Se você gosta de futebol, alguma vez na sua vida já pensou em ser jogador e defender a Seleção Brasileira. Disputar partidas de Champions League, a maior competição de clubes do mundo, também faz parte do sonho de milhões de jovens em todo o planeta.
Imagina, então, quando você acaba de fazer 20 e poucos anos, é jogador profissional e recebe a chance de disputar as principais competições europeias de clubes? Foi com essa expectativa que Maurinho deixou o Metropolitano, de Santa Catarina, para tentar a sorte na distante Bielorrússia.
Você pode até não conhecer o clube, um dos vários “DÃnamos†do Leste Europeu. Só que o Minsk é uma equipe de tradição, a única da Bielorrússia a ter conquistado o difÃcil campeonato soviético – no longÃnquo ano de 1982. Após a dissolução da União Soviética, o Minsk fez o óbvio ao garantir a supremacia do campeonato bielorrusso: conquistou as cinco primeiras edições e fez valer o peso de sua camisa.
Na Bielorrússia, o sonho de Maurinho virou pesadelo (Foto: Arquivo Pessoal)Só que a chegada do BATE Borisov acabou com essa supremacia. E na busca por melhorar o elenco, dificultar a vida do rival e disputar Champions ou Europa League, o Minsk contratou Maurinho. Em um primeiro momento, o atacante realizava um de seus objetivos. “Eu sempre quis jogar fora do paÃsâ€, conta para a Goal Brasil. Só que o sonho rapidamente se transformou em um grande pesadelo.
O desinteresse do clube em sua chegada, os maus tratos e dificuldades de estar em um lugar muito diferente foram a carta de apresentação: “Cheguei lá, fui muito maltratado. Eu morava em um hotel, fiquei cinco dias em um hotel sem ninguém me buscar para treinar. Eu tinha um tradutor e o cara demorou cinco dias para me buscar, eu não sabia o horário de nada. Fiquei largado, na mão dos caras. Nem vesti a camisa do clubeâ€, conta Maurinho, que para piorar o cenário foi sozinho. Não tinha amigos, não tinha famÃlia, não tinha empresário.
Não tinha nem mesmo uma chance.
O treinador não gostava dele, que nem era aproveitado. A solução encontrada foi buscar uma chance em outro paÃs. Maurinho fez testes e passou para um clube da terceira divisão polonesa. Mas o DÃnamo Minsk preferiu não o liberar para empréstimo. Com isso, seguia o drama. Sem conta no banco, e nem como enviar os salários para o Brasil, o atleta dormia com os vencimentos sob o travesseiro: “Eles me pagavam só em dinheiro, e eu ficava no hotel com 60 mil dólares de baixo do travesseiroâ€, revela. “Foi uma coisa de louco. Fiquei com medo de ficar perdido, de pegarem meu passaporteâ€.
Durante os treinos do Minsk, um rápido momento de descontração... mas que não terminou bem (Foto: Arquivo Pessoal)Mas nada é tão ruim que não possa piorar, diz o ditado. E se era impossÃvel ser feliz, Maurinho era proibido até mesmo de compartilhar um rápido momento de risadas com os companheiros de time. Hoje, a situação é lembrada até com uma certa dose de humor pelo brasileiro.
“Eu tomei uma multa por rir, acredita nisso? Antes de começar o treino, a gente dava duas voltas no campo. Eu fiz amizade com um bielorrusso, o nome dele era Sergei. Era aniversário dele, e pediram para eu parabenizar ele: ‘pozdravleniya’. Eu falei certinho, e todo mundo começou a dar risada. Eu me alonguei um pouco na risada, o segundo treinador me parou, chamou o treinador e falou assim: ‘multa de 2 mil dólares para o Maurinho porque ele tá rindo’â€.
O sonho de escutar, dentro dos gramados, a música da Champions League passou longe de virar realidade: “Nem consegui ouvirâ€, lamenta o atacante. Maurinho voltou a buscar outro clube, desta vez na Alemanha, mas o Minsk não o liberou para empréstimo. Foi a gota d’água. Desesperado, conseguiu entrar em contato com um empresário que o ajudou a voltar para o Brasil. O destino seria o clube de coração de seus pais: o Internacional.
De volta para casa, a felicidade era indescritÃvel por voltar a ter chances de seguir o sonho de criança. Ainda jogou pelo XV de Indaial, de Santa Catarina, ABC, Criciúma e Oeste antes de receber mais uma chance de deixar o futebol brasileiro. O destino não seria a Europa, mas o atacante partiu para cima do medo de passar por outros traumas e aceitou o desafio. Agora casado e com pessoas cuidando de sua carreira, a solidão já não seria a mesma.
E se na Europa faltou carinho, na Coreia do Sul o brasileiro foi recebido como Ãdolo do Jeonnam Dragons. Por lá, Maurinho se sente uma espécie de ‘Neymar coreano’.
Na Coreia do Sul, recepção tão quente quanto o tempero da comida (Foto: Arquivo Pessoal)“O pessoal me acolheu, os coreanos são assim. Eles gostam muito de brasileiros. É um povo acolhedor, o jogador brasileiro já é visto como Ãdolo. Ganhei muita comida. O presente que eles dão para o jogador é comida (risos), bala, camiseta. Ganhei muita roupa deles aqui. Eles são muito carinhososâ€, disse.
O jogador ainda sonha em defender a Seleção, e não descarta voltar ao Brasil... mas também mira a China (Foto: Arquivo Pessoal) Uma lesão atrapalhou a sequência na Coreia, mas enquanto isso o time seguiu surpreendendo (Foto: Arquivo Pessoal)A principal dificuldade, além de uma lesão, é a quantidade de pimenta nas refeições. Mas isso ele, ao contrário de sua esposa, tira de letra. As aulas de inglês, lÃngua que muitos sul-coreanos dominam, também são vistas com grande importância.
Dentro de campo, o Jeonnam chutou para fora as chances de rebaixamento e briga por uma vaga na Champions League da Ãsia.  E enquanto ainda sonha em defender a Seleção, os primeiros objetivos estão estipulados: fazer um bom papel e buscar um espaço no futebol da China, ou aproveitar toda a hospitalidade e vida nova na Coreia. Após tantas desventuras, enfim veio a tranquilidade e estrutura (profissional e emocional) para manter vivo os seus sonhos.