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Grupo de pais de alunos censura campanha pela diversidade em escola da capital

Mãe considera que postura dos colegas é "preconceituosa", sendo a principal causa para proliferação de casos de bullying e até de suicídio entre as crianças e adolescentes.

31/08/2017 09:39

Um grupo de pais de alunos do colégio CEV encaminhou uma notificação extrajudicial à direção da escola, na qual se queixam de uma campanha em favor da diversidade sexual e de gêneros que foi realizada dentro de uma das unidades do colégio, localizada na Avenida Presidente Kennedy.

Conforme o documento, nos dias 21 e 22 de agosto a escola realizou, com a participação de alunos e de funcionários, a divulgação da 5ª Gincana Cultural CEV, cujo tema deste ano é "Sociedade, igualdade de direitos e respeito às diferenças", que terá o intuito de promover não apenas a diversidade sexual, mas também o respeito às diferenças raciais e ao pluralismo de gêneros.

Houve distribuição de banners, exposição de cartazes e decoração da escola com a temática da diversidade.

Na notificação, o grupo de pais afirma expressamente que não concorda com o que classificam como "ideologia de gênero". O documento adverte os professores do CEV para que eles não apresentem aos alunos informações relacionadas a esta questão, bem como ao "comportamento sexual" e a assuntos como masturbação, prostituição, "entre outros temas libidinosos". 

Para sustentar seu apelo aos funcionários da escola, o grupo de pais cita artigos do Código Civil e do Código Penal brasileiros, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), da Constituição Federal e até da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), da qual o Brasil é signatário.

"[...] valhamo-nos (sic) do presente instrumento para informar respeitosamente à V. Sª. nosso direito legal de educar nossos filhos no que concerne à temática supramencionada. O Código Civil Brasileiro determina que o indivíduo só adquire a capacidade civil plena ao completar 18 anos, ou seja, só poderá praticar todos os atos da vida em sociedade a partir dessa idade", salienta um trecho da notificação extrajudicial.

O texto começou a circular nas redes sociais e nos aplicativos de mensagens instantâneas nesta quinta-feira, porém, com o espaço para as assinaturas dos pais em branco.

Além do corpo docente, o alerta também se estende aos demais funcionários e prestadores de serviço do CEV.

O texto usa, equivocadamente, os termos "homossexualismo", "bissexualismo" e "transsexualismo" para se referir às orientações sexuais e de gênero. O correto seria "homossexualidade", "bissexualidade" e "transsexualidade", uma vez que o sufixo "ismo" é empregado para designar doenças, o que não é o caso.

Ao final da notificação, o grupo de pais ainda faz uma ameaça aos funcionários da escola, afirmando que o objetivo do documento é permitir que todos os envolvidos "possam se proteger de políticas públicas e materiais didáticos ilegais e abusivos, deixando bem esclarecido que a responsabilidade civil e criminal é pessoal, ou seja, todas as pessoas que participarem ou livremente concorrerem, de alguma forma, para a prática ilícita sofrem as devidas punições legais."

Campanha da escola também conta com o apoio de outros pais

Além do grupo que reprovou a iniciativa da escola, vários outros pais de alunos manifestaram apoio à campanha realizada pelo CEV, e criticaram a notificação enviada à escola.

A jornalista Cristiana Melo, por exemplo, considera que o debate proposto pelo CEV é essencial para a formação social e psicológica dos estudantes. "Somos nós, os pais, que temos a responsabilidade de fazer com que as crianças entendam que todos devem ser respeitados e que as limitações e diferenças devem ser aceitas, mas a escola tem papel fundamental no processo de inclusão. Vamos deixar de ser ignorantes, pelo amor de Deus!!! Parabéns #cevcolegio pela iniciativa. São estas discussões que fazem a nossa sociedade evoluir!", postou Cristiana numa rede social.

Segundo Cristiana, os grupos de pais de alunos do CEV no aplicativo Whatsapp transformaram-se em verdadeiros "campos de batalha", e algumas pessoas chegaram a "invocar a Bíblia" para condenar a campanha que está sendo realizada pelo colégio em favor da diversidade sexual e das diferenças raciais.

A jornalista acredita que essa postura de parte dos pais de alunos caracteriza-se como "preconceituosa", sendo a principal causa para a proliferação de casos de bullying e até de suicídio - dois dos problemas mais graves enfrentados pelos adolescentes na contemporaneidade. 

"Em que mundo estas pessoas vivem? Estes são os mesmos pais que vão à escola assistir às palestras de prevenção ao suicídio e que pedem programas para o fim do bullying? Como educar crianças que saberão respeitar as diferenças sem permitir que o assunto seja abordado? Como poderemos ter uma sociedade livre do racismo e das discriminações aos gays sem que eles sejam “incluídos”? Quando veremos os filhos dos nossos amigos que são portadores de síndrome de down ou estão dentro do espectro autista participando da vida escolar, como qualquer outra criança, aceitos pelos colegas?", questiona Cristiana Melo.

CEV defende inclusão, combate a desigualdade e proteção dos direitos

Num banner de divulgação da sua 5ª Gincana Cultural, a escola explica o que motivou a adoção da temática de defesa da diversidade sexual e respeito às diferenças raciais.

"Os últimos séculos vêm sendo marcados pela busca dos grupos sociais por igualdade e respeito. Os princípios de igualdade devem ser cada vez mais recorrentes, sendo discutidos de acordo com suas particularidades e desconstruindo preconceitos. É necessário que haja modificações na conjuntura da atual sociedade, desenvolvendo práticas diferentes que favoreçam a inclusão, combatam a desigualdade e garantam uma ampla defesa dos direitos", sustenta a escola.

Em contato com a reportagem, a assessoria de imprensa da escola informou que, até o momento, não recebeu qualquer notificação assinada por pais de alunos.

"A escola está trabalhando a temática de respeito às diferenças. Este é o tema máximo. Envolve a questão racial, envolve a questão sócio-econômica, envolve a questão religiosa e também a questão de gênero. No início, alguns pais tiveram dúvidas em relação a essa campanha. Eles vieram até a escola, a escola esclareceu as dúvidas, mas até agora a escola não recebeu qualquer notificação oficial", informou a assessoria.

O portal O DIA também tentou contato com o ex-deputado federal Nazareno Fonteles, diretor pedagógico do Grupo Educacional CEV, mas as ligações não foram atendidas até a conclusão da matéria.

Por: Cícero Portela
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