A logomarca do governo do
presidente interino Michel
Temer (PMDB) foi divulgada
nas primeiras horas após o
Senado aprovar a admissibilidade
do processo de impeachment
da presidente Dilma
Rousseff (PT). A equipe que
cuidou da marca gráfica do
novo governo apostou no slogan
“Ordem e Progresso”, que
para especialistas ouvidos por
ODIA, é um termo ligado ao
positivismo, que aposta no
conservadorismo, e simboliza
uma forma de apelar à sociedade
por uma paz social,
pedindo paciência por um
momento, enquanto também
sinaliza ao mercado que será
criado um cenário político e
econômico voltado para as
condições de segurança nos
investimentos.
O sociólogo Francisco Mesquista,
professor da Universidade
Federal do Piauí, explica
a origem do termo. Segundo
ele, o pensador social Augusto
Comte, no século XVIII,
cunhou o termo para se referir
ao processo pós-revolução
francesa, em que, segundo
sua interpretação, havia
uma sociedade desorganizada
e uma nação que não estava
conseguindo progredir,
por conta do processo revolucionário
do período.
Fotos: Elias Fontenele/ODIA
“Pela teoria em que o lema
Ordem e Progresso foi proposto,
era necessário ordenar
a sociedade para que ela
pudesse progredir. Nada de
revolução, de guerra civil,
de luta entre trabalhador e
patrão. Isso significa dizer
que é preciso estabelecer
regras e normas que pudessem
reorganizar a sociedade
dentro de uma perspectiva
de um novo projeto político
e socioeconômico”, pontua o
professor.
Para o especialista, no
ponto de vista sociopolítico
e histórico, o termo Ordem
e Progresso se revela conservador
e reacionário, pois tem
como base a necessidade de
por fim a revoluções que tinham
como objetivo, levar a
classe trabalhadora ao poder.
Mesquita argumenta ainda
que no contexto atual, a escolha
do novo slogan não é
feita à toa. “Podemos colocar
que passamos por 13 anos de
um governo progressista, de
um presidente que vinha das
classes populares e conseguiu
eleger uma mulher para
presidência. O novo governo
quer comunicar exatamente
um recado para a sociedade,
no sentido de é preciso de
ordem e tempo para começar
algo positivo”, pontua.
O sociólogo argumenta
que em seu ponto de vista,
o slogan demonstra que o
governo está regredindo ao
invés de avançar. “Esse lema
vem exatamente de um processo
de discussão conservador,
e tem muito a comunicar,
mas ressalte-se que não
é de causar estranheza porque
todos os setores que apoiaram
o debate sobre o impeachment
era de certa reacionário e conservador”,
conclui.
“Não traz nada de inovador e é pouco criativa”,
avalia publicitário piauiense sobre logomarca
Desde o instante em que
foi divulgada, a logomarca do
governo interino de Michel
Temer recebeu uma série de
críticas. Uma das primeiras,
e provavelmente a mais grave,
foi relacionada ao fato da
identidade visual criada pelo
publicitário Elsinho Mouco
possuir o mesmo globo presente
da bandeira nacional,
mas com apenas 22 estrelas,
quando o correto seria 27,
que representam todos os
Estados e o Distrito Federal.
A bandeira que utilizava
apenas 22 estrelas é referente
a Quarta República
(1946-1964) e da Ditadura
Militar (1965-1985).
Elsinho argumenta que se
tratava apenas de um layout,
apresentado equivocadamente.
Equívoco ou erro, o fato é
que essa situação acabou gerando
interpretações variadas.
Para o publicitário piauiense,
Netto Carvalho, que trabalha
como designer gráfico
desde 1995, o que aconteceu
foi “uma grande mancada” da
equipe do marqueteiro Elsinho
Mouco. “Aparentemente
um erro básico de pesquisa,
ainda na formulação do projeto,
um mero descuido, nada
intencional”, disse.
Por outro lado, há quem
defenda que esse “erro” tenha
realmente o propósito de fazer
uma referência ao passado,
época da ditadura militar, mas
como não foi bem recebida,
divulgaram que vão fazer as
correções.
Slogan
Sobre o “Ordem e Progresso”,
Netto Carvalho faz a seguinte
avaliação: “Embora
pouco criativo, já que ele simplesmente
se apossou do lema
já escrito no nosso símbolo
oficial, é forte, e traz, pelo menos
na teoria, um sentimento
de civismo, necessário nesse
momento de descrédito, sobretudo
da população com a
classe política”.
O publicitário acrescenta
ainda que outra meta fundamental
ao explorar esse slogan
é fazer uma contraposição ao
posicionamento do governo
anterior deixando subentendido
que esse é o momento
de “ordenar a bagunça e fazer
o país progredir”.
"Ordem é condição necessária para
estabelecer projetos", diz cientista político
Para o cientista político
Cleber de Deus, também
professor da Ufpi, apesar do
histórico do tema ser ligado
principalmente ao processo
de instalação da proclamação
da independência no país, a
principal marca do discurso
do novo governo é que em
meio ao clima de instabilidade
política, a ordem é condição
necessária para criar a
estabilidade, com a qual será
estabelecida parâmetros e
projetos visando estabilizar a
economia.
“Qualquer estado de direito
precisa de ordem mínima
para alcançar seus objetivos
e conseguir buscar e implementar
medidas que ele defende.
Vivemos uma instabilidade
política e o principal
objetivo hoje é garantir ordem
interna, para que a partir
de hoje possa lutar pelas mais
diversas ordens. A própria ordem
na economia através de
estabilidade contribui para
implantar uma ordem democrática”,
pontua o professor.
Ele argumenta ainda que
é essa ordem que pode gerar
condições econômicas
e sociais positivas e refuta
qualquer ideia de traço autoritário
com o slogan da logomarca
do novo governo.
De acordo com o sociólogo
Francisco Mesquita, a
corrente ideológica que expressa
a ordem e o progresso
é uma espécie de bandeira do
capitalismo. “O capitalismo
sempre trabalhou para que tivesse
ordem e progresso. Ele
precisa de estabilidade, de
um ar de tranquilidade, para
que tranquilamente o mercado
possa produzir”, conclui.
*A matéria completa você confere na edição desta segunda do Jornal O DIA.