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Bruno Gagliasso vai ao topo em "˜Dupla Identidade"™

Muito bem na estreia, o ator fez dos seus encantadores olhos azuis dois espelhos embaçados.

20/09/2014 12:30

No papel do serial killer ambicioso Eduardo, Bruno Gagliasso se alterna entre o charme e a perversidade, e acerta ao estabelecer uma rara cumplicidade com o público (Reprodução)

O serial killer costuma ser o tipo de personagem dos sonhos de qualquer autor: rico em composição, imprevisível e, com sorte, sedutor o suficiente para assustar e conquistar a plateia ao mesmo tempo. Não é uma figura frequente na nossa teledramaturgia, muito menos no cinema, uma vez que sempre foi associado às histórias policiais americanas �€“ mas jamais vamos esquecer o Donato que Miguel Falabella interpretou em Noivas de Copacabana, minissérie que o grande Dias Gomes escreveu em 1992.

Com seu Eduardo Borges que apareceu pela primeira vez na noite desta sexta (19) em Dupla Identidade (Globo, sextas, 23h30), Gagliasso, ator dos mais dedicados de sua geração, conseguiu inscrever na TV brasileira o tipo que mata por matar a granel. Muito bem na estreia, o ator fez dos seus encantadores olhos azuis dois espelhos embaçados pela maldade. Esteve ótimo nas cenas e se é verdade que ele teve de lutar pelo papel, como andou contando as entrevistas que precederam a estreia, fez valer a escolha da autora Glória Perez e dos diretores Mauro Mendonça Filho e René Sampaio.

Com boa parte dos cacoetes mais batidos dos autores policiais americanos, cujos criadores exploram as mentes perturbadas desde antes de Conan Doyle e Agatha Christie, Dupla Identidade fez um belo primeiro episódio. Câmera viva na medida �€“ nada daquele balanço vertiginoso e sem sentido andou sendo usado por aí �€“, fotografia perfeita para mostrar um Rio de Janeiro além do �€œpurgatório da beleza e do caos�€, trilha sonora vigorosa de Andreas Kisser, do Sepultura, e uma abertura matadora, ainda que com �€œleve�€inspiração em Homeland e American Horror Story.

Em meio à onda de assassinatos, Dias (Marcello Novaes) espera ansiosamente a indicação para secretário de segurança, o que dá um tempero especial ao seriado, Já a Vera de Luana Piovani precisa de algum remédio anti-mononia, para poder burlar o tipo "fria e sexy" que é clichê na literatura policial (Divulgação)

Em meio à onda de assassinatos, Dias (Marcello Novaes) espera ansiosamente a indicação para secretário de segurança, o que dá um tempero especial ao seriado. Já a �€œcaçadora de mentes�€ Vera de Luana Piovani precisa de algum veneno antimonotonia, para burlar o tipo �€œfria, sexy e determinada�€, que é clichê na literatura policial (Divulgação)

Mas se o primeiro dos 13 episódios previstos deixou algum porém no ar, pode-se dizer que é a personagem Vera, de Luana Piovani. A �€œcaçadora de mentes�€ que, em geral, mede forças com sua �€œcaça�€ nunca está numa posição confortável perante o espectador. Vira e mexe é enganada, persegue pistas falsas e, não raro, tenta passar a imagem de concentrada, do tipo �€œmissão dada é missão cumprida�€. Há várias policiais como Vera nos CSI da vida.

Acontece que Vera, por enquanto, é fria demais, certinha além da conta. Mesmo com a beleza exuberante de Luana Piovani, não tem charme. E, pior, é ela que narra a série, a partir dos valiosos conhecimentos que obteve num tal estágio no FBI americano.

Não é à toa que, em meio aos tantos elogios que a série recebeu no Twitter durante a exibição, o nome de Luana tenha sido enxovalhado �€“ muito mais do que a atriz merecia. O público tem uma implicância excessiva com ela. De  minha parte, confesso que prefiro vê-la em comédias, mas jamais se pode criticar um ator por arriscar algo novo, fora do que se espera dele.

E, sejamos justos, mais exposta do que o próprio protagonista Bruno, Luana segurou com afinco a sua Vera. Ela consegue imprimir em cena a sensualidade quase fria da investigadora clássica das histórias policiais. �‰ dura porque é determinada, treinada pelos bambambãs do combate ao crime. Mas talvez falte à personagem �€“ ou ainda virá a aparecer �€“ alguma loucura particular a lhe temperar a personalidade, como uma Carrie Mathison (Claire Danes) de Homeland ou até mesmo uma Clarice Starling  (Josie Foster) de Hannibal. Esperemos.

De um modo geral, a série tem bons personagens, e seria impossível conhecer todos num primeiro episódio. Por falar em arriscar. Marisa Orth ainda deve arrasar como Sylvia Veiga, uma típica ex-mulher-raivosa-de-político-mulherengo, papel moldado por um humor fino misturado com tensão.

A Ray de Débora Falabella é um bom complemento para Bruno, e uma ótima sacada da autora. �‰ uma jovem adulta à beira dos 30 anos, com uma filha pequena e um jeitinho alternativo e um pouco infantil, absolutamente perdida no campo afetivo. Doida para encontrar alguém, conhece um bonitão na praia e se entrega, sem saber que ele é um psicopata. O material de divulgação da série chega a dizer que ela é uma boderline, vocabulário que, na ficção, pode servir para uma criatura carente de algum carinho.

Outro acerto do seriado é o pano de fundo político. Glória Perez provoca com a ideia de que Brasília é um campo agradável para os psicopatas e o próprio Eduardo diz que será presidente da República um dia. Há ainda uma disputa pelo cargo de secretario de segurança, que Dias (Marcello Serrado) almeja, jogo que acaba se misturando com a série de assassinatos. �‰ um recurso já muitas vezes usado nos roteiros americanos, mas não costuma cair mal.

Carente de tudo, Ray (Débora Falabella) conhece um bonitão atencioso e divertido na praia €“ nem passa pela cabeça dela que quando a esmola é muita o santo desconfia (Divulgação)

Como se, dizem, não há crime perfeito na vida real, também não há história policial que consiga explicar o modus operandi de um assassino com verossimilhança a toda prova �€“ em Dupla Identidade não é diferente. A autora optou, por exemplo, em mostrar o mínimo possível de sangue. Assim, o telespectador não consegue entender como Eduardo arrasta suas vítimas e o que faz, de fato, na �€œsessão de tortura�€ citada pela polícia. Da mesma forma, não se sabe qual a motivação do serial killer para cometer os assassinatos e o que une as vítimas �€“ moças jovens e bonitas, por enquanto �€“, o que só faz enfraquecer o personagem. �‰ que a �€œmaldade em estado puro�€, como diz Gagliasso, existe na vida real. Mas na ficção, certas justificativas são essenciais para garantir um bom programa.

Fonte: Veja
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