos assim, exemplares. Além disso, o que poderia beneficiar algum grupo seria o fato de alguns partidos estarem preservados nas investigações, mas todos eles estão envolvidos, o que dificulta o cenário”, pontua o cientista político. 

Vitor Sandes ressalta que a parte de julgamentos é complexa, envolve diversas instituições e precisa ser visto com muita cautela. “O próprio mensalão teve muitas delações, informações divulgadas, mas as penas não foram grandes”, pontua. 

O cientista político lembra ainda que apesar das questões de conjuntura no Brasil, a queda de credibilidade dos partidos é geral em quase todas as democracias atuais. Ele cita a dificuldade dos partidos em contemplarem o eleitorado em relação a diversidade de assuntos nas áreas econômica, política, culturais, entre outras. No entanto, as siglas partidárias precisam resgatar a relação com os eleitores. Mas Vitor Sandes alerta que esse vínculo demanda longo prazo. “Essa iniciativa de se aproximar dos eleitores não traz efeitos a curto e médio prazos. O cidadão quer que os partidos e instituições sejam responsivos”, conclui. 

Para Vitor Sandes, o momento também é atípico por conta do recente impeachment da presidente Dilma Rousseff. Ele causou um rearranjo no posicionamento das forças políticas e excluiu o PT da coalizão de partidos governistas, o que tende a dificultar alianças do partido com demais grandes siglas. “O processo de impeachment teve apoio das pessoas que foram as ruas, e tinham como bandeira o combate a corrupção. Só que a corrupção alcançou os partidos que chegaram ao poder. A partir disso a discussão pode cair para o lado da economia, questões sociais e outras áreas”, diz o cientista política.

Por: João Magalhães e Ithyara Borges
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