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Estamos Ficando Mais Desumanos

Crônica

04/01/2017 16:50

ESTAMOS FICANDO MAIS DESUMANOS

Francisco Miguel de Moura, escritor, membro da Academia Piauiense de Letras

Dia 3 do corrente mês e ano, tremi e não por causa do tremor de terra que sacudiu Teresina, vindo do Maranhão. Foi por causa de uma notícia do Jornal Nacional: – “Em 2017 vamos ter, no Brasil, mais fins de semana prolongados do que em 2016, pois quase todos os feriados vão cair em dias de terças e quintas feiras”. Portanto, um chama para os ditos “feriados prolongados”. Não ficam na Capital nem os médicos, restaurantes se fecham, supermercados, tudo. Todo mundo nas praias.

Meu Deus! Tanto que eu pedi um 2017 melhor que o 2016, e vem isto aí! Qual é o aposentado, idoso, que pode sair? Ficam todos em suas casas. No dia primeiro do ano de 2017, mesmo sendo um domingo e também o feriado da Fraternidade Universal, fiz minha caminhada. Escolhi uma rua diferente. Há muito tempo não passava ali de pé. Vi coisas impressionantes, não as mudanças no comércio, não os pontos fechados por causa da crise. Vi piores. Ninguém dá bom dia a ninguém, imagine-se um sonoro “Feliz Ano Novo!” Só se via caras amarradas, ainda bem que poucas. Pelo menos para mim e minha mulher (nós sempre caminhamos juntos), ninguém abriu os lábios, salvo quando chegamos a uma banca de revista, na ponta linha, para pegar o jornal. O dono da banca quase não levanta a cabeça para atender. Por sorte, encontramos o Dr. Itamar Costa, médico e cronista que mora ali por perto, e tivemos sorrisos largos e abraços calorosos. Que homem educado, hem?

- Ele devia estar na Academia Piauiense de Letras. Por que não vai? - Mécia pergunta.

- Ele vai entrar, é que ainda não chegou a hora, eu disse. Talvez seja o próximo. Só não desejo que seja na minha vaga, pois quero votar nele, lembrando da mesma frase que me dissera o poeta Vidal de Freitas, grande benemérito de Picos, onde foi Juiz de Direito, por muito tempo, ali criando o curso ginasial, que Picos ainda não tinha. Ele foi o mentor do Colégio que depois foi denominado “Marcos Parente”.

E seguimos os nossos passos de volta pra casa, ou melhor, nosso apartamento: - Ela rezando suas rezas e eu imaginando como escrever esta crônica. Será medo que essa gente tem da gente? Será pensando que todos são ladrões, malfazejos? Era esta a primeira pergunta que vinha à minha cabeça. Ou então é indiferença pela vida, pelo tempo. Se não tiver cuidado, eles tropeçam em você. Não tire os olhos dos poucos que vão e vêm. Tudo tão diferente de uns quinze anos atrás! Hoje, os governos são desumanos, fazem leis que dizem proteger uns, mas desprotegem outros, em maior número de pessoas. Leis desumanas. Os homens das leis, fazem-nas para si, em causa próprio, leis casuísticas. Quem sobrar que se dane. Quem andar pelas ruas de Teresina vai vendo como rola a desumanidade nas pessoas. Mesmo pela manhã, quando o tráfego está manso, ralo, quase nenhum carro nas ruas e avenidas, e se é domingo ou feriado prolongado, menos ainda. Os dirigentes de tais veículos não têm a menor atenção aos pobres idosos que estão fazendo suas caminhadas nesse horário: das 7 às 9 h da manhã. Com relação a eles mesmos, os que dirigem veículos, há uma espécie de competição para ver quem chega primeiro. Pois os pedestres, já sabemos, nada merecem a não ser atropelamentos ou carreiras, com a grande probabilidade de queda, muitas vezes irrecuperáveis. Os pobres ciclistas sofrem quando vem um carro, e neste seu desespero de chegar à obra se é dia de trabalho, ou em casa, se trabalha na noite, vigias, garçons, etc., vão na mesma pisada, correndo sem parar. Só observam os carros para não serem pisados. Em resumo, o desrespeito é assim: carro grande é grande, tem todos os direitos; carro menor vem depois, mesmo que sejam camionetas. E os carrinhos, novos ou velhos, que se cuidem, pois há uma chusma atrás deles. Não falemos nos motoqueiros. Estes andam numa disparada, parece que o mundo vai acabar-se. Ou são eles que vão morrer?

Pedestres? Entre eles pode haver ladrões, assaltantes disfarçados de pedintes, esmoleres, pessoas que pedem informação de ruas, hospitais etc., mas o que querem mesmo é nossa bolsa, nossos documentos, nosso celular, hem? Ninguém, em Teresina, respeita as leis do trânsito. De mil tem um que anda com luz acesa, que faz o sinal na lanterninha mostrando para onde vai, que pára dando lugar a outro passar, mesmo que seja sua vez, por gentileza. Não falei nem vou falar nos terríveis carros de som que infernizam os nossos ouvidos durante a noite e vão até de manhã. Há mais rapazes (e até moças) da alta burguesia que dormem o dia todo, de noite vão pra festa e se embriagam e saem por aí fazendo “cavalos de pau”, para morrer ou matar, morrer e matar. Os jovens de hoje não têm sonho. Morrem logo. De desastre de carro, de bebida e outras drogas, de nada – simplesmente se suicidam. A desumanidade ocorre não apenas no trânsito: jogam lixo, pedras, paus, galhos de árvores, tudo no passeio e no leito das ruas. Eles não sabem que o passeio (calçada), é do pedestre. Como é que pode? Plantam plantas onde não devem e deixam morrer de sede as que dão sombra.

Na volta, quando chegamos à pracinha que há no cruzamento das Avenidas Homero Castelo Branco e Dom Severino, vimos uma mulherzinha bem magra, distante, do outro lado da praça. Pareceu-me que estava doente ou com forme. E um homem, parado do lado de cá, brigava com ela, querendo que fosse, rapidamente, sentar-se num banco perto dele. Ela foi apressando… Não digo chorando porque não lhe vi as lágrimas, era distante. Fiquei parado, observando.

Afinal de contas, quem são? O que ele quer dela? O homem a maltrata. A moça, de tão magra, caminha devagarinho.

Essas imagens me ficaram do casal. Casal? Não tivemos coragem de chegar perto e perguntar alguma coisa, talvez com medo de ser ele um assaltante, ou não receber bem a nossa indagação, metendo-nos nas suas vidas (a dele e a dela). Foi também desumanidade. Ou covardia. Ou não, caro leitor?

Fonte: Crônica original do Autor
Edição: 1ª edição
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