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Mamãe, não quero mais ser bailarina

Pensei em argumentar, insistir. Afinal, ela sempre gostou tanto de balé... (e, sim, a gente acha lindo, aquelas menininhas arrumadas, perfiladas, dançando)

20/09/2016 13:09

Desde pequenina, Laura é encantada por balé. Sempre disse que seria bailarina. Nós nos acostumamos, desde cedo, a ficar em nossos lugares, assistindo maravilhados ao espetáculo de balé em nossa sala, para depois aplaudir e saudar a nossa linda bailarina.

Enquanto não podíamos matriculá-la em aula de balé porque não tinha três anos, nós a levávamos ao teatro, ao shopping... Onde houvesse um espetáculo, lá estava ela, olhinhos brilhando, atentos à coreografia, mergulhados naquele universo encantado.

Na escola, em casa, aonde ia, ela repetia as coreografias, as entradas dos bailarinos, os cumprimentos à platéia ao final do espetáculo. Nossa bailarina, tão linda, rodopiava e contava que ia para a escola de balé.

E foi. A uma, duas, três escolas. Em todas, olhou as aulas, entre tímida e encantada, no meu colo. Em nenhuma delas, minha bailarina rodopiou. Em nenhuma, ela se encontrou.

Um dia, em casa, veio o veredicto: “Mãe, eu não quero mais ser bailarina; não quero escola de balé. Só vou ser bailarina mesmo na nossa casinha”.

Pensei em argumentar, em insistir. Afinal, ela sempre gostou tanto de balé... (e, sim, a gente acha lindo aquelas menininhas arrumadas, perfiladas, dançando).

“Por quê, filha”?

“Não quero, a tia do balé vai fazer assim, ó (gesto de amarrar o cabelo em coque). E eu não gosto”.

Por que estou contando essa história? Porque nesse dia, eu aprendi com minha filha de menos de três anos o quanto vale ser livre.

Ela continua amando balé. Rodopia e dança em casa, em família. Diz que é bailarina. Mas não quer fazer balé. Se é convidada a ver uma aula, sempre responde não.

Laura não aceita a imposição do coque. Não aceita muitas outras imposições. Desde sempre, ela questiona, quer entender os porquês.

Não estou dizendo que ela não aceita regras. Ao contrário. Aceita e geralmente as cumpre. Mas tem que ser na conversa, explicação e convencimento.

Recebe limites em casa e os testa frequentemente, talvez para saber se agiremos com coerência, obedecendo aos nossos combinados.  

Laura é, como costumo dizer, um espírito livre.

Não gosta de roupa com sovaco (mangas justas). Nem de tecidos que piniquem, nem de sapatos apertados.

É livre, nas mínimas coisas do dia a dia. Pés descalços, desbrava o mundo e as coisas. De “vestido rodador” ou “biquíni de barriga aparecida”, ela segue, exercitando e ensinando a liberdade de ser quem é.

Está aprendendo a lidar com suas emoções e isso nem sempre é pacífico, ou simples. Interroga com palavras e com o corpo inteiro. Defende suas ideias com força e doçura. E não se prende ao que esperam dela.

Essa é a minha Laura. Minha doce bailarina sem coque, sem amarras.

Quem foi que disse que temos que ensinar nossos filhos? Esse povo pequenino veio aqui foi pra ensinar a gente a ser mais gente, isso sim! 

Por: Viviane Bandeira, jornalista e mãe da Laura, de uma estrelinha e da Luísa
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