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Homens que romperam vínculos familiares são os mais atendidos no Centro POP

No ano passado, o Centro POP registrou que 491 pessoas izeram uso dos serviços prestados pelo órgão, dos quais 90% deles eram homens

22/08/2017 07:55

Dados do Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP) revelam que os moradores de rua de Teresina são em sua maioria dependentes químicos do sexo masculino, que romperam com seus vínculos familiares. No ano passado, o Centro POP - que oferece serviços gratuitos a esta população - atendeu 491 pessoas, dos quais 90% eram homens adultos, o que corresponde a 441 desabrigados. 

 Moradores estão suscetíveis à violência que, muitas vezes, acontece entre eles mesmos e há casos que chegam até o óbito (Foto: Arquivo O Dia)

Contudo, segundo a coordenadora do Centro POP, Carmem Célia, é difícil dizer com exatidão quantos desabrigados existem hoje em Teresina, pois é uma situação muito volátil. E para ajudar esses moradores, o Centro POP conta com uma equipe composta por gerente, coordenadoria, assistentes sociais, psicólogos, educadores e agentes de proteção social, que trabalham para atender de forma humanizada e universalizada os moradores de rua. Além disso, eles também os ajudam a tirar documentos de identificação, dão encaminhamento a Unidades Básicas de Saúde e permitem que eles façam sua higiene pessoal, com a doação de roupas também. 

“Aqui, eles também tomam banho, guardam volumes, oferecemos roupas. Damos apoio no sentido de eles terem acesso a outras políticas públicas, de conseguirem ter acesso aos direitos deles. A alimentação é através do restaurante popular São José, que oferta 50 refeições por dia no Mercado Central. Também oferecemos, três vezes por semana, um lanche. E ainda fazemos os encaminhamos para a Casa do Caminho, que é onde eles jantam e dormem e saem de manhã cedo, depois do café”, explica o gerente do Centro POP, Valdir da Silva. 

Vulnerabilidade 

Carmem Célia destaca ainda que a violência é um dos principais riscos que os moradores de rua enfrentam. De acordo com ela, o problema é causado entre os próprios desabrigados. “Na rua, as pessoas estão em situação de vulnerabilidade social e têm toda uma falta de proteção; a qualquer momento você pode sofrer uma violência e até vir a ser assassinado. Acontece casos de morte por violência entre eles mesmo. Aqui em Teresina, a maioria da violência contra os moradores de rua são entre eles mesmos, por questão de brigas, drogas, rixas”, explica. 

Segundo a coordenadora, as mulheres são mais vulneráveis à violência, principalmente à violência sexual. Por conta disso, o Centro POP também oferece serviço de consultório na rua, com enfermeiros e assistentes sociais fazendo atendimento, onde elas podem recorrer e denunciar a violência. Em casos assim, as mulheres são encaminhadas para serviços especializados.

Não consigo mais ficar em uma casa, diz homem que é morador de rua há 10 anos 

Martin Coronel tem 34 anos, é argentino e se tornou morador de rua há 10 anos, quando chegou em Teresina. Ele airma que, depois de uma década, se pudesse escolher entre ter uma vida comum, com um lar e uma família, e continuar na rua, ele permaneceria na rua, pois não consegue mais viver em uma casa. 
“Depois que você se acostuma, é muito difícil sair. Ainda que eu quisesse uma vida normal, não consigo, já me acostumei com essa vida. Já tentei duas ou três vezes morar numa casa, viver como qualquer outra pessoa, mas não consegui. Não consigo mais ficar em uma casa, volto para rua de novo”, diz ele. 
O argentino conta que veio para o Brasil porque tinha vontade de conhecer o país e garante não ter conflito com a família, que mora na Argentina. Ele saiu de casa por vontade própria e comenta que morar na rua começou com uma brincadeira assim que chegou em Teresina. 
“Comecei como brincadeira, fiquei um dia, dois dias, depois me acostumei. Queria conhecer o Brasil, mas depois ficou complicada a minha vida, porque comecei a fazer coisa que antes eu não fazia, comecei a viver de um jeito que eu não vivia. E é muito difícil voltar para uma vida normal. Acho que vou ficar na rua até morrer. Tem dia que me sinto mal, tem dia que não. Às vezes, penso que seria bom ter uma vida, ser como qualquer outra pessoa, ter um quarto, uma cama, mas não consigo mais viver assim”, explica. 
Desafios 
Para Martin, o maior desafio que os desabrigados enfrentam é dormir tranquilo à noite. Segundo ele, além de não ter um local confortável e fixo para dormir, é preciso sempre estar atento, pois é muito perigoso e eles correm risco de violência. O argentino enfatiza que a fome é a companheira nos dias em que é difícil encontrar alguém para ajudá-los. Os domingos e feriados são sempre os dias mais longos, pois a quantidade de pessoas circulando no Centro reduz consideravelmente e eles passam muita fome. 
Martin conta ainda que, como se não bastasse todas as dificuldades de morar na rua, os desabrigados ainda têm que lidar com o preconceito das pessoas. “A população nos exclui quase o tempo todo, emprego também é muito difícil, já nos olham de outra forma. Às vezes, a gente vai comprar alguma coisa e elas já pensam que estamos indo pedir, ou ficam com medo. Mas elas não precisam ser assim, se pudesse dizer algo a elas, diria para não terem preconceitos, porque ser morador de rua é também um modo de vida”, enfatiza.
Edição: Virgiane Passos
Por: Karoll Oliveira
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