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Mourinho, Guardiola, Ronaldinho, 7 a 1 e resenhas na China: as histórias de Ramires, o ajudante de pedreiro que chegou ao topo

Em entrevista exclusiva à Goal Brasil, meio-campista explica saída do Chelsea e relembra alegrias e tristezas na carreira e na vida

07/12/2016 09:27

Nascido na Barra do Piraí, no Rio de Janeiro, Ramires foi ajudante de pedreiro com seu tio durante a adolescência e rodou por times amadores até ganhar uma chance no modesto Joinville. No caminho, a dor pela perda de sua avó Tereza, que o criou e, segundo as palavras do próprio volante, fez de tudo por ele. A ausência é sentida até hoje. "Queria muito que ela pudesse ver o que eu consegui na vida, quem eu me tornei. Tenho certeza de que iria se orgulhar muito", conta o meio-campista, em entrevista exclusiva à Goal Brasil.

As dificuldades, porém, não impediram Ramires de depois se destacar no Cruzeiro, antes de ir brilhar na Europa e ganhar espaço na Seleção Brasileira.

Dona Tereza, com toda a certeza, está muito orgulhosa.

Como não poderia ser diferente, Ramires é daqueles que tem muitas histórias para contar, e em entrevista exclusiva à Goal Brasil, o volante falou sobre tudo: vida pessoal, alegrias e tristezas na carreira, o novo momento na China e a saída do Chelsea.

Confira o bate-papo com Ramires:

Como está a vida na China e esse novo momento na sua carreira? O choque cultural é muito grande? Já viveu alguma situação curiosa por aí?

Quando você vai viver em um lugar diferente fica com receio de não se adaptar, da família sentir muito as diferenças, mas graças a Deus isso não aconteceu nessa minha ida para a China. Consegui uma escola bilíngue para o meu filho mais velho rapidamente, o clube me disponibilizou um tradutor para me acompanhar e não estou encontrando muitas  dificuldades. Sempre me perguntam em relação a comida, se eu tenho que comer cachorro, escorpião, mas graças a Deus ainda não precisamos (risos). Aqui você encontra todo tipo de comida e no clube o cardápio é tradicional, não tem nada de muito diferente do que eu já estava habituado. 

Você tinha chances de defender a Seleção e é ídolo do Chelsea, além de ter bola para seguir em alto nível na Europa por mais tempo. Por que a decisão de ir para o futebol chinês?

Vejo muitas pessoas falando que foi apenas pelo dinheiro que eu vim para China, mas isso não é verdade. Se você observar a situação que eu vivia no Chelsea na época da transferência vai ver que eu estava sendo a última opção do Hiddink na minha posição e isso estava me frustrando muito. Por mais que eu me esforçasse nos treinos a situação só estava piorando e nesse momento chegou o interesse do clube chinês.

O Jiangsu me apresentou um projeto a longo prazo onde eu era referência, me ofereceu tudo o que pode se imaginar de melhor e aí decidi em conjunto  junto com meus empresários e familiares que essa seria a melhor decisão. A questão do dinheiro pesou no momento em que eu coloquei na balança que eu já tenho 29 anos e que uma oportunidade irrecusável como essa poderia não aparecer mais. Mas, a maneira como as coisas estavam acontecendo no Chelsea foi determinante.

Em relação a Seleção Brasileira, não acho que abri mão de defender o meu país, tanto é que alguns brasileiros que estão jogando aqui são convocados constantemente. Acho que isso depende mais da avaliação do treinador da seleção do que com o centro onde você atua. Sempre foi um prazer e um orgulho enorme para mim defender o Brasil e eu ainda tenho essa vontade de voltar a ser chamado. Me vejo em totais condições de ajudar e vou procurar seguir fazendo um bom trabalho para que isso aconteça. 

Você pode bater no peito e falar que representou o Brasil em duas Copas do Mundo, coisa para poucos jogadores. Como é a emoção de representar o seu país em uma Copa? Você achava isso possível quando ainda era um garoto e estava no Joinville?

Não existem palavras que possam descrever a sensação de representar o Brasil em uma Copa do Mundo. É algo que só quem viveu sabe do que se trata. Pensava em ser um grande jogador um dia, mas isso foi além de qualquer expectativa que eu tinha lá em Barra do Piraí. Me sinto um vitorioso por tudo o que consegui conquistar na carreira. Ter uma história dentro da seleção brasileira é algo que eu vou me orgulhar enquanto eu viver.

Na Copa de 2010, o Brasil chegou nas quartas de final e foi eliminado sem praticar um futebol vistoso. Na última Copa, o time também decepcionou e sofreu o 7 a 1. Como foi participar desses momentos? O que passou pela sua cabeça?

Foi difícil. Em 2010 eu vinha fazendo uma grande competição, mas acabei ficando de fora do jogo contra a Holanda, quando muitos até cogitavam que eu seria titular. Lembro que isso foi muito frustrante, que eu fiquei agoniado vendo a luta dos meus companheiros sem poder ajudar. Não merecíamos perder aquele jogo. A derrota, da maneira que aconteceu, foi uma grande fatalidade.  

Já a eliminação do 2014 foi mais difícil de digerir por toda a expectativa que o nosso povo tinha de ser campeão em casa. O país respirava a Copa do Mundo e ser eliminado daquela maneira foi muito triste. Eu comecei o jogo no banco de reservas e lembro que a Alemanha fazia os gols e a gente olhava um para o outro sem entender nem acreditar o que estava acontecendo. Vai ser eternamente difícil para qualquer um explicar o que houve. Entrei no segundo tempo, mas sabia que naquele momento era difícil reverter. Não faltou entrega de ninguém. Todo mundo queria muito vencer, mas não deu certo. Foi o pior momento que vivi como profissional, sem dúvida. Se pudesse voltar no tempo para mudar algo na minha carreira, escolheria esse momento.  

Você fez história no Chelsea e ganhou vários títulos por lá. Qual o seu momento mais especial no clube e quem foi seu melhor parceiro nos Blues?

Não posso negar que o momento mais especial para mim foi quando fiz o gol de cobertura sobre o Valdés, no Cam Nou, pelas semis da Champions. A importância daquele momento foi tão grande que as pessoas me pedem para falar sobre o gol e não perguntam do título. Foi algo mágico, que ficou eternizado na minha memória e na lembrança de todo torcedor do Chelsea. Tive muitos amigos no Chelsea, é difícil falar só de um ou de outro. Era um grupo muito bom de trabalhar e tenho saudades de todos eles, principalmente do Willian, do Kenedy e do Diego Costa, que eram os que eu tinha mais afinidade fora de campo recentemente. 

Conta alguma resenha, uma história curiosa dos seus tempos de Chelsea pra gente.

O Kenedy gostava de fazer apostas comigo, mas ele era pato novo e sempre perdia (risos). Na última, a gente estava na academia do CT eu eu falei pra ele colocar uma bola na cabeça que eu ia acertar ela com um chute de longe. Quem acertasse primeiro levava um trocado. Não deu outra. Dei um chute certeiro e ele não acreditou. Fizemos até um vídeo que acabou viralizando (risos). Estou com saudade dele aumentando a minha caixinha de final de ano (risos). 

Você trabalhou com José Mourinho no Chelsea. Como é o trabalho com ele no dia a dia? O que ele tem de diferente em relação aos outros treinadores? Ele é diferente com os jogadores nos bastidores do que mostra nas câmeras? Ele faz um personagem pra mídia?

Eu sempre me dei muito bem com o Mourinho, tanto é que as coisas só complicaram para mim no clube quando ele saiu. Lembro que ele queria contar comigo desde que estava no Real Madrid e foi um prazer trabalharmos juntos. O currículo do Mourinho fala por si só. Ele conquistou muitos títulos importantes isso prova que ele é um dos melhores no que faz. Acho que tem muito folclore em torno da pessoa dele. Conosco sempre foi um cara tranquilo, mas dentro de campo e nos treinamentos ele cobrava muito, o que não vejo com um problema. Foi com essa maneira de trabalhar que ele se tornou o que é.

Na última temporada, o Chelsea não foi bem com o Mourinho e a imprensa inglesa noticiou que existiam problemas no vestiário do clube. Isso procede? Por que as coisas não funcionaram como antes?

Não presenciei nenhum problema. O futebol tem disso. Fomos campeões na temporada anterior, mas na outra as coisas acabaram não dando certo. É difícil de explicar. Era o mesmo time praticamente. 

Qual o melhor técnico e o melhor jogador com quem você já jogou? Quais os melhores que você já enfrentou?

Tive o prazer de trabalhar com grandes treinadores durante minha carreira, mas o que eu mais me identifiquei foi o André Villas-Boas. Nos dávamos muito bem e foi muito bom trabalhar com ele, é um cara de capacidade e inteligência enormes. Dentro de campo, tive o prazer de jogar com o Ronaldinho Gaúcho na Seleção. Ele fazia coisas impressionantes e foi um dos melhores que vi. 

(Fotos: Getty Images)

Qual o melhor jogador e o melhor técnico do mundo atualmente?

Atualmente admiro o trabalho do Guardiola. Acho que ele mudou a maneira de jogar futebol e deve ser valorizado por isso. Pode ser meio clichê, mas acho que o Messi e o Cristiano Ronaldo são realmente os melhores na atualidade. Eles têm estilos diferentes, mas ambos conseguem resolver os jogos para suas equipes com a mesma eficiência. 

Você sonha em voltar para o Brasil? Tem algum clube especial?

Todo mundo sabe que eu tenho um carinho enorme pelo Joinville e pelo Cruzeiro. Espero ter a chance de jogar por esses dois clubes antes de encerrar a minha carreira. 

O que você fazia antes de ser jogador de futebol, como era sua vida antes do sucesso?

Nasci em Barra do Piraí, lugar com o qual tenho uma enorme identificação e que gosto de estar até hoje. Trabalhava como ajudante de pedreiro com um tio meu e jogava nos times amadores da cidade até o Joinville me ver e me convidar para fazer um teste. Acabei ficando e iniciando a minha carreira. 

Todos nós passamos por um momento difícil, que depois temos o orgulho de ter superado e ver onde chegamos. Qual o momento mais difícil da sua vida?

O momento mais difícil para mim foi quando perdi a minha avó Tereza. Fui criado por ela e ela fazia tudo, dentro das suas condições, para me ajudar. Infelizmente ela acabou tendo um derrame, por causa da idade avançada, e eu cuidei dela até ela falecer. Queria muito que ela pudesse ver o que eu consegui na vida, quem eu me tornei. Tenho certeza de que iria se orgulhar muito. 

Fonte: Esporte interativo
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