Portal O Dia - Notícias do Piauí, Teresina, Brasil e mundo

WhatsApp Facebook Twitter Telegram Messenger LinkedIn E-mail Gmail

As férias e as onomatopeias

A rotina é um estampido que incomoda

21/10/2014 07:00

Imagem: Google

Depois de alguns merecidos dias de férias, retorno a repartição hoje. Foram dias feéricos, com direito a levantar um pouquinho mais tarde, a não programar o despertador, a não tomar café apressado e tão cedo, e principalmente, me ajudou a fugir da agitação do cotidiano proletário. 

Com a pausa no trabalho, pude, como um bom velhinho aposentado, desfilar de pijama e de chinelos pantufa pelas as manhãs ociosas de um lar que estranhava minha presença. E as manhãs de quem não precisa necessariamente trabalhar, são janelas que se abrem para o paraíso. 

Aproveitei mesmo cada milímetro da minha ociosidade, porque nas férias, nenhum dia é em vão, nenhum dia é descartado. Fiz o que não se faz quando temos que bater o ponto, quando se tem que bater continência ao chefe. Assisti banalidades na tevê, almocei fora de hora, joguei conversa fora com o porteiro do condomínio em pleno horário comercial, li Cesário Verde calmamente em "manhãs brumosas" de segundas-feiras. 

Até meu happy hour mudei de horário, passou a ser diurno, pus o lanche para período integral, não apressei meu tempo livre, e a noite, só dormia depois das duas da manhã, com a certeza de que no dia seguinte não precisaria madrugar.  

Boa parte de minhas férias foi assim, sombra e água fresca, como o próprio momento sugere, dei até para estudar os sons que amanheciam em minha casa, virei uma espécie de investigador de onomatopeias matinais. Ouvia com encanto o barulho das louças sendo lavadas pela a empregada, como também o balançar da vassoura de piaçava que ela esfregava pela a varanda. 

Em outros dias, acordava mais cedo, tipo nove da manhã, e curtia outros sons, me enternecia com o apito da chaleira fervendo, com o tilintar das xícaras sobre a mesa do café, com o liquidificador triturando a popa de frutas, com a serrinha da faca cortando o pão, e todos esses sons soavam como melopeias em meus ouvidos, inclusive o barulhinho que a minha mulher fazia ao mastigar um cream cracker. 

Há tempos esses sons não me vinham à tona, com certeza estavam emudecidos pela a sonoridade da rotina, e a rotina definitivamente é um estampido que incomoda. E agora que as minhas férias findam, e que os dias normais e sem descobertas voltarão, terei que me readaptar ao alarido do despertador, ao zumbido dos teclados, a balburdia do bater de portas e ao burburinho que se ouve no cotidiano de uma repartição.                     

    

 

Mais sobre: