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Ouro olímpico do Brasil no judô atende às preces da Cidade de Deus

Na violenta e miserável Cidade de Deus, a família e os amigos da heroína brasileira do judô, Rafaela Silva, consideram sua medalha de ouro um prêmio para todos eles.

10/08/2016 17:08

A judoca brasileira Rafaela Silva comemora vitória do ouro, nos Jogos Olímpicos do Rio, no dia 8 de agosto de 2016

Na violenta e miserável Cidade de Deus, a família e os amigos da heroína brasileira do judô, Rafaela Silva, consideram sua medalha de ouro um prêmio para todos eles.

Um pequeno grupo se reuniu na porta de sua casa, um local simples, sem a fachada pintada e com chão de terra. Revezando-se para ler os jornais de terça-feira ou apenas conversando, um tema que dominava a situação.

"Ela ganhou essa medalha por nós. Sempre ganhou suas batalhas e, de verdade, merecia essa vitória", declarou seu vizinho Marco Vinícius, de 23 anos.

Rafaela Silva, de 24 anos, representa uma grande história de sucesso para esta enorme favela que Fernando Meirelles apresentou ao mundo no filme "Cidade de Deus" (2002).

A hoje medalhista olímpica cresceu aprendendo a sobreviver ao fogo cruzado entre as facções armadas do tráfico e a brutalidade policial.

Uma honra dupla

Quando sua carreira ameaçou desandar, após a sua desclassificação nos Jogos Olímpicos de Londres-2012, ela passou por cima da depressão e da violência racial de muitos brasileiros.

Hoje, é a melhor judoca da categoria até 57 quilos, após sua vitória de segunda-feira. É a campeã da Cidade de Deus. A favela passou a ser agora a "Cidade da Deusa", como tuitou a atriz Regina Casé em sua homenagem.

Vinícius diz que Rafaela pôs seus críticos no lugar.

"Essa medalha é uma honra dupla", afirmou. "Hoje a suposta 'vergonha da família' mostrou que é uma pessoa que pode dar o exemplo e deixar todos nós orgulhosos e querendo seguir seu caminho", acrescentou.

No meio da rua, o pai da judoca, Luiz Carlos do Rosário Silva, reflete tentando dar um sentido a tudo o que aconteceu.

"Isso é muito, não? Em 2012 a chamaram de 'macaca'. Mas em 2013 se tornou a primeira brasileira campeã do mundo. Agora ganhou a medalha olímpica, a medalha de campeã", comentou esse homem de 53 anos que vestia uma camisa da seleção brasileira de futebol e um boné com o nome da filha.

Exemplo a ser seguido

A medalha de ouro e o protagonismo de Rafaela nos meios de comunicação não ajudaram a aliviar a dura vida dos moradores da Cidade de Deus.

Perto de onde sua família agradecia os cumprimentos dos admiradores, estava um traficante armado. Por ali, o esgoto corre a céu aberto, como em muitas comunidades do Rio, onde milhares de pessoas ainda precisam conviver com sistemas primitivos de tratamento de dejetos.

Na terça-feira à noite, um ônibus que levava jornalistas que cobrem os Jogos Olímpicos foi apedrejado quando passava perto da favela. A polícia está investigando o incidente.

Sair dessa vida é uma conquista em si para Rafaela Silva. Derrotar seus próprios demônios após perder em Londres foi outro ainda maior.

Ela ficou tão devastada moralmente que passou "três meses sem judô", relembrou seu pai. "Passava o tempo todo em casa, deitada", relatou.

"Não foi a derrota que a afetou, foi o racismo. Foram os comentários racistas que as pessoas escreveram na internet que a machucaram", explicou. "Não queria usar o computador por medo de ver coisas horríveis escritas sobre ela", acrescentou.

Outro morador da Cidade de Deus, Atiliane Caetano Vicente, de 32 anos, disse que o sucesso de Rafaela irá trazer mudanças profundas.

"Já mudou as coisas, especialmente para as crianças, que podem se inspirar na vitória dela", apontou. "É maravilhoso o que ela fez, o exemplo que dá com sua história".

Fonte: Esporte interativo
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