Portal O Dia - Notícias do Piauí, Teresina, Brasil e mundo

WhatsApp Facebook Twitter Telegram Messenger LinkedIn E-mail Gmail

Plástico se torna problema ambiental devido consumo desenfreado e má gestão

Os cientistas estimam que mais de 70% da produção total de plástico está em esgotos

05/08/2017 09:29

Celular, escova de dentes, partes do carro, peças do computador, utensílios de cozinha, brinquedos, produtos de saúde e tantas outras aplicações. Não há dúvidas de que o plástico é um material imensamente presente na vida moderna e sua densa aplicabilidade o coloca em um lugar de importância na rotina do mundo. Mas não há só o que celebrar. O uso desenfreado e a má gestão desse produto trazem um problema ambiental agravante. Cientistas america¬nos calcularam a quantidade total de plástico já produzida pela humanidade e afirmam que ela chega a 8,3 bilhões de toneladas.

Apesar do imenso benefício do produto, sua má utilização e inadequado descarte fazem com que as consequências para o meio ambiente sejam desastrosas. Os cientistas esti-mam que mais de 70% da pro¬dução total de plástico está em esgotos, que vão principalmente para aterros sanitários ou seguem acumulados em ambientes abertos, incluindo os oceanos.

Plástico se torna problema ambiental devido consumo desenfreado e má gestão. (Foto: Jailson Soares/Jornal O Dia)

Para a gestora ambiental e pesquisadora, Elaine Apare¬cida da Silva, o principal pro-blema do plástico é a má ges¬tão feita nas diferentes esferas da sociedade: poder público e sociedade civil. “A forma como a gente gerencia esse produto não está correta. A Política Nacional de Resíduos Sólidos, que é uma lei federal de 2010 e explica como deve se dá a gestão de resíduos no Brasil, indica que só devem ser encaminhados para o aterro o que for rejeito, e plástico não é rejeito, é resíduo, porque tem potencial de revalorização, pode ser reutilizado, recicla¬do, a Política Nacional coloca essa prioridade”, destaca.

Mas o que existe no papel, está longe de acontecer na prática. Os plásticos ainda são itens densamente presentes em aterros, lixões e no meio ambiente, onde todo o seu potencial de reutilização é ne¬gligenciado e, ao invés de so¬lução, vira problema.

No meio ambiente, sacos plásticos podem levar de 30 a 40 anos para se decompor, já uma garrada PET mais de 100 anos. E já que a produção de poliestireno de alto impacto começa a ser produzido comer¬cialmente em 1950, ainda pode existir, no meio ambiente, pro¬dutos que iniciaram sua produ¬ção há mais de 60 anos.

“Há um desincentivo à cadeia da reciclagem em Teresina”, diz pesquisadora

A Política Nacional de Resíduos Sólidos oficializou a responsabilidade compartilhada de toda a sociedade na gestão dos resíduos sólidos urbanos. Isto quer dizer que os governos, nas esferas municipais, estaduais e federal, bem como a sociedade civil, devem atuar de forma conjunta para a diminuição do impacto do que é produzido e descartado. Aplicar a logística reversa na utilização do plástico, por exemplo, é uma das necessidades apontadas por estudiosos da área. Mas isso segue sendo uma realidade distante.

A pesquisadora Elaine Aparecida, que baseou seu doutorado no estudo da indústria de transformação do plástico em Teresina, faz importantes apontamentos e indagações sobre o tema. “Fiz uma abordagem da logística reversa, avaliando a possibilidade de ter isso em Teresina. Mas o que constatei é que, apesar da reciclagem acontecer com frequência aqui na Capital, a ideia ecológica dessa prática não funciona por completo. E faltam elementos importantes dentro da gestão de governança e educação da população para a logística reversa acontecer”, considera.

A pesquisadora Elaine Aparecida baseou seu doutorado no estudo da indústria de transformação do plástico em Teresina. (Foto: Moura Alves/Jornal O Dia)

Quando Elaine fala sobre a logística reversa, ela aponta a ação para a tratativa de produto de pós-consumo, com destinação para as indústrias que reutilizarão esses itens como matéria-prima. Nessa cadeia, as pessoas saberiam que utilizariam um produto, os órgãos governamentais interveriam para dar viabilidade para que isso retornasse a indústria base.

O que existe em Teresina, atualmente, é a utilização de Pontos de Entrega Voluntária (PEVs), onde a população pode destinar o material reciclado e a Prefeitura se encarrega do encaminhamento posterior. “O problema é que nem todo mundo sabe onde existem esses pontos ou podem ir deixar esses materiais. Há, de certa forma, um desincentivo à cadeia da reciclagem”, afirma Elaine.

Mais gastos

E mesmo quando essa cadeia funciona, ou seja, quando o plástico é utilizado e reencaminhado à indústria, o ciclo que seria potencialmente benéfico ao meio ambiente, se quebra. “Até então, a reciclagem era vista com uma áurea de ambientalmente correta. Só que, foi vendo como a reciclagem acontecia em Teresina, que essa ideia cai por terra. Muito do plástico que chega à indústria vem impregnado com poeira, com gordura, é necessária mais água para fazer lavagem, também tem o custo de energia, isso faz com que a reciclagem fique mais cara do que poderia ser e não é ambientalmente correta. O efluente não é tratado e está transformando aquilo em um passivo ambiental”, alerta.

Para a pesquisadora, há um desequilíbrio logístico e, assim, o plástico, apesar de não ser um vilão por si só, acaba se tornando devido aos fatores de ausência da devida gestão do poder público e falta de educação da população.

“Uma das coisas que a gente falou é que a gente tem um desequilíbrio logístico, o consumidor sabe a facilidade de comprar, mas não de devolver. Eu não vejo o plástico como um vilão, vejo como uma solução para diversas demandas da sociedade. Mas o problema é a má gestão desse resíduo, tanto das pessoas quanto dos governos”, finaliza.

Em Teresina, plástico representa apenas 15% do total de resíduos recicláveis recolhidos

Plástico, papel, vidro e metal. Esses são os materiais mais comuns que podem ser reaproveitados diariamente na gestão do lixo domiciliar e comercial. Espalhados por Teresina, os Pontos de Entrega Voluntária (PEV) existem para recolher o material reciclável e encaminhá-los para o reaproveitamento.

Segundo a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Semduh), no primeiro semestre deste ano, já foram recolhidos um total de 204 toneladas de materiais recicláveis em Teresina. Desse total, 41% foi vidro, 26% papel, 15% plástico e 8% metal.

Plástico representa apenas 15% do total de resíduos recicláveis recolhidos em Teresina. (Foto: Jailson Soares/Jornal O Dia)

Ao todo, são nove PEVs e cinco “PEVinhos”, que possuem capacidade menor. Os contentores utilizados para o serviço têm indicadores que identificam pela cor e pelo tipo de material que cada um pode receber, a fim de facilitar a coleta seletiva.

Para participar da coleta seletiva, a população deve fazer a segregação dos resíduos (papel, plástico, metal e vidro) em casa e colocá-los em recipiente/saco diferente para cada tipo de material. Em seguida, poderá deixar o material em um dos PEVs ou PEVinhos implantados na Capital. Após o recolhimento, o material é encaminhado para a Associação Trapeiros de Emaús.

O equipamento com adesivo de cor vermelha recebe os vários tipos de plásticos recicláveis (garrafas PET, potes diversos, tampas de embalagens, sacos plásticos, canos de PVC, copos descartáveis); o de cor verde para vidros (garrafas de sucos e refrigerantes, cervejas e outros tipos de bebidas, potes de alimentos, cacos de vidro, vidros planos e lisos, vidros de janela); os contentores adesivados de azul recebem o papel (papelão, caixa de embalagens, papel de presente, folhas de caderno, entre outros); e os contentores amarelos para os metais (latas de alumínio e aço, tampas e panelas sem cabo, arames, chapas de metal, objetos de alumínio em geral, canos de metal, molduras de quadros, tampinhas de garrafa).

Para famílias que sobrevivem da reciclagem, ‘plástico é ouro’

Quando Antônio Francisco, de 58 anos, circula pelo grande galpão da entidade Trapeiros de Emaús, localizado no bairro Samapi, zona Leste de Teresina, sua presença fica quase despercebida no meio das toneladas de materiais recicláveis com que trabalham as 12 famílias que sobrevivem da atividade de triagem dos resíduos. Enquanto as pessoas enxergam no material sobreposto no galpão apenas lixo, Antônio vê possibilidade de renda e vida.

Há 20 anos, os Trapeiros atuam em Teresina recebendo materiais usados e recicláveis para repassar às indústrias locais. Entre plástico, papel e ferro, o produto mais rentável para os trabalhadores é o plástico.

Antônio Francisco diz que o plástico é o mais rentável entre os materiais recicláveis. (Foto: Jailson Soares/Jornal O Dia)

“Plástico é ouro para a gente, porque tem um bom valor de revenda. O que as pessoas veem como lixo, nós enxergamos uma oportunidade de sobreviver. E esse trabalho, eu sei, não ajuda só nós que trabalhamos com isso, mas a sociedade toda, já que o meio ambiente não sofre com todos esses resíduos”, conta Antônio Francisco, um dos responsáveis pela gestão dos Trapeiros em Teresina.

Enquanto a tonelada do vidro custa R$ 0,1 centavo na indústria de reciclagem, o plástico tem valor de R$ 0,60. “Com uma tonelada de vidro, a gente faz R$ 100. Com uma tonelada de plástico, é R$ 600. Isso ajuda muito a gente”, avalia. Já o papel, que também é recebido pela entidade, é repassado pelo valor de R$ 0,15 centavos.

A entidade recebe contribuição da Prefeitura de Teresina, que destina o material recolhido nos PEVs ao galpão. Os trapeiros também possuem um carro para fazer coleta dos materiais reciclados em empresas e residências. Mas Antônio sonha alto.

“Infelizmente, só com um transporte a gente não pode fazer nada. O que eu queria era poder desenvolver uma coleta seletiva de porta em porta em Teresina, isso ajudaria o meio ambiente e mais famílias que sobrevivem da reciclagem”, conta.

Como funciona

A entidade dispõe de um veículo para recolher em domicílio, todas às segundas, quartas e sextas-feiras, as doações que as pessoas fazem através de ligação telefônica. Nos demais dias da semana, a coleta acontece nos órgãos públicos que doam papéis usados. Os objetos que chegam com algum defeito são restaurados e colocados à venda num bazar que acontece a cada dois meses no próprio barracão da entidade. Pessoas interessadas em fazer doações podem ligar de qualquer ponto da cidade para os telefones: 3234-9299 e 99407-1889.

Por: Glenda Uchôa - Jornal O Dia
Mais sobre: