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Com a reforma trabalhista, jornada de trabalho aumentará pelo menos 10%

O texto-base da reforma trabalhista foi aprovado esta semana pela Câmara Federal, e deve seguir agora para apreciação no Senado; entenda as mudanças.

30/04/2017 08:24

A sessão em que ocorreu a votação da Reforma Trabalhista no Congresso Nacional iniciou na noite de quarta-feira (26) e só encerrou na madrugada de quinta. O placar foi de 296 votos a favor e 177 contrários, o que demonstra uma divergência de grande parte dos parlamentares em relação à reforma, refletindo a opinião da maioria dos brasileiros, receosos com a possibilidade de as mudanças na legislação trabalhista acarretarem mais retrocessos do que vantagens aos trabalhadores.


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Dos dez deputados federais piauienses, apenas um votou contra a reforma trabalhista: Assis Carvalho, do PT. Todos os demais foram favoráveis ao texto que altera a CLT: Átila Lira (PSB), Heráclito Fortes (PSB), Iracema Portella (PP), Júlio Cesar (PSD), Maia Filho (PP), Marcelo Castro (PMDB), Paes Landim (PTB), Rodrigo Martins (PSB) e Silas Freire (PR).


Fotos: Arquivo O Dia

O texto altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), prevendo, entre outras medidas, o aumento da jornada de trabalho, a prevalência do acordo sobre a lei, regras para o trabalho intermitente e o fim da contribuição sindical obrigatória e da ajuda do sindicato na rescisão trabalhista.

Atualmente, a CLT dispõe que a duração normal do trabalho para os empregados em qualquer atividade privada não deve exceder 8 horas diárias, o que, no mês, corresponde a menos de 200 horas de jornada. Com as 220 horas/mês previstas na reforma trabalhista, a jornada mensal aumentará, portanto, em pelo menos 10%.


Foto: Moura Alves/O Dia

O projeto estabelece a possibilidade de jornada de 12 de trabalho com 36 horas de descanso. Segundo o relator do texto que altera a CLT, deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), o regime 12x36 favorece o trabalhador, já que soma 176 horas de trabalho por mês, enquanto a jornada de 44 horas soma 196 horas.

Paulo Bezerra, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no Piauí, critica o aumento da jornada de trabalho e a sobreposição do negociado sobre o legislado, o que, segundo ele, aumenta ainda mais a submissão dos trabalhadores às empresas. “Essa reforma trabalhista não traz nada que possa garantir direitos ao trabalhador. O que ela está trazendo é um desmanche da CLT. As garantias que nós temos através da CLT, que existe há mais de 70 anos, ainda são a única proteção que o trabalhador tem na relação com os patrões. Ninguém é favorável a uma lei que retira direitos do trabalhador”, destaca o sindicalista.


Foto: Moura Alves/O Dia

Prejuízo aos trabalhadores

Para especialistas em direito, o primeiro ponto mencionado, segundo o qual o acordo entre trabalhadores e patrões deve sobrepor-se ao que dispõe a CLT, pode representar um perigo para a parte mais frágil, que no caso são os empregados, uma vez que em muitas situações eles serão obrigados a aceitar condições salariais e de trabalho extremamente desfavoráveis, sob o risco de perderem seus empregos caso não concordem.


Foto: Assis Fernandes/O Dia

Essa negociação entre empresas e trabalhadores vai prevalecer sobre a legislação em pontos como: o parcelamento das férias em até três vezes; participação nos lucros e resultados; jornada em deslocamento; intervalo entre jornadas (limite mínimo de 30 minutos); extensão de acordo coletivo após a expiração; entrada no Programa de Seguro-Emprego; plano de cargos e salários; banco de horas, garantido o acréscimo de 50% na hora extra; remuneração por produtividade; trabalho remoto; e registro de ponto.

Por outro lado, as negociações entre patrões e empregados não podem tratar de FGTS, 13º salário, seguro-desemprego e salário-família (benefícios previdenciários), remuneração da hora de 50% acima da hora normal, licença-maternidade de 120 dias, aviso prévio proporcional ao tempo de serviço e normas relativas à segurança e saúde do trabalhador.


Foto: Assis Fernandes/O Dia

O advogado Samuel Pereira, professor de Direito do Trabalho, considera que, ao reduzir a força da CLT, a reforma trabalhista estará também enfraquecendo os trabalhadores. “Essa reforma enfraquece a legislação que ampara o trabalhador, a qual foi construída numa perspectiva de que o trabalhador merece uma proteção por parte do Estado, tendo em vista que é a parte economicamente mais fraca. Inclusive, a atual legislação já permite a negociação coletiva através de acordos e convenções, mas dentro dos limites estabelecidos pela CLT, que trata de direitos trabalhistas indisponíveis”, constata o advogado.


Foto: Assis Fernandes/O Dia

Patrícia Andrade, da CSP Conlutas, concorda que a reforma defendida pelo governo Temer é extremamente nociva para os trabalhadores, e só beneficia os grandes empresários. “O conteúdo da reforma é deletério. É um absurdo o que os parlamentares fizeram esta semana em Brasília, aprovando essa reforma trabalhista e jogando os trabalhadores numa condição de pré-escravidão. Parece que o Brasil retrocedeu mais de cem anos, quando ainda havia a escravidão. O que a gente tem a dizer sobre essa reforma é que ela não serve aos trabalhadores, ela só serve para os patrões”, afirmou Patrícia.

Trabalho intermitente

O texto da reforma proposta pelo governo de Michel Temer (PMDB) ainda propõe a modalidade de trabalho intermitente, por meio da qual os trabalhadores são pagos por período trabalhado. Ela é diferente do trabalho contínuo, que é pago levando em conta 30 dias trabalhados, em forma de salário. O projeto prevê que o trabalhador receba pela jornada ou diária, e, proporcionalmente, com férias, FGTS, previdência e 13º salário.


Foto: Assis Fernandes/O Dia

Durante a votação, foram acrescidas emendas que proíbem a contratação por meio de contrato de trabalho intermitente de aeronautas, que continuarão regidos por lei específica.

Contribuição sindical

Outro ponto polêmico da reforma trabalhista refere-se à possibilidade de o pagamento da contribuição sindical ser optativo. Atualmente, ela é obrigatória para todos os empregados – sindicalizados ou não. O pagamento é feito uma vez ao ano, por meio do desconto equivalente a um dia de salário do trabalhador.


Foto: Assis Fernandes/O Dia

Algumas centrais sindicais defendem a manutenção da cobrança compulsória. Outras acreditam que a decisão de contribuir deve ser tomada voluntariamente pelo trabalhador.

A CSP Conlutas considera que, de fato, os trabalhadores não devem ser obrigados a pagar uma contribuição sindical. “A nossa central se organiza inclusive com essa orientação política. O sindicato deve existir através de uma contribuição autônoma e independente dos trabalhadores, e não por uma imposição, porque essa imposição é uma forma de garantir a existência de sindicatos que não têm trabalho de base, que sobrevivem só desse imposto”, afirma Patrícia Andrade, membro da executiva da CSP Conlutas.


Foto: Moura Alves/O Dia

Mesmo com esse ponto convergente, a CSP Conlutas apresenta uma posição absolutamente contrária à reforma trabalhista em tramitação no Congresso Nacional, assim como praticamente todas as demais centrais sindicais.

Justiça do Trabalho

A lei que propõe mudanças na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) também estabelece que, ao examinar as convenções ou acordos coletivos, a Justiça do Trabalho “analisará preferencialmente a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, [...] balizada sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva.”

Mesmo com esta redação, o desembargador Francisco Meton Marques de Lima, do Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região, afirma que a Justiça trabalhista não será enfraquecida pela reforma.

O magistrado também criticou a criação do posto de “representante dos trabalhadores no local de trabalho”. O texto diz que essa função poderá ser criada em empresas que possuírem mais de duzentos empregados. A eleição deverá ser convocada por edital, com antecedência mínima de quinze dias, garantido o voto secreto.


O desembargador Francisco Meton Marques de Lima afirma que a Justiça trabalhista não será enfraquecida pela reforma (Foto: Arquivo O Dia)

Segundo Meton, a reforma não mexe com a Justiça do Trabalho, mas prejudica o trabalhador e tende a criar muita litigiosidade, ou seja, a Justiça vai ser mais demandada. “A reforma é negativa porque permite a ampliação da jornada de trabalho, e permite sobrepor o negociado sobre o legislado. Mas o pior é que não é o negociado com o sindicato, mas sim com um representante dos trabalhadores na empresa. Só que a Constituição determina que as empresas só podem negociar coletivamente com os sindicatos. Então qualquer lei que disser o contrário não vale”, afirma o desembargador.

Meton refere-se ao inciso VI, do artigo 8º da Constituição Federal, segundo o qual “é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho”. O desembargador afirma que essas negociações (entre os representantes e as empresas) serão analisadas caso a caso pela Justiça, e a tendência é que esse ponto da lei seja desconsiderado pelos magistrados.


Foto: Moura Alves/O Dia

Um agravante é o fato de que a lei não assegura uma estabilidade real ao trabalhador que for eleito representante dos colegas. O texto dispõe que “o mandato terá duração de dois anos, permitida uma reeleição, vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa, desde o registro de sua candidatura até seis meses após o final do mandato”. Ou seja, nenhum trabalhador terá autonomia suficiente para lutar, de fato, pelos interesses dos colegas de trabalho, em detrimento das vontades do patrão, uma vez que a garantia de sua estabilidade na empresa se estenderá por apenas seis meses após o fim do mandato.

Sobre o trecho que sugere a “intervenção mínima” da Justiça na negociação entre patrões e empregados, Meton também afirma que ele é anulado pelo que dispõe a Constituição em seu artigo 5º, inciso XXXV, segundo o qual “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”

O desembargador Francisco Meton acredita que, caso a reforma seja aprovada no Senado, a tendência é que alguns de seus pontos sejam alvos de ações diretas de inconstitucionalidade movidas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e por partidos políticos.


Para o desembargador Franciscso Meton, alguns pontos da reforma podem ser alvo de ações direta de inconstitucionalidade movida pela OAB e por partidos políticos (Foto: Arquivo O Dia)

Políticos de má fé

O desembargador do TRT da 22ª Região pondera que a reforma em tramitação no Congresso é “um movimento de cima pra baixo, que representa a entrega do Estado para a economia”, e que está sendo orquestrado por políticos de má fé, com o aval de grandes conglomerados empresárias.

Segundo o magistrado, essa reforma apresenta-se como alternativa para que os políticos e empresários desonestos possam continuar usurpando os cofres públicos, uma vez que a Justiça, o Ministério Público e a Polícia Federal têm fechado o cerco para autoridades corruptas, tornando mais arriscados os antigos esquemas utilizados para desviar os recursos públicos.

Para Meton, com a Operação Lava Jato, os representantes do Estado estão deixando de beber no cofre para tomar o cofre. “Ou seja, em vez de estarem sendo os sócios do erário, eles estão tomando o próprio erário. Aí nós vamos ser funcionários das empresas que estão dominando o país. Os pequenos empresários vão continuar sofrendo, e as grandes empresas tendem a engolir as pequenas, como já vem ocorrendo. É um oligopólio que está se estabelecendo no Brasil, e agora estão tomando o erário público”, afirma o desembargador.

Ele observa, ainda, que essas grandes empresas estão exercendo um verdadeiro “domínio” sobre os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. “Eles dominaram tudo, o Supremo, a Câmara dos Deputados, o Senado, o Executivo. A tendência é que isso tudo crie uma revolta no povo e nas próximas eleições seja vitorioso um candidato que defenda o contrário de tudo isso que está aí. O povo vai ver o que está acontecendo no seu bolso, porque o desemprego aumentou e a economia não cresceu”, avalia o desembargador.

Dia de luta e de celebrar conquistas

O Dia do Trabalhador só é comemorado em 1º de maio, mas o momento de celebrar as conquistas profissionais começou bem mais cedo para a classe das empregadas domésticas. Dia 27 de abril se comemorou o dia nacional da empregada doméstica. A data foi escolhida em homenagem à Santa Zita, padroeira da categoria. Italiana, Zita trabalhou desde os 12 anos para uma família na cidade de Lucca. 

Homenageando  estas profissionais, e celebrando um pouco as conquistas que as domésticas tiveram ao longo de anos de luta, a TV O Dia traz um especial focando nos desafios que surgirão daqui para frente com as reformas trabalhistas propostas pelo Governo Federal.

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Edição: Nayara Felizardo
Por: Cícero Portela
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