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Tsugumi, de Banana Yoshimoto, e a exaltação das boas memórias

Esta é a primeira vez que a autora é traduzida direto do japonês para o português

07/12/2015 09:07

Ler pela primeira vez um autor é pisar em terreno desconhecido com todas as vantagens e as desvantagens que isso possa ter. Para mim, abrir-se ao novo já é um benefício.  Ultimamente, tenho procurado informações sobre literatura japonesa, sobretudo acerca de autores contemporâneos. Por algumas vezes, encontrei a autora Banana Yoshimoto nas listas de indicações e, pela excentricidade do nome, não o esqueci.

Quando a editora Estação Liberdade resolveu lançar o romance mais recente dela, não me contive de curiosidade e felicidade. Além do mais, esta é a primeira vez que a autora é traduzida direto do japonês para o português.

Vamos ao livro! A escrita de Yoshimoto é simples, suave e limpa. Sendo muito fácil para o leitor se agarrar com um livro dela e não conseguir mais largar. Tsugumi, personagem que dá nome à obra, é a protagonista. No entanto, quem narra a história é Maria Shirakawa, prima e pessoa mais próxima a Tsugumi.

Maria vive com a mãe na pousada dos tios, pais de Yoko e Tsugumi, numa cidade litorânea na Península de Izu. Devido a questões familiares, muda-se para Tóquio. Retorna à cidade natal para passar as férias de verão. É nesse momento que se foca a narrativa – já que esse período será um fechamento de ciclo na vida de todas as personagens. Elas irão passar momentos especiais juntas e sabem que, depois daquela temporada, nada mais será como antes.

 Maria nos fala a todo o momento da importância de guardar as boas lembranças, sobre como desejaria congelar alguns situações da vida e revivê-las continuamente. Como no trecho:

 “Nós crescemos vendo inúmeras coisas. E mudamos pouco a pouco. Avançamos conscientes dessas mudanças que se tornam reiteradamente perceptíveis de diversas formas. Mas, se por acaso eu pudesse impedir tais mudanças, manteria aquela noite intocada. Uma noite perfeita, repleta de singela e doce felicidade.” (p.. 120)

Tsugumi, como confessa Banana no posfácio e no epílogo da edição, é um alter-ego, e o amor pelo mar e pela península é fruto dos momentos felizes, quando passava as férias com os pais naquela região. Talvez assim seja mais fácil compreender de onde a escritora tirou inspiração para construir uma personagem tão controversa e rica. Mesmo sobrevivendo durante toda a vida com uma saúde frágil, ela é a personagem mais vital da narrativa. Nela habitam as emoções mais fortes, como a raiva, a rebeldia, a maldade e a bondade.

É inevitável não se apaixonar pela sua autenticidade e sua capacidade de vislumbrar o mundo por meio de mecanismos interpretativos tão próprios. Ela sempre consegue nos surpreender e nos fazer rir em várias passagens. Tsugumi não pode ser contida, nem mesmo pelas restrições físicas. Embora Maria se sinta magoada ou chateada com algumas atitudes da prima, ela termina cedendo e entendendo. Provando que o exercício da alteridade é fácil quando o fazemos por quem tanto amamos.

“A vida é uma encenação, pensei. A palavra “fantasia” também possui uma conotação semelhante, mas, para mim, o termo “encenação” é o que melhor expressa o que sinto sobre a vida. Naquela tarde, em meio à multidão, tive esse instante vertiginoso de epifania. Cada um carrega em seu peito uma profusão de coisas boas e ruins, suportando esse fardo durante a vida. E, apesar de termos de suportar todo esse peso sozinhos, ainda procuramos, na medida do possível, ser amáveis com aqueles que nos são caros”. (p. 43)

Não sei dizer quais sentimentos ela despertou em mim, sei que não consegui sentir raiva por nenhum momento. Senti candura e fascínio. O melhor do livro é sua simplicidade, sem muitas idas e vindas ou intromissões linguísticas em excesso. 

                                                                                 Banana Yoshimoto



Por: Ananda Sampaio

Revisão: Ceiça Souza

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