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Levantamento aponta que 126 bebês morreram na Evangelina Rosa só este ano

O Conselho Regional de Medicina do Piauí (CRM-PI) e o Ministério Público do Estado já haviam constatado as irregularidades graves na maternidade.

24/05/2017 10:46

Um levantamento feito pela Câmara Municipal aponta que 126 bebês faleceram na Maternidade Dona Evangelina Rosa (MDER) só entre janeiro e meados de maio deste ano.

O Conselho Regional de Medicina do Piauí (CRM-PI) e o Ministério Público do Estado já haviam constatado as irregularidades graves na maternidade, inclusive a falta de UTI neonatais. E agora o problema foi constatado de perto pelos vereadores que integram a Comissão de Saúde da Câmara Municipal.

Segundo o vereador Dr. Lázaro (PPS), além da escassez de leitos, outro problema que agrava a situação da maternidade é a falta de critérios mais rígidos para determinar quais bebês devem permanecer internados na unidade, o que faz com que parte da estrutura seja utilizada para atender crianças sem risco de morte, em detrimento de outras que precisam de uma atenção intensiva.

Dr. Lázaro, vereador de Teresina, apresentou requerimento solicitando a realização de uma audiência pública para tratar do problema (Foto: Assis Fernandes / O DIA)

"Nós acompanhamos todas as diligências que foram feitas às UTIs neonatais de Teresina e nós comprovamos uma verdadeira situação de calamidade, de guerra. A Maternidade Dona Evangelina Rosa deveria ser uma unidade de atenção terciária, de casos mais complexos, tanto da capital quanto os vindos do interior, mas lá existe uma cultura de se atender todos os tipos de casos, e aí aqueles casos mais graves, como as crianças prematuras, acabam não encontrando um ambiente adequado para sua recuperação, exatamente por conta da superlotação. Nós recebemos essa informação da própria maternidade, através do gestor da área de neonatologia, apontando que só lá na Evangelina Rosa 126 crianças morreram por falta de um leito na unidade de tratamento intensivo", afirmou Dr. Lázaro.

"Eram crianças perfeitamente recuperáveis, que nasceram prematuras, por exemplo, e o pulmão ainda não estava maduro o suficiente, mas se tivessem recebido a assistência ventilatória e os cuidados adequados elas perfeitamente poderiam sobreviver", lamentou o vereador.

O parlamentar também denuncia o deslocamento de leitos de UTI da Maternidade do Dirceu (Ciamca) para a Maternidade do Buenos Aires, processo que teria resultado na morte de mais duas crianças. Diferente da Maternidade Evangelina Rosa, que faz parte da rede estadual, as unidades do Dirceu e do Buenos Aires integram a rede municipal.

"Nós também recebemos essa denúncia, que eu conferi in loco, a respeito de uma UTI tradicional, que tinha bons resultados, com a recuperação de crianças próxima de 100%, que é a UTI da Maternidade do Dirceu, e lá, também, por uma questão administrativa, foi deslocada para o Hospital do Buenos Aires. E por conta dessa mudança duas crianças faleceram. Isso é muito grave!", denuncia o vereador, que também é médico.

Para piorar, segundo Dr. Lázaro, o Hospital do Buenos Aires oferece aos seus servidores condições de trabalho bem inferiores às da Maternidade do Dirceu. 

"Recebemos informações de que as condições de trabalho no Hospital do Buenos Aires não chegam nem perto das que os profissionais de saúde tinham anteriormente na Maternidade do Dirceu. Você leva muito tempo para formar uma equipe de UTI competente, conectada. Porque a criança pode nascer com vários tipos de problemas, e necessitar de uma assistência multidisciplinar, e aí, por uma questão administrativa, da noite para o dia se toma uma decisão absurda dessas. Com isso nós não podemos concordar, porque implica na perda de vidas", ressaltou Dr. Lázaro.

O vereador estima que seria necessário dobrar o número de leitos de UTI neonatal no estado para evitar que mais bebês continuem morrendo. Atualmente, existem pouco menos de 50 leitos de terapia intensiva neonatal no estado. Mas o ideal, segundo o vereador, é que houvesse pelo menos 94 leitos.

Audiência na Câmara vai discutir problema

Durante a sessão desta quarta-feira, na Câmara Municipal, o vereador Dr. Lázaro apresentou um requerimento solicitando a realização de uma audiência pública destinada a discutir o problema e encontrar uma solução o mais rapidamente possível, para evitar que novas crianças morram por falta de leitos de UTI nas maternidades públicas da capital.

O requerimento foi aprovado por unanimidade pelos vereadores presentes na sessão, mas a data da audiência pública ainda será marcada.

Diretor diz que deficiência na regulação sobrecarrega MDER

Em entrevista ao portal O DIA, o diretor-geral da Maternidade Dona Evangelina Rosa, Francisco Macêdo, afirmou que a deficiência na regulação feita por outros hospitais é um dos principais fatores que provocam a superlotação na unidade estadual, que é referência no Piauí, uma vez que muitos bebês são encaminhados para a MDER sem que haja necessidade, ocupando o lugar de outros que apresentam quadros mais graves.

Francisco Macêdo, diretor da Maternidade Dona Evangelina Rosa (Foto: Raoni Barbosa / Arquivo O DIA)

Além disso, Macêdo afirma que é preciso haver um reforço na atenção básica e no acompanhamento pré-natal das gestantes, de maneira a reduzir as complicações que possam fazer com que mais bebês nasçam precisando ser internados em leitos de UTI.

"A superlotação ocorre pela não existência de leitos suficientes de neonatologia na atenção básica. Nós precisamos dar ênfase à atenção básica, a um pré-natal bem feito, tratando as intercorrências da gravidez, para que este bebê não venha a se tornar um bebê de alto risco, porque quando isso ocorre o caminho natural dele é a Maternidade Dona Evangelina Rosa [...] E ainda tem a questão da regulação. Chega o bebê de risco habitual na MDER, que não necessariamente deveria vir para cá, ocupar um leito de alto risco. Ele poderia ser tratado lá na atenção básica", observa Francisco Macêdo, ressaltando que as demais maternidades do estado e municípios precisam melhorar o serviço de regulação, de maneira a evitar que bebês sejam encaminhados para a MDER desnecessariamente.

Mesmo com o número impressionante de 126 mortes registradas só este ano na MDER, o diretor-geral afirma que a mortalidade infantil foi reduzida no último mês, e, segundo ele, a tendência é que esse resultado positivo se mantenha.

"A mortalidade neonatal tem caído. No mês de maio essa redução foi em torno de 40%, com relação ao mês de abril. E isso aconteceu graças ao nosso trabalho constante na Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, na contratação de mais neonatologistas, na melhoria do centro obstétrico e na criação de mais leitos de UTI", afirma Francisco Macêdo, que também é médico.

Segundo o diretor-geral da maternidade, dez novos leitos de UTI neonatal serão instalados na MDER até a próxima segunda-feira (29) - aumentando de 20 para 30 leitos.

O gestor argumenta, ainda, que muitos dos óbitos registrados este ano na maternidade foram de bebês considerados "inviáveis", ou seja, que possuem problemas de saúde que tornam sua sobrevivência praticamente impossível. É o caso dos bebês anencéfalos, dos que apresentam cardiopatias, más formações congênitas ou que nascem com menos de 500 gramas.

"Tem que se considerar nessa estatística que também há os bebês inviáveis, que são aqueles que não têm nenhuma chance de vida, mas que nós temos a obrigação de receber e tratar, dando o suporte até o final. Mas estamos trabalhando constantemente para melhorar essa situação, e na semana que vem vamos entregar dez novos leitos aqui na Evangelina Rosa", salienta Francisco Macêdo.

Por: Cícero Portela
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