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Precisamos de coragem

Falemos, seja baixo, alto, gritando... mesmo que seja desgastante. As futuras gerações não podem sofrer por causa da nossa covardia.

14/09/2017 12:38

Não está fácil sobreviver a essa onda de retrocesso social, mental, artístico, político, econômico e humano. É desolador ver os noticiários, irritante ler os comentários em redes sociais e desgastante travar os debates sobre assuntos que até pouco tempo eu julgava terem sido superados.

Obras de arte do século XIX certamente seriam censuradas no Brasil do século XXI. A violência contra as mulheres - perfeitamente punida pela Lei Maria da Penha, sancionada há mais de 10 anos - tem sido frequentemente legitimada pelos “homens da justiça” nos últimos meses.

Dia desses, um apresentador de programa de rádio disse que deveriam jogar um fio energizado e molhado dentro da penitenciária. Ele falou isso ao vivo, sem qualquer constrangimento.

Lembro-me que, há mais de 20 anos, um caso me deixou bastante incomodada. Eu era criança e ouvi os adultos contando que um homem havia dado uma surra de cansanção em uma mulher com transtorno mental porque ela o estaria perturbando. Para quem não conhece, essa planta provoca uma coceira infernal.

Esta semana, em Teresina, ganhou repercussão um caso que me fez lembrar muito esse outro, principalmente pelos argumentos dos defensores do suposto agressor. Um homem teria jogado um balde de tinta em uma senhora. Assim como a vítima do cansanção, esta de agora sofre de transtorno e também causa alguns inconvenientes. A ação do homem, portanto, seria justificável para determinadas pessoas.

É assustador! Voltamos a um tempo em que precisamos defender conceitos básicos como compreensão, respeito às diferenças e aos direitos humanos (tão distorcido esse termo, né?). Isso porque as pessoas estão cada vez mais à vontade para manifestarem suas ideias racistas, homofóbicas e violentas.

Diante desse cenário, tenho me perguntado o que nos resta fazer. Às vezes sinto que a diplomacia com que tentamos tratar as coisas só ajuda os discursos de ódio a conquistarem mais espaço. Eles vão ganhando no grito, enquanto a gente fala baixo e somos cada vez menos ouvidos. Mas, por outro lado, não podemos nos rebaixar ao mesmo nível.

A única saída que enxergo é não calar. Precisamos de coragem, pois o nosso medo é um combustível perfeito para o outro lado. As conquistas sociais que estamos perdendo hoje custaram muito esforço, inclusive a vida, de gente que veio antes de nós. É chegada a hora de fazer nossa parte.

Falemos, seja baixo, alto, gritando... mesmo que seja desgastante, não podemos deixar de contestar aquele parente ou aquele amigo com ideias retrógradas. Se for necessário comprar uma briga, que compremos. As futuras gerações não podem sofrer por causa da nossa covardia. Depende de nós honrar a luta de quem não está mais aqui. Depende de mim e de você garantir um mundo melhor para quem está chegando.

Fonte: Nayara Felizardo
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