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Rituais pós-morte renovam emoções de quem convive com a saudade

Amanhã é Dia de Finados e a peregrinação aos cemitérios é apenas uma das formas de reavivar a lembrança das pessoas que já partiram.

01/11/2015 08:10

Uma prece entoada pela lembrança de alguém que faleceu. Uma vela acendida como símbolo da ‘passagem’ de uma alma. A visita corriqueira ao túmulo de entes queridos. Flores que visam homenagear a história de quem não está mais presente. Esses são apenas alguns, dos vários rituais realizados pós-morte. Para quem convive com a perda de alguém, os atos são uma forma de reavivarem a lembrança das pessoas que fizeram parte de suas vidas.

A funcionária pública Lúcia Castelo Branco entende o que é conviver com a saudade. Após a morte dos pais, ela explica que a visita ao cemitério se tornou um hábito que faz parte do cotidiano. “É a única forma que a gente tem de amenizar a saudade, que é imensa. Meu pai está com três anos de falecido e minha mãe com cinco anos. Todo mês, a gente está aqui trazendo flores para amenizar essa saudade”, explica.

O depoimento de Lúcia representa o que move grande parte da população a revisitar os cemitérios. É uma forma de se sentir mais perto; assim, diminuindo a saudade que fica de quem já não está mais presente.O ritual realizado pela funcionária é repetido pelo marido, filhos e familiares.

“Estamos aqui para continuar homenageando a trajetória deles. Estar aqui é uma forma de compensação. A gente nunca esquece, mas aqui a lembrança fica ainda mais viva. Só porque eles faleceram, nós não vamos abandonar”, conta com a voz emocionada.

Mesmo após mais de 20 anos da morte do pai, Teresa Cristina também segue a tradição. Com flores nas mãos e a certeza de que é muito difícil conviver com a ausência de quem se ama, ela visita o túmulo rotineiramente.

“É um ritual que a gente aprende desde cedo e mantém. A gente sabe que ele não está aqui, mas eu sempre trago flores, procuro manter o local limpo e preservado. Já se foram 22 anos desde a morte do meu pai, mas é como se fosse ontem para mim”, confessa.

Ritual

O historiador francês Philippe Ariès dedicou parte de sua vida a entender a atitude do homem diante da morte. Em seu livro intitulado ‘História da morte no Ocidente’, o pesquisador se dedica a mostrar as mudanças acontecidas na forma de encarar a morte ao longo dos anos.

Segundo o historiador, enquanto na Idade Média as pessoas sentiam uma familiaridade com a morte, que era um acontecimento público e sem caráter dramático ou gestos de emoção excessivos; a partir do século 18, a morte passou a ser encarada como uma transgressão que roubava o homem de seu cotidiano e da sua família.

O livro mostra que, a partir da segunda metade do século 19, a morte se transformou em tabu: os parentes da pessoa que se aproximava da morte passaram a tentar poupá- -lo, esconder a gravidade do seu estado. Já a partir dos anos 1930, a medicina mudou a representação social do ato, sendo comumente associado a hospitais e não mais a ação de permanecer em casa.

Dia de Finados tem tradições milenares

Considerado um dos mais importantes rituais religiosos, o Dia de Finados, celebrado amanhã (2), relembra a memória dos mortos e congrega tradições de orações e meditação na maior parte dos países ocidentais.

De acordo com a doutrina da Igreja Católica, a alma da maioria dos mortos está no Purgatório, passando por um processo de purificação. Por essa razão, a alma necessita de orações dos vivos para que intercedam a Deus pelo sofrimento que as aflige. Por esse contexto, o Dia de Finados era conhecido na Idade Média como “Dia de Todas as Almas”, dia esse que sucedia o “Dia de Todos os Santos” (comemorado em 1º de novembro).

A história de rituais pós-morte é milenar. Segundo pesquisadores da área, o principal responsável pela instituição de uma data específica dedicada à alma dos mortos foi o monge beneditino Odilon de Cluny. O religioso foi e responsável por importantes reformas no clero no período da Baixa Idade Média. No dia 2 de novembro de 998, Odilon instituiu aos membros de sua abadia e a todos aqueles que seguiam a Ordem Beneditina a obrigatoriedade de se rezar pelos mortos.

Apenas a partir do século XII, essa data popularizou- -se em todo o mundo cristão medieval como o Dia de Finados, e não apenas no meio clerical. Desde então, o ritual de ir ao cemitério com flores para homenagear a memória dos que já se foram, acender velas ou entoar orações se tornou comum neste dia.

Foto: Elias Fontenele/ODIA
Por: Glenda Uchôa - Jornal O DIA
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