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Movimento que restringe acesso de crianças a certos locais divide opiniões

O 'Child Free' nasceu nos Estados Unidos na década de 1970, sendo defendido por pessoas que optaram por não ter filhos e nem ficarem próximos de crianças por uma série de fatores.

27/08/2017 07:27

O "Child Free" é um movimento muito polêmico e que voltou a ser discutido na semana passada, quando o caso de Miguel Figueiredo, um garoto de apenas 06 anos, do Rio de Janeiro, ganhou repercussão nas redes sociais. Ao ser convidada para um casamento, a mãe do menino foi informada pela noiva que "não queria criança no seu casamento". A frase causou revolta na mãe, que foi obrigada a deixar o filho em casa.

Engana-se quem pensa que esse é um caso isolado. Há quase um ano, a apresentadora Raiza Costa, que tem um canal no YouTube chamado Dulce Delight e um programa na GNT, defendeu a proibição de crianças em restaurantes e a declaração gerou polêmica nas redes sociais.

Outro caso que também chamou bastante atenção foi o de uma mãe, Debora Oliveira, de São Paulo, que comentou uma publicação do restaurante Underdog, onde dizia "Aqui seu cão é bem vindo!!! Mas crianças favor amarrá-las ao poste". Ela que tem um filho de apenas 02 anos criticou a postura do estabelecimento e recebeu ofensas por parte do empreendimento. 


Foto: Reprodução/Instagram

Mas afinal, o que é o "Child Free"? É um movimento que ganhou forças na década de 1970 nos Estados Unidos, por pessoas que optaram não ter filhos nem ficarem próximos de crianças, por uma série de fatores.

O tema gera muita polêmica, não somente por restringir o acesso de crianças a determinados espaços, mas por impor uma condição àquela mãe, de ser obrigada a não frequentar certo local por conta de regras ou objeções dos estabelecimentos. A psicóloga Denisdéia Sotero explica que a decisão de levar ou não uma criança a determinado local ou evento deve partir dos pais, que irão observar o ambiente, se é próprio ou não para o filho.

Além disso, ela ainda ressalta que as objeções impostas por esse movimento é preconceituosa e, em geral, aplica por pessoas que não tem filhos ou não querem ter contato com crianças. "Quando dizem que não querem uma criança em determinado evento ou local é porque não querem que elas corram, gritem, seja criança, porque, enfim, pode atrapalhar.. Mas, de acordo com o contexto familiar, qualquer criança pode participar de um evento sem nenhum problema, principalmente porque os pais já orientam, ainda em casa, dizendo que ela não pode correr, que precisa se comportar de tal forma, e elas obedecem. Proibir de um modo geral não é algo positivo", pontua.

A especialista ainda explica que os pais que se sentirem discriminados devem protestar, vez que não há uma lei que proíba o acesso de crianças em restaurantes, hoteis ou eventos de um modo geral. Exceto no caso dos cinemas, por exemplo, onde é aplicada a faixa etária recomendada previamente. 


Foto: Reprodução/Facebook

"Os pais que precisam ter o bom senso e consciência do local que eles devem levar o filho, não alguém tendo que dizer. Se uma festa inicia às 22 horas e seu filho tem apenas 02 anos, não é interessante levar essa criança, porque ela tem um horário para dormir. Então de regra é mais ou menos assim. O Child Free é um início para outras proibições, se eu não aceito criança, posso não aceitar casais gays. Se eu aceito um público, porque não aceito outro? isso também é uma discriminação, porque está sendo selecionado quem aceitar ou não", enfatiza a psicóloga, destacando que essa proibição não é somente para criança, mas também para os pais e a família de um modo geral.

Denisdéia Sotero pontua que as crianças precisam socializar com os adultos para que tenham um melhor desenvolvimento, e que isso só é possível através de interação com adultos.

"A restrição não é apenas da criança, mas da família", diz mãe

A auditora Suely Ramos Ribeiro (37) conta que nunca chegou a viver uma situação em que foi convidada a se retirar de um estabelecimento por estar com suas filhas, o que para ela seria algo extremamente constrangedor. Contudo, ela cita que já se hospedou em um hotel que restringia a entrada de crianças. "Existem hotéis que não aceitam crianças e quando eu viajei com meu esposo e vi que no local que estávamos tinha isso eu achei muito forte e fiquei chocada. O objetivo do hotel é não ter trabalho, como se dissessem 'é meu, minhas regras'. Na hora eu não disse nada, mas se eu estivesse com minhas filhas eu teria ido questionar o porquê desse procedimento, porque essa é uma restrição que não é apenas à criança, mas à família", conta. 

Para Suely, o Child Free não somente discrimina como constrange mães e filhos, já que impõe para aquela famílias como elas devem se comportar e o que devem fazer, desconsiderando o desejo dos pais de ter os filhos consigo em determinados locais ou eventos.

"Eu não acredito que existam eventos sociais que não possam receber crianças, exceto festas direcionadas, como aquelas com bebidas, por exemplo. No geral, cabe o bom senso dos pais de querer levar o filho ou não, e quando você leva, acaba sendo discriminado porque o filho está apenas sendo criança", frisa.

Segundo ela, infelizmente sempre haverá essa insatisfação de alguns grupos com outros, gerando restrições e/ou regras. Entretanto, ela lembra que as crianças possuem os mesmo direitos de qualquer indivíduo e que as famílias não devem deixar de frequentar determinados espaço por conta dessas imposições, pelo contrário, devem questionar e exigir atitudes menos discriminatórias.

Estabelecimentos podem restringir acesso de crianças, desde que previamente informado

Porém, apesar da polêmica, o advogado André Saraiva explica que não deve-se falar em discriminação, ou ilegalidade, vez que não existe problema algum ao restringir o acesso de crianças, desde que isso seja informado previamente e de forma clara. Além disso, não há uma lei específica que proíba o estabelecimento de fazer isso e que o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) apenas explicita que não haja discriminação. "Mas, neste caso,  trata-se apenas de uma restrição. Tal restrição busca além do óbvio maior conforto e tranquilidade dos clientes a precaução quanto à acidentes", conta.

O advogado acrescenta que, assim, não se pode observar o fato com uma restrição de liberdade da criança, mas sim a utilização dentro da sua entidade particular, do mesmo modo que há estabelecimentos que não admitem menores de 18 anos desacompanhados. André Saraiva enfatiza que é importante diferenciar o espaço público do privado, assim como do local privado acessível ao público.

"Os locais acessíveis ao público ainda são locais privados, ou seja, em que é facultado às pessoas, o acesso mediante o preenchimento de certas condições, não se confunde lugar público com espaço acessível ao público (ou aberto ao público). Locais acessíveis ao público não ferem o direito de ir e vir, ao impedir o acesso fora dos horários pré-determinados, quando proíbem o acesso de crianças e animais em seus espaços (são lei que afirme o contrário, como no caso da proibição de restrição à deficientes). Não há que se falar em discriminação uma vez que não trata de proibição da entrada de pais e sim da restrição quanto a entrada com ou não crianças, cabendo àqueles se sentirem desconfortáveis com a situação o simples deslocamento para locais com práticas menos restritivas", finaliza André Saraiva.

Por: Isabela Lopes, especial para o Portal O Dia
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